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CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA
TERCEIRA PARTE - A VIDA EM CRISTO
INTRODUÇÃO
1691 "Cristão, reconhece a tua dignidade. Por participares agora da natureza divina, não te
790
degeneres, retornando à decadência de tua vida passada.
Lembra-te da Cabeça a que pertences e do Corpo de que és membro. Lembra-te de
que foste arrancado do poder das trevas e transferido para a luz e o Reino de
Deus
."'
1692
O Símbolo da fé professou a grandeza dos dons de Deus ao homem na obra de
sua criação e, mais ainda, pela redenção e santificação. O que a fé confessa os
sacramentos comunicam: pelos "sacramentos que os fizeram renascer", os cristãos
se tornaram “filhos de Deus
”
(1Jo 3,1), "participantes da natureza divina" (Pd 1,4). Reconhecendo na fé sua
nova dignidade, os cristãos são chamados a levar a partir de então uma "vida
digna do Evangelho de Cristo
".
Pelos sacramentos e pela oração, recebem a graça de Cristo e os dons de seu
Espírito, que os tomam capazes disso.
1693
Jesus Cristo sempre fez o que era do agrado do Pai
.
Sempre viveu em perfeita comunhão com Ele. Também os discípulos são convidados a
viver sob o olhar do Pai, "que vê o que esta oculto"(Mt 6,6), para se tomarem
"perfeitos como o vosso Pai celeste é perfeito" Mt 5,48).
1694
Incorporados
a
Cristo pelo
Batismo,
os cristãos estão "mortos para o pecado e vivos
1267
para Deus em Cristo Jesus
",
participando assim da vida do Ressuscitado
.
Seguindo a Cristo e em união com ele
,
podem procurar "tornar-se imitadores de Deus como filhos amados e andar no
amor
",
conformando seus pensamentos, palavras e ações aos "sentimentos de Cristo to
Jesus
e
seguindo seus exemplos
".
1695
"Justificados em nome do Senhor Jesus Cristo e pelo Espírito de nosso
Deus" (1Cor 5,11), “santificados... chamados a ser santos
”,
os cristãos se tornaram "templo do Espírito Santo" (1Cor 6,19). Esse "Espírito
do Filho" os ensina a orar ao Pai
e,
tendo-se tornado vida deles, os faz agir
para
carregarem em si "os frutos do Espírito
"
pela caridade operante. Curando as feridas do pecado, o Espírito Santo nos
"renova pela transformação espiritual de nossa mente
",
ele nos ilumina e fortifica para vivermos como "filhos da luz" (Ef 5,8), na
"bondade, justiça e verdade" em todas as coisas (Ef 5,9).
1696
O
caminho
de Cristo "conduz à vida
",
um caminho contrário “leva à perdição
”.
A
1970
parábola evangélica dos dois caminhos está sempre presente na catequese da
Igreja. Significa a importância das decisões morais para nossa salvação. "Há
dois caminhos, um da vida e outro da morte; mas entre os dois há grande
diferença
.
1697
Importa, na catequese, revelar com toda clareza a alegria e as exigências
do caminho de Cristo
.
A catequese da “vida nova” (Rm 6,4) em Cristo será:
737ss ü uma catequese do Espírito Santo, Mestre interior da vida segundo Cristo, doce hóspede e amigo que inspira, conduz, retifica e fortifica esta vida;
1938ss ü uma catequese da graça, pois é pela graça que somos salvos, e é pela graça que
nossas obras podem produzir frutos para a vida eterna;
1716ss ü uma catequese das bem-aventuranças, pois o caminho de Cristo se resume
às bem-aventuranças, único caminho para a felicidade eterna, à qual o coração do homem
aspira;
1846ss ü uma catequese do pecado e do perdão, pois, sem reconhecer-se pecador, o homem não pode conhecer a verdade sobre si mesmo, condição do reto agir, e sem a oferta do perdão não poderia suportar essa verdade;
1803ss ü uma catequese das virtudes humanas, que faz abraçar beleza e a atração das retas disposições em vista do bem;
1812ss ü uma catequese das virtudes cristãs da fé, esperança e caridade, que se inspira com prodigalidade no exemplo dos santos;
2067 ü uma catequese do duplo mandamento da caridade desenvolvido no Decálogo;
946ss ü uma catequese eclesial, pois é nos múltiplos intercâmbios dos "bens
espirituais" na "comunhão dos santos" que a vida cristã pode crescer, desenvolver-se e comunicar-se.
1698 A referência primeira e última dessa catequese será sempre Jesus Cristo, que é "o
426 caminho, a verdade e a vida" (Jo 14,6). Contemplando-o na fé, os fiéis podem esperar que Cristo realize neles suas promessas e, amando-o com o amor com que Ele os amou, façam as obras que correspondem à sua dignidade:
Peço que considereis que Jesus Cristo nosso Senhor
é vossa verdadeira Cabeça e que vós sois um de seus membros. Ele é para vós o
que a Cabeça é para os membros; tudo o que é dele é vosso, seu espírito,
coração, corpo, alma e todas as suas faculdades, e deveis fazer uso disso como
coisa vossa para servir, louvar, amar e glorificar a Deus. Vós sois em relação a
Ele o que os membros são em relação à cabeça. Assim, Ele deseja ardentemente
fazer uso de tudo o que está em vós para o serviço e a glória de seu Pai, como
coisa sua
.
Para mim , viver é Cristo (Fl 1,21)
PRIMEIRA SEÇÃO
A VOCAÇÃO DO HOMEM:
A VIDA NO ESPÍRITO
1699 A vida no Espírito realiza a vocação do homem (capítulo I) Constitui-se de caridade divina e de solidariedade humana (capítulo II). É concedida de graça como uma Salvação (capítulo III).
CAPÍTULO I
A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA
1700 A dignidade da pessoa humana se fundamenta em sua criação à imagem e semelhança de
356 Deus (artigo 1); realiza-se em sua vocação à bem-aventurança divina (artigo 2). Cabe ao ser humano a livre iniciativa de sua realização (artigo 3). Por seus atos deliberados (artigo 4), a pessoa humana se conforma ou não ao bem prometido por Deus e atestado por sua consciência moral (artigo 5). As pessoas humanas se edificam e crescem interiormente: fazem de toda sua vida sensível e espiritual matéria de crescimento (artigo 6). Com a ajuda da graça, crescem na virtude (artigo 7), evitam o pecado e, se o
1439
tiverem cometido, voltam como o filho
pródigo
,
para a misericórdia de nosso Pai do Céus (artigo 8). Chegam, assim, à perfeição
da caridade.
ARTIGO 1
O HOMEM IMAGEM DE DEUS
1701 "Novo Adão, na mesma revelação do mistério do Pai e de seu amor, Cristo manifesta
359
plenamente
o homem ao próprio homem e lhe descobre a sua altíssima vocação
.”
Em Cristo, "imagem do ( Deus invisível" (Cl 1,15
),
foi o homem criado à "imagem e semelhança" do Criador. Em Cristo, redentor e
salvador, a imagem divina, deformada no homem pelo primeiro pecado, foi
restaurada em sua beleza original e enobrecida pela graça de Deus
.
1702 A imagem divina está presente em cada pessoa. Resplandece na comunhão das pessoas,
1878 à semelhança da unidade das pessoas divinas entre si (cf. capítulo II).
1703
Dotada
de
alma "espiritual e imortal
",
a pessoa humana é "a única criatura na terra
363,2258 que Deus quis por si mesma
".
Desde sua concepção, é destinada à bem-aventurança eterna.
1704 A pessoa humana participa da luz e da força do Espírito divino. Pela razão, é capaz de
339 compreender a ordem das coisas estabelecida pelo Criador. Por sua vontade, ela é capaz
30
de ir, por si, ao encontro de seu verdadeiro bem. Encontra sua perfeição
na "busca e no amor da verdade e do bem
".
1705 Em virtude de sua alma e de seus poderes espirituais de inteligência e vontade, o
1730
homem é
dotado de liberdade, "sinal eminente da imagem de Deus
".
1706 Por sua razão, o homem conhece a voz de Deus, que o insta a "fazer o bem e a evitar o
1776
mal
".
Cada qual é obrigado a seguir esta lei que ressoa na consciência e se cumpre no
amor a Deus e ao próximo. O exercício da vida moral atesta a dignidade da
pessoa.
1707 "Instigado pelo Maligno, desde o inicio da história o homem abusou da própria liberdade
397
."
Sucumbiu à tentação e praticou o mal. Conserva o desejo do bem, mas sua
natureza traz a ferida do pecado original. Tornou-se inclinado ao mal e sujeito
ao erro:
O homem está dividido em si mesmo. Por esta razão, toda a vida
humana, individual e coletiva, apresenta-se como uma luta dramática entre o bem
e o mal, entre a luz e as trevas
.
1708 Por sua paixão, Cristo livrou-nos de Satanás e do pecado. Ele nos mereceu a vida nova
617 no Espírito Santo. Sua graça restaura o que o pecado deteriorou em nós.
1709 Quem crê em Cristo torna-se filho de Deus. Esta adoção filial o transforma, propiciando-
1265 lhe seguir o exemplo de Cristo. Ela torna-o capaz de agir corretamente e de praticar o Em união com seu Salvador, o discípulo alcança a perfeição da caridade, a santidade.
1050 Amadurecida na graça, a vida moral desabrocha em vida eterna na glória do céu.
RESUMINDO
1710
"Cristo manifesta plenamente o homem ao próprio homem lhe descobre sua
altíssima vocação
."
1711
Dotada de alma espiritual, inteligência e vontade, a pessoa humana, desde
sua concepção, é ordenada para Deus e destinada à bem-aventurança eterna. Busca
sua perfeição na "procura e no amor da verdade e do bem
.
1712
A verdadeira liberdade é no homem "sinal eminente da imagem de Deus
."
1713
O homem é obrigado a seguir a lei moral que o chama a fazer o bem e
evitar o mal
".
Esta lei ressoa em sua consciência.
1714 O homem, ferido em sua natureza pelo pecado original, está sujeito ao erro e inclinado ao mal no exercício de sua liberdade.
1715 Quem crê em Cristo tem a vida nova no Espírito Santo. A vida moral, desenvolvida e amadurecida na graça, deve completar-se na glória do céu.
ARTIGO 2
NOSSA VOCAÇÃO À BEM-AVENTURANÇA
I. As bem-aventuranças
1716 As bem-aventuranças estão no cerne da pregação de Jesus. Seu anúncio retoma as
2546 promessas feitas ao povo eleito desde Abraão. Jesus as completa, ordenando-as não
mais simples bem-estar gozoso na terra, mas ao Reino dos Céus:
Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos Céus.
Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra.
Bem-aventurados os aflitos, porque serão consolados.
Bem-aventurados os que tem fome e sede de justiça, porque serão saciados.
Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.
Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus.
Bem-aventurados os que promovem a paz, porque serão chamados filhos de Deus.
Bem-aventurados os que são perseguidos por causa da justiça, porque deles é o Reino dos Céus.
Bem-aventurados sois, quando vos injuriarem e vos perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós por causa de mim.
Alegrai-vos e regozijai-vos, porque será grande a vossa recompensa nos céus (Mt 5,3-12a).
1717 As bem-aventuranças traçam a imagem de Cristo e descrevem sua caridade; exprimem
459 a vocação dos fiéis associados à glória de sua Paixão e Ressurreição; iluminam as ações
1820 e atitudes características da vida cristã; são promessas paradoxais que sustentam a esperança nas tribulações; anunciam as bênçãos e recompensas já obscuramente adquiridas pelos discípulos; são iniciadas na vida da Virgem Maria e de todos os santos.
II. O desejo de felicidade
1718 As bem-aventuranças respondem ao desejo natural de felicidade. Este desejo é de
27,1024 origem divina: Deus o colocou no coração do homem, a fim de atraí-lo a si, pois só ele pode satisfazê-lo.
Todos certamente queremos viver felizes, e não existe no gênero humano pessoa que não concorde
com esta proposição, mesmo antes de ser formulada
por inteiro
.
2541 Então, como vos hei de procurar, Senhor? Visto que, procurando a vós, meu Deus, eu procuro a vida
bem-aventurada, fazei que vos procure para que minha alma viva, pois meu corpo vive de minha alma, e
minha alma vive de vós
.
Só Deus satisfaz
.
1719 As bem-aventuranças desvendam o objetivo da existência humana, o fim último dos atos
1950 humanos. Deus nos chama à sua própria bem-aventurança. Este chamado se dirige a
cada um pessoalmente, mas também a toda a Igreja, povo novo formado por aqueles que acolheram a promessa e nela vivem na fé.
III. A bem-aventurança cristã
1720 O Novo Testamento usa várias expressões para caracterizar a bem-aventurança à qual
1027
Deus
chama o homem: a vinda do (Reino de Deus; a visão de Deus
:
"Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus" (Mt 5,8
;
entrada na alegria do Senhor
;
entrada no repouso de Deus
.
Aí descansaremos e veremos, veremos e amaremos, amaremos e
louvaremos. Eis a essência do fim sem fim. E que outro fim mais nosso que
chegarmos ao reino que não terá fim
?
1721 Deus nos colocou no mundo para conhecê-lo, servi-lo e amá-lo e, assim, chegar ao paraíso. A bem-aventurança nos faz participar da natureza divina (l Pd 1,4) e da vida
260
eterna
.
Com ela, o homem entra na glória de Cristo
e
no gozo da vida trinitária.
1722 Tal bem-aventurança ultrapassa a inteligência e as forças exclusivamente humanas.
1028 Resulta de um dom gratuito de Deu. É por isso que se diz ser sobrenatural, como
também a graça que dispõe o homem a entrar no gozo divino.
"Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus." Por certo, de acordo com sua
grandeza e glória indizível, "ninguém verá a Deus e viverá", pois o Pai é inacessível; mas,
devido a seu amor, sua bondade para com os homens e sua onipotência, chega até a conceder
294 àqueles que o amam o privilégio de ver a Deus... "pois o que é impossível aos homens é possível
a
Deus ."
1723 A prometida bem-aventurança nos coloca diante de escolhas morais decisivas. Convida-
2519 nos a purificar nosso coração de seus maus instintos e a procurar o amor de Deus acima de tudo. Ensina que a verdadeira felicidade não está nas riquezas ou no bem-estar, nem na glória humana ou no poder, nem em qualquer obra humana, por mais útil que seja, como as ciências, a técnica e as artes, nem em outra criatura qualquer, mas apenas em
227 Deus, fonte de todo bem e de todo amor.
A riqueza é o grande deus atual; a ela prestam homenagem
instintiva a multidão e toda a massa dos homens. Medem a felicidade pelo tamanho
da fortuna e, segundo a. fortuna, medem também a honradez... Tudo isto provém da
convicção de que, tendo riqueza, tudo se consegue. A riqueza é, pois, um dos
ídolos atuais, da mesma forma que a fama... A fama, o fato de alguém ser
conhecido e fazer estardalhaço na sociedade (o que poderíamos chamar de
notoriedade da imprensa), chegou a ser considerada um bem em si mesma, um sumo
bem, um objeto, também ela, de verdadeira veneração
.
1724
O Decálogo, o Sermão da Montanha e a catequese apostólica nos descrevem
os caminhos que levam ao Reino dos Céus. Neles nos engajamos, passo a passo,
pelas ações de todos os dias, sustentados pela graça do Espírito Santo.
Fecundados pela Palavra de Cristo, daremos, aos poucos, frutos na Igreja para a
glória de Deus
.
RESUMINDO
1725 As bem-aventuranças retomam e completam as promessas de Deus desde Abraão, ordenando-as para o Reino dos Céus. Respondem ao desejo de felicidade que Deus colocou no coração do homem.
1726 As bem-aventuranças nos ensinam o fim último ao qual Deus nos chama: o Reino, a visão de Deus, a participação na natureza divina, a vida eterna, a filiação divina, o repouso em Deus.
1727 A bem-aventurança da vida eterna é um dom gratuito de Deus; ela é sobrenatural como a graça que a ela conduz.
1728 As bem-aventuranças nos deixam diante de escolhas decisivas com relação aos bens terrenos; purificam nosso coração para que aprendamos a amar a Deus sobre todas as coisas.
1729 A bem-aventurança do Céu determina os critérios de discernimento no uso dos bens terrestres, de acordo com a Lei de Deus.
ARTIGO 3
A LIBERDADE DO HOMEM
1730 Deus criou o homem dotado de razão e lhe conferiu dignidade de uma pessoa agraciada com a iniciativa e o domínio de seus atos. "Deus deixou o homem nas mãos de sua
30
própria decisão" (Eclo 15,14), para que pudesse ele mesmo procurar seu Criador
e, aderindo livremente a Ele, chegar à plena e feliz perfeição
.
O homem é dotado de razão e por isso é semelhante a Deus: foi
criado livre e senhor de seus atos
.
I. Liberdade e responsabilidade
1731 A liberdade é o poder, baseado na razão e na vontade, de agir ou não agir, de fazer isto ou aquilo, portanto, de praticar atos deliberados. Pelo livre-arbítrio, cada qual dispõe sobre si mesmo. A liberdade é, no homem, uma força de crescimento e amadurecimento
1721 na verdade e na bondade. A liberdade alcança sua perfeição quando está ordenada para Deus, nossa bem-aventurança.
1732 Enquanto não se tiver fixado definitivamente em seu bem último, que é Deus, a liberdade
396 comporta a possibilidade de escolher entre o bem e o mal, portanto, de crescer em
1849 perfeição ou de definhar e pecar. Ela caracteriza os atos propriamente humanos. Toma-
2006 se fonte de louvor ou repreensão, de mérito ou demérito.
1733 Quanto mais pratica o bem, mais a pessoa se toma livre. Não há verdadeira liberdade a
1803
não
ser a serviço do bem e da justiça. A escolha da desobediência e do mal é um
abuso de liberdade e conduz à "escravidão do pecado
".
1734 A liberdade torna o homem responsável por seus atos, na medida em que forem
1036,1804 voluntários. O progresso na virtude, o conhecimento do bem e a ascese aumentam o domínio da vontade sobre seus atos.
1735 A imputabilidade e a responsabilidade de uma ação podem ficar diminuídas ou
597 suprimidas pela ignorância, inadvertência, violência, medo, hábitos, afeições imoderadas e outros fatores psíquicos ou sociais.
1736 Todo ato diretamente querido é imputável a seu autor:
2568
Assim, o Senhor pergunta a Adão, após o pecado no jardim: "O que
fizeste?" (Gn 3,13). O mesmo pergunta a Caim
.
A mesma pergunta faz o profeta Natã ao rei Davi, após o adultério com a mulher
de Urias e o assassinato deste
.
Uma ação pode ser indiretamente voluntária quando resulta de uma negligência quanto a alguma coisa que deveríamos saber ou fazer, por exemplo, um acidente ocorrido por ignorância do código de trânsito.
1737 Um efeito pode ser tolerado sem ser querido pelo agente, por exemplo, o esgotamento da
2263 mãe à cabeceira de seu filho doente. O efeito ruim não é imputável se não foi querido nem como fim nem como meio de ação, como poderia ser o caso de morte sofrida por alguém quando tentava socorrer uma pessoa em perigo. Para que o efeito ruim seja imputável, é preciso que seja previsível e que o agente tenha a possibilidade de evitá-lo, como, por exemplo, no caso de um homicídio cometido por motorista embriagado.
1738 A liberdade se exerce no relacionamento entre os seres humanos. Toda pessoa humana, criada à imagem de Deus, tem o direito natural de ser reconhecida como ser livre e responsável. Todos devem a cada um esta obrigação de respeito. O direito ao exercício
2106 da liberdade é uma exigência inseparável da dignidade da pessoa humana, sobretudo em
210
matéria moral e religiosa
.
Este direito deve ser reconhecido civilmente e protegido nos limites do bem
comum e da ordem pública
.
II. A liberdade humana na economia da salvação
1739 Liberdade e pecado. A liberdade do homem é finita e falível. De fato, o homem falhou.
397 Pecou livremente. Recusando o projeto do amor de Deus, enganou-se a si mesmo,
401 tornou-se escravo do pecado. Esta primeira alienação gerou outras, em grande número. Desde suas origens, a história comprova os infortúnios e opressões nascidos do coração do homem por causa do mau uso da liberdade.
1740 Ameaças à liberdade. O exercício da liberdade não implica o direito de dizer e fazer tudo.
2108
É falso pretender que “o homem, sujeito da liberdade, baste a si
mesmo, tendo por fim a satisfação de seu próprio interesse no gozo dos bens
terrenos
.
Por sua vez, as condições de ordem econômica e social, política e cultural
requeridas para um justo
1887 exercício da liberdade são muitas vezes desprezadas e violadas. Estas situações de cegueira e injustiça prejudicam a vida moral e levam tanto os fortes como os fracos à tentação de pecar contra a caridade. Fugindo da lei moral, o homem prejudica sua própria liberdade, acorrenta-se a si mesmo, rompe a fraternidade com seus semelhantes e rebela-se contra a verdade divina.
1741
Liberdade
e
salvação. Por sua gloriosa cruz, Cristo obteve a salvação de todos os
homens. Resgatou-os do pecado que os mantinha na escravidão. "É para a liberdade
que Cristo nos libertou" (Gl 5,1). Nele comungamos da "verdade que nos torna
livres
".
O
782
Espírito Santo nos foi dado e, como ensina o apóstolo, "onde se acha o
Espírito do Senhor, aí está a liberdade" (2 Cor 3,17). Desde agora participamos
da "liberdade da glória dos filhos de Deus
".
1742 Liberdade e graça. A graça de Cristo não entra em concorrência com nossa liberdade
2002 quando esta corresponde ao sentido da verdade e do bem que Deus colocou no coração do homem. Ao contrário, como a experiência cristã o atesta, sobretudo na oração,
1784 quanto mais dóceis formos aos impulsos da graça, tanto mais crescem nossa liberdade intima e nossa segurança nas provações e diante das pressões e coações do mundo externo. Pela obra da graça, o Espírito Santo nos educa à liberdade espiritual, para fazer de nós livres colaboradores de sua obra na Igreja e no mundo.
"Deus de poder e misericórdia, afastai de nós todo obstáculo, para
que, inteiramente disponíveis, nos dediquemos a vosso serviço
."
RESUMINDO
1743
"Deus deixou o homem nas mãos de sua própria decisão" (Eclo 15,14), para
que pudesse livremente aderir a seu Criador e chegar, assim, à feliz
perfeição
.
1744 A liberdade é o poder de agir ou não agir, praticando, então, a pessoa atos deliberados. Ela alcança a perfeição de seu ato quando está ordenada para Deus, o sumo Bem.
1745 A liberdade caracteriza os atos propriamente humanos. Torna o ser humano responsável pelos atos dos quais é voluntariamente autor. Seu agir deliberado é algo propriamente seu.
1746 A imputabilidade ou responsabilidade de uma ação pode ser diminuída ou suprimida pela ignorância, violência, medo e outros fatores psíquicos ou sociais.
1747 O direito ao exercício da liberdade é uma exigência inseparável da dignidade do homem, sobretudo em matéria religiosa e moral. Mas o exercício da liberdade não implica o suposto direito de tudo dizer e fazer.
1748 "É para a liberdade que Cristo nos libertou" (Gl 5,1).
ARTIGO 4
A MORALIDADE DOS ATOS HUMANOS
1749 A liberdade faz do homem um sujeito moral. Quando age de forma deliberada, o homem
1732 é, per assim dizer, o pai de seus atos. Os atos humanos, isto é, livremente escolhidos após um juízo da consciência, são qualificáveis moralmente. São bons ou maus.
I. As fontes da moralidade
1750 A moralidade dos atos humanos depende:
ü do objeto escolhido;
ü do fim visado ou da intenção;
ü das circunstâncias da ação.
1751 O objeto, a intenção e as circunstâncias constituem as "fontes" ou elementos constitutivos da moralidade dos atos humanos. O objeto escolhido é um bem para o qual se dirige deliberadamente a vontade. É a matéria de um ato humano. O objeto escolhido especifica moralmente o ato de querer, conforme razão o reconheça e julgue estar de
1794 acordo ou não com o bem verdadeiro. As regras objetivas da moralidade enunciam a ordem racional do bem e do mal, atestada pela consciência.
1752 Perante o objeto, a intenção se coloca do lado do sujeito agente. Pelo fato de ater-se à fonte voluntária da ação e determiná-la pelo objetivo, a intenção é um elemento essencial na qualificação moral da ação. A finalidade é o primeiro termo da intenção e designa a
2520 meta visada na ação. A intenção é um movimento da vontade em direção ao objetivo; ela diz respeito ao fim visado pela ação. É a meta do bem que se espera da ação praticada. Não se limita à direção de nossas ações singulares, mas pode orientar para um mesmo
1731 objetivo ações múltiplas; pode orientar toda vida para o fim último. Por exemplo, um serviço prestado tem por fim ajudar o próximo, mas pode também ser inspirado pelo amor a Deus, fim último de todas as nossas ações. Uma mesma ação também pode ser inspirada por várias intenções, como, por exemplo, prestar um serviço para obter um favor ou para vangloriar-se.
1753 Uma intenção boa (por exemplo, ajudar o próximo) não torna bom nem justo um
2479
comportamento
desordenado em si mesmo (como a mentira e a maledicência). O fim não justifica
os meios. Assim, não se pode justificar a condenação de um inocente como meio
legítimo de salvar o povo. Por sua vez, acrescentada uma intenção má (como, por
exemplo, a vanglória), o ato em si bom (como a esmola) torna-se mau
.
1754 As circunstâncias, incluídas as conseqüências, são os elementos secundários de um ato moral. Contribuem para agravar ou diminuir a bondade ou maldade moral dos atos humanos (por exemplo, o montante de um furto). Podem também atenuar ou aumentar a
1735 responsabilidade do agente (agir, por exemplo, por temor da morte). As circunstâncias não podem por si modificar a qualidade moral dos próprios atos, não podem tomar boa ou justa uma ação má em si.
II. Atos bons e atos maus
1755 O ato moralmente bom supõe a bondade do objeto, da finalidade e das circunstâncias. Uma finalidade má corrompe a ação, mesmo que seu objeto seja bom em si (como, por exemplo, rezar e jejuar "para ser visto pelos homens").
O objeto da escolha por si só pode viciar o conjunto de determinado agir. Existem comportamentos concretos - como a fornicação - cuja escolha é sempre errônea, pois escolhê-los significa uma desordem da vontade, isto é, um mal moral.
1756 É errado, pois, julgar a moralidade dos atos humanos considerando só a intenção que os inspira ou as circunstâncias (meio ambiente, pressão social, constrangimento ou necessidade de agir etc.) que compõem o quadro. Existem atos que por si mesmos e em si mesmos, independentemente das circunstâncias e intenções, são sempre gravemente ilícitos, em virtude de seu objeto: a blasfêmia e o perjúrio, o homicídio e o adultério. Não
1789 é permitido praticar um mal para que dele resulte um bem.
RESUMINDO
1757 O objeto, a intenção e as circunstâncias constituem as três “fontes" da moralidade dos atos humanos.
1758 O objeto escolhido especifica moralmente o ato do querer conforme a razão o reconheça e julgue bom ou mau.
1759
“Não se pode justificar uma ação má, embora feita com boa intenção
.”
O fim não justifica os meios.
1760 O ato moralmente bom supõe, ao mesmo tempo, a bondade do objeto, da finalidade e das circunstâncias.
1761 Existem comportamentos concretos cuja escolha é sempre errônea, porque escolhê-los significa uma desordem da vontade de, isto é, um mal moral. Não é permitido fazer o mal para que daí resulte um bem.
ARTIGO 5
A MORALIDADE DAS PAIXÕES
1762 O ser humano se ordena para a bem-aventurança por meio de seus atos deliberados: as paixões ou sentimentos que experimenta podem dispô-lo e contribuir para isso.
I. As paixões
1763 O termo "paixões" pertence ao patrimônio cristão. Os sentimentos ou paixões designam as emoções ou movimentos da sensibilidade que inclinam alguém a agir ou não agir em vista do que é experimentado ou imaginado como bom ou mau.
1764 As paixões são componentes naturais do psiquismo humanos; constituem o lugar de
368
passagem e
garantem a ligação entre a vida sensível e a vida do espírito. Nosso Senhor
indica o coração do homem como a fonte de onde brota o movimento das paixões
.
1765 As paixões são numerosas. A paixão mais fundamental é o amor provocado pela atração do bem. O amor causa o desejo do bem ausente e a esperança de consegui-lo. Este movimento se completa no prazer e na alegria do bem possuído. A percepção do mal provoca ódio, aversão e medo do mal que está por chegar. Este movimento se completa na tristeza do mal presente ou na cólera que a ele se opõe.
1766
"Amar
é
querer algo de bom para alguém
."
Todos os demais afetos têm sua fonte no
1704
movimento original do coração do
homem para o bem. Só existe o bem que é amado
.
"As paixões são más se o amor é mau, boas se o amor é bom
."
II. Paixões e vida moral
1767 Em si mesmas, as paixões não são boas nem más. Só recebem qualificação moral na medida em que dependem efetivamente da razão e da vontade. As paixões são chamadas
1860
voluntárias "ou porque são comandadas pela vontade ou porque a vontade não lhes
opõe obstáculo
".
Faz parte da perfeição do bem moral ou humano que as paixões sejam reguladas
pela razão
.
1768 Os grandes sentimentos não determinam a moralidade nem a santidade das pessoas; são reservatório inesgotável das imagens e afeições em que se exprime a vida moral. As paixões são moralmente boas quando contribuem para uma ação boa, e más quando se dá o contrário. A vontade reta ordena para o bem e para a bem-aventurança os movimentos sensíveis que ela assume; a vontade má sucumbe às paixões desordenadas
1803 e as exacerba. As emoções e sentimentos podem ser assumidos em virtudes ou
1865 pervertidos em vícios.
1769 Na vida cristã, o próprio Espírito Santo realiza sua obra mobilizando o ser inteiro, inclusive suas dores, medos e tristezas, como aparece na Agonia e Paixão do Senhor. Em Cristo, os sentimentos humanos podem receber sua consumação na caridade e na bem-aventurança divina.
1770 A perfeição moral consiste em que o homem não seja movido ao bem exclusivamente
30 por sua vontade, mas também por seu apetite sensível, segundo a palavra do Salmo: "Meu coração e minha carne exultam pelo Deus vivo" (Sl 84,3).
RESUMINDO
1771 O termo "paixões" designa as afeições ou os sentimentos. Por meio de suas emoções, o homem pressente o bem e suspeita da presença do mal.
1772 As principais paixões são o amor, o ódio, o desejo, o medo, a alegria, a tristeza e a cólera.
1773 Nas paixões, como movimentos da sensibilidade, não há bem ou mal moral. Mas, enquanto dependem da razão e da vontade, há nelas bem ou mal moral.
1774 As emoções e os sentimentos podem ser assumidos em virtudes ou pervertidos em vícios.
1775
A perfeição do bem moral consiste em que o homem não seja movido ao
bem exclusivamente pela vontade, mas também pelo "coração".