"Maldito aquele que faz com negligência a obra do Senhor!"(Jr 48,10).
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Lumen Gentium
Constituição Dogmática
LUMEN GENTIUM
do Concílio Vaticano II sobre a Igreja(De Ecclesia)
Paulo
Bispo, servo dos servos de Deus, juntamente com os
padres do Sagrado Concílio, para perpétua memória.
primazes, arcebispos, bispos e outros ordinários
do lugar em paz e comunhão com a Sé Apostólica.
I. O MISTÉRIO DA IGREJA
Introdução
1. Cristo
é a luz dos povos. Por isso, este sagrado Concílio, congregado no Espírito
Santo; deseja ardentemente, anunciando o Evangelho a toda criatura (cf. Mc
16,15), iluminar todos os homens com a claridade de Cristo que resplandece na
face da Igreja. E, retomando o ensino dos concílios anteriores, propõe-se
explicar com maior rigor aos fiéis e a toda a gente, a natureza e a missão
universal da Igreja, a qual é em Cristo como que sacramento ou sinal, e também
instrumento, da união íntima com Deus e da unidade de todo o gênero humano.
As presentes condições do mundo tornam ainda mais urgente este dever da
Igreja, a fim de que todos os homens, hoje mais intimamente ligados por vínculos
sociais, técnicos e culturais, alcancem também unidade total em Cristo.
Os desígnios
do eterno Pai para a salvação de todos os homens
2. Por
decisão inteiramente livre e insondável da sua bondade e sabedoria, o eterno
Pai criou o mundo, decidiu elevar os homens a participação da sua vida divina,
e não os abandonou quando pecaram em Adão, antes lhes proporcionou sempre os
auxílios necessários para se salvarem, na perspectiva de Cristo Redentor,
que é a imagem do Deus invisível, primogênito de todas as
criaturas (Cl 1,15).
A todos os eleitos o Pai designou desde a
eternidade, predestinando-os a reproduzirem a imagem de seu Filho, a fim de que
seja ele o mais velho de uma multidão de irmãos (Rm 8,29). Aos que
acreditam em Cristo quis convocá-los na santa Igreja, a qual, tendo sido
prefigurada já desde a origem do mundo e preparada admiravelmente na história
do povo de Israel e na antiga aliança, (1) foi fundada nos últimos
tempos e manifestada pela efusão do Espírito, e será consumada em glória
no fim dos séculos.
Então, como se lê nos santos Padres, todos os justos, a
começar por Adão, desde o justo Abel até ao último eleito, (2) serão
finalmente congregados na Igreja universal junto do Pai.
A missão
do Filho
3. Veio
pois o Filho, enviado pelo Pai, que ainda antes da criação do mundo nos
escolheu nele e nele nos predestinou à filiação adotiva, porque lhe aprouve
instaurar em Cristo todas as coisas (cf. Ef 1,4-5.10). E Cristo, para cumprir
a vontade do Pai, inaugurou na terra o reino dos céus, cujo mistério nos
revelou; e pela sua obediência, consumou a redenção.
A Igreja, reino de
Cristo já presente em mistério, cresce visivelmente no mundo pelo poder de
Deus. Princípio e incremento significados pelo sangue e pela água que manaram
do lado aberto de Jesus crucificado (cf. Jo 19,34) e anunciados pelas palavras
do Senhor ao falar da sua própria morte na cruz: E eu quando for levantado da
terra atrairei todos a mim (Jo 12,32, grego). Sempre que no altar é celebrado o
sacrifício da cruz, no qual Cristo Imolado é a nossa páscoa (1Cor 5,7),
atua-se a obra da nossa redenção. O sacramento do pão eucarístico representa
e realiza a unidade dos fiéis, que constituam um só corpo em Cristo (cf. 1Cor
10,17). Todos os homens são chamados a esta união com Cristo luz do mundo, do
qual procedemos, pelo qual vivemos e para o qual tendemos.
O Espírito
santificador da Igreja
4.
Consumada a obra que o Pai confiara ao Filho para que ele a realizasse na terra
(cf. Jo 17,4), no dia de Pentecostes foi enviado o Espírito Santo para
santificar continuamente a Igreja e assim dar aos crentes acesso ao Pai, por
Cristo, num só Espírito (cf. Ef 2,18). Este é o Espírito da vida, a fonte da
água que jorra para a vida eterna (cf. Jo 4,14; 7,38-39); por ele, o Pai dá
vida aos homens mortos pelo pecado, até que um dia ressuscitem em Cristo os
seus corpos mortais (cf. Rm 8,10-11).
O Espírito habita na Igreja e nos corações
dos fiéis, como num templo (cf. 1Cor 3,16; 6,19): neles ora e dá testemunho de
que são filhos adotivos (cf. Gl 4,6; Rm 8,15-16.26).
Leva a Igreja ao
conhecimento da verdade total (Jo 16,13), unifica-a na comunhão e no ministério,
dota-a e dirige-a com diversos dons hierárquicos e carismáticos, e embeleza-a
com os seus frutos (cf. Ef 4,11-12; 1Cor 12,4; Gl 5,22).
Faz ainda rejuvenescer
a Igreja com a força do Evangelho, renova-a continuamente e eleva-a a união
consumada com o seu Esposo. (3) Pois o Espírito e a Esposa dizem ao Senhor
Jesus: Vem! (cf. Ap 22,17).
Assim
aparece a Igreja inteira como povo congregado na unidade do Pai e do Filho
e do Espírito Santo. (4)
O reino
de Deus
5. O mistério
da santa Igreja manifesta-se logo na fundação da mesma. O Senhor Jesus deu início
à sua Igreja com a pregação da boa nova, quer dizer, da vinda do reino de
Deus, prometido havia séculos nas Escrituras: Os tempos estão cumpridos,
e o reino de Deus está iminente (Mc 1,15; cf. Mt 4,17). Este reino começa
a aparecer claramente aos homens nas palavras, nas obras e na presença de
Cristo. A palavra do Senhor é comparada à semente lançada ao campo (Mc 4,14):
quem a ouve
com fé e entra a fazer parte do pequeno rebanho de Cristo (Lc 12,32), esse
recebeu o reino de Deus; e a semente germina então por virtude própria e
cresce até ao tempo da ceifa (cf. Mc 4,26-29). Também os milagres de Jesus
comprovam que o reino de Deus já chegou à terra: Mas, se eu expulso os
demônios pelo dedo de Deus, é que chegou até vós o reino de Deus (Lc
11,20; cf. Mt 12,28). Contudo o reino manifesta-se principalmente na própria
pessoa de Cristo, Filho de Deus e Filho do homem, que veio para servir e
dar a sua vida em redenção de muitos (Mc 10,45).
Depois de
haver sofrido a morte na cruz pelos homens, Jesus, ressuscitando, apareceu
constituído Senhor, Messias e Sacerdote eterno (cf. At 2,36; Hb 5,6; 7,17-21),
e derramou sobre os seus discípulos o Espírito prometido pelo Pai (cf. At
2,33). A partir de então a Igreja, enriquecida pelos dons do seu fundador e
observando fielmente os seus preceitos de caridade, de humildade e de abnegação,
recebe a missão de anunciar e estabelecer em todas as gentes o reino de Cristo
e de Deus, e constitui ela própria na terra o germe e o início deste reino.
Entretanto, no seu crescer lento, aspira ao reino perfeito, e com todas as suas
forças espera e deseja unir-se ao seu Rei na glória.
Várias
imagens da Igreja
6. Assim
como no Antigo Testamento, a revelação do reino foi muitas vezes apresentada
em figuras, também agora a Igreja nos dá a conhecer a sua natureza íntima
servindo-se de imagens tiradas quer da vida pastoril, da agricultura e da
construção, quer também da vida familiar e do noivado, imagens já delineadas
nos livros dos Profetas.
A Igreja é
um redil, cuja porta única e necessária é Cristo (Jo 10,1-10). É um rebanho,
do qual o próprio Deus anunciou haver de ser o Pastor (Cf. Is 40,11; Ez 34,11
ss), e cujas ovelhas, governadas embora por pastores humanos, são
incessantemente conduzidas e alimentadas pelo mesmo Cristo, bom Pastor e Príncipe
dos pastores (cf. Jo 10,11;
1Pd 5,4), que deu a vida pelas ovelhas (cf. Jo
10,11-15).
A Igreja é
a lavoura ou campo de Deus (cf. 1Cor 3,9). Neste campo cresce a oliveira antiga,
cuja raiz santa foram os Patriarcas e na qual se obteve e completará a
reconciliação dos judeus e dos gentios (Rm 11,13-26). Ela foi plantada pelo
Agricultor celeste como vinha eleita (Mt 21,33-43 e lugares paralelos; cf. Is
5,l ss). Cristo é a vide verdadeira que comunica a vida e a fecundidade aos
sarmentos, isto é, a nós que pela Igreja permanecemos nele e sem o qual nada
podemos fazer (Jo 15,1-5).
Mais freqüentemente
é a Igreja chamada construção de Deus (1Cor 3,9). O próprio Senhor a si
mesmo se comparou à pedra que os construtores rejeitaram, mas que se tornou
pedra angular (Mt 21,42 e paralelos; cf. At 4,11;
1Pd 2,7; Sl 117,22). Sobre
tal fundamento foi a Igreja construída pelos apóstolos (cf. 1Cor 3,11), e dele
recebe estabilidade e coesão. Este edifício toma vários nomes: casa de Deus
(1Tm 3,15), na qual habita a sua família, morada de Deus pelo Espírito (Ef
2,19-22), tenda de Deus entre os homens (Ap 21,3) e, especialmente, templo
santo, que os antigos Padres exaltaram, representado pelos santuários de pedra,
e que a liturgia com muita razão compara à Cidade Santa - a Jerusalém nova.
(5) Nela somos como pedras vivas, edificados aqui na terra em templo espiritual
(1Pd 2,5). Cidade Santa, que João contempla na renovação final do mundo, a
descer do céu, de junto de Deus, preparada como esposa, que se adorna para o
seu esposo (Ap 21,1ss).
A Igreja á
ainda chamada Jerusalém celeste e nossa mãe (Gl 4,26;
cf. Ap 12,17), e descrita como esposa imaculada do Cordeiro imaculado (Ap 19,7;
21,2.9; 22,17); Cristo amou-a e por ela se entregou a fim de a
santificar (Ef 5,26); uniu-a a si em aliança indissolúvel, nutre-a
e acalenta-a incessantemente (Ef 5,29); esposa que Jesus Cristo purificou e quis
unida e sujeita a si no amor e na fidelidade (cf. Ef 5,24); que encheu para
sempre de graça celeste, a fim de que nós possamos compreender a caridade de
Deus e de Cristo para com os homens, amor que excede todo conhecimento (cf. Ef
3,19). Mas enquanto, aqui na terra, a Igreja prossegue na sua peregrinação
longe do Senhor (cf. 2Cor 5,6), busca e antegoza já agora, no exílio, as
coisas do alto, onde Cristo está sentado à direita do Pai, onde a vida da
Igreja se encontra escondida com Cristo em Deus, até aparecer refulgente de glória
com o seu Esposo (cf. Cl 3,1-4).
A Igreja
corpo místico de Cristo
7. O Filho
de Deus, unindo a si a natureza humana e vencendo a morte com a sua própria
morte e ressurreição, remiu o homem, transformando-o numa nova criatura (cf.
Gl 6,15; 2Cor 5,17). E, pela comunicação do Espírito, constituiu com os seus
irmãos, chamados de entre todas as gentes, o seu corpo místico.
Neste corpo
a vida de Cristo comunica-se aos crentes, que se unem, através dos sacramentos,
de modo íntimo e real, a Cristo que sofreu e foi glorificado. (6) Pelo batismo
configuramo-nos com Cristo porque num mesmo Espírito fomos batizados
todos nós, para sermos um só corpo (1Cor 12,13). Este rito sagrado
significa e efetua a nossa união à morte e ressurreição de Cristo: Pelo
batismo fomos sepultados com ele na morte; e se nele fomos enxertados por uma
morte semelhante à sua, sê-lo-emos também pela ressurreição (Rm
6,4-5). Nós, participando realmente do corpo do Senhor na fração do pão
eucarístico, somos elevados à comunhão com ele e entre nós. Sendo um só
o pão, todos os que participamos deste pão único formamos também um só
corpo (1Cor 10,17). Assim nos tornamos, todos, membros desse corpo (cf. 1Cor
12,17), e, cada um de nós, membro dos outros (Rm 12,5).
Assim como
os membros do corpo humano, apesar de serem muitos, formam um corpo único,
assim também os fiéis, em Cristo (cf. 1Cor 12,12). Também na edificação do
corpo de Cristo ha diversidade de membros e de funções. Único é o Espírito
que, para bem da Igreja distribui os seus vários dons conforme as suas riquezas
e a necessidade de cada ministério (cf. 1Cor 12,1-11). De entre esses dons
sobressai a graça própria dos apóstolos, a cuja autoridade o mesmo Espírito
sujeitou até os carismáticos (cf. 1Cor 14). O Espírito, unificando o corpo
por si, com a sua virtude e a coesão interna dos membros, produz e estimula a
caridade entre os fiéis. Daí que, se algum membro sofre, sofrem com ele os
demais; se um membro recebe glória, todos os outros se regozijam com ele (cf.
1Cor 12,26).
Cristo é a
cabeça deste corpo. Ele é a imagem do Deus invisível, e nele foram criadas
todas as coisas. Ele existe antes de todos, e tudo subsiste nele. Ele é a cabeça
do corpo que é a Igreja. Ele é o princípio, o primogênito de entre os
mortos, de modo que em tudo ele tem a primazia (cf. Cl 1,15-18). Com a grandeza
do seu poder domina o céu e a terra, e com a sua eminente perfeição e com seu
agir enche todo o corpo, das riquezas da sua glória (cf. Ef 1,18-23) (7)
Todos os
membros devem conformar-se com ele, até que neles se forme Cristo (cf. Gl
4,19). Por isso, somos incorporados nos mistérios da sua vida, configuramo-nos
com ele, morremos e ressuscitamos com ele, até que reinaremos com ele (cf. Fl
3,21; 2Tm 2,11; Ef 2,6; Cl 2,12 etc.). Durante a peregrinação terrena seguimos
as suas pegadas na tribulação e na perseguição, associamo-nos à sua paixão
como o corpo à cabeça, e sofremos com ele para com ele sermos depois
glorificados (cf. Rm 8,17).
Dele, o
corpo inteiro recebe alimento e coesão, através dos ligamentos e junturas,
realizando assim o seu crescimento em Deus (Cl 2,19). Ele distribui
continuamente ao seu corpo, que é a Igreja, os dons dos ministérios, pelos
quais, graças ainda ao seu poder, nos ajudamos uns aos outros no caminho da
salvação, para que, professando a verdade na caridade, cresçamos de todos os
modos para ele, que é a nossa cabeça (cf. Ef 4, 11-16, grego).
Para que
possamos renovar-nos constantemente nele (cf. Ef 4,23), repartiu conosco o seu
Espírito, o qual, sendo um só e o mesmo na cabeça e nos membros, vivifica,
unifica, e dirige de tal modo o corpo inteiro, que a sua função pôde ser
comparada pelos santos Padres àquela que a alma, princípio de vida, exerce no
corpo humano. (8)
Cristo ama
a Igreja como sua esposa, tornando-se o modelo do marido que ama a esposa como
ao seu próprio corpo (cf. Ef 5,25-28); e a Igreja, por seu lado, está sujeita
a Cristo, sua cabeça (Id. 23-24). Porque nele habita corporalmente toda
plenitude da divindade (Cl 2,9), ele enche com os seus dons divinos a
Igreja, que é o seu corpo e o seu complemento (cf. Ef 1,22-23), para que ela
procure e alcance toda a plenitude de Deus (cf. Ef 3,19).
A Igreja
ao mesmo tempo visível e espiritual
8. Cristo,
Mediador único, constituiu e sustenta indefectivelmente sobre a terra, como
organismo visível, a sua Igreja santa, comunidade de fé, de esperança e de
amor, (9) e por meio dela comunica a todos a verdade e a graça. Contudo,
sociedade dotada de órgãos hierárquicos e corpo místico de Cristo, assembléia
visível e comunidade espiritual, Igreja terrestre e Igreja já na posse doa
bens celestes, não devem considerar-se coisas independentes, mas constituem uma
realidade única e complexa, em que se fundem dois elementos, o humano e o
divino. (10) Não é, por isso, criar uma analogia inconsistente comparar a
Igreja ao mistério da encarnação. Pois, assim como a natureza assumida pelo
Verbo divino lhe serve de órgão vivo de salvação, a ele indissoluvelmente
unido, de modo semelhante a estrutura social da Igreja serve ao Espírito de
Cristo, que a vivifica, para fazer progredir o seu corpo místico (cf. Ef 4,16).
(11)
Esta á a
única Igreja de Cristo, que no símbolo professamos una, santa, católica e
apostólica, (12) e que o nosso Salvador, depois de sua ressurreição, confiou
a Pedro para que ele a apascentasse (Jo 21,17), encarregando-o, assim como aos
demais apóstolos de a difundirem e de a governarem (cf. Mt 28,18 ss),
levantando-a para sempre como coluna e esteio da verdade (1Tm 3,15).
Esta Igreja, como sociedade constituída e organizada neste mundo, subsiste na
Igreja católica, governada pelo sucessor de Pedro e pelos bispos em comunhão
com ele, (13) ainda que fora do seu corpo se encontrem realmente vários
elementos de santificação e de verdade, elementos que, na sua qualidade de
dons próprios da Igreja de Cristo, conduzem para a unidade católica.
Do mesmo
modo que Jesus Cristo consumou a redenção na pobreza e na perseguição, assim
também, para poder comunicar aos homens os frutos da salvação, a Igreja é
chamada a seguir o mesmo caminho. Cristo Jesus, sendo de condição divina,
aniquilou-se e tomou a condição de servo (Fl 2,6) e por causa de nós
fez-se pobre, ele que era rico (2Cor 8,9): assim a Igreja, que certamente
precisa de recursos humanos para cumprir a sua missão não foi fundada para
buscar glórias terrenas, mas para pregar, também com seu exemplo, a humildade
e a abnegação. Cristo foi enviado pelo Pai Na anunciar a boa nova aos pobres,
a proclamar a libertação aos cativos (Lc 4,18), a procurar e
salvar o que estava perdido (Lc 19,10): de modo semelhante a Igreja ama
todos os angustiados pelo sofrimento humano, reconhece a imagem do seu Fundador,
pobre e sofredor, nos pobres e nos que sofrem, esforça-se por aliviar-lhes a
indigência, e neles deseja servir a Cristo.
Mas enquanto Cristo santo,
inocente, imaculado (Hb 7,26), não conheceu o pecado (2Cor 5,21), e veio
expiar unicamente os pecados do povo (cf. Hb 2,17), a Igreja reúne em seu seio
os pecadores, e por isso, ao mesmo tempo que é santa, precisa também de
purificação, e sem descanso prossegue no seu esforço de penitência e renovação.
A Igreja
continua o seu peregrinar entre as perseguições do mundo e as consolações
de Deus, (14) anunciando a cruz e a morte do Senhor, até que ele venha
(cf. 1Cor 11,26). Mas encontra força no poder do Senhor ressuscitado, para
vencer, na paciência e na caridade, as próprias aflições e dificuldades,
internas e exteriores, e para revelar ao mundo, com fidelidade, embora entre
sombras, o mistério de Cristo, até que por fim ele se manifeste em luz total.
Notas:
(1)
Cf. São Cipriano, Epist. 64,4: PL 3, 1017. CSEL (Hartel), III B, p. 720. Santo
Hilário de Poitiers, In Mt 23,6: PL 9, 1047. Santo Agostinho, passim. São
Cirilo de Alexandria, Glaph. in Gen., 2, 10: PG 69, 110 A.
(2) Cf. São Gregório Magno, Hom in Evang. 19, 1: PL 76, 1154 8. Santo
Agostinho, Serm. 341, 9, 11: PL 39, 1499 ss. São João Damaceno, Adv. Iconoci.,
11: PG 96, 1358.
(3) Cf. Santo Irineu, Adv. Haer. III, 24, 1: PG 7, 966 8; Harvey 2, 131; d. Sagnard
Sources Chr., p. 398.
(4) São Cipriano, De Orat. Dom. 23: PL 4, 553;
Hartel, III A, p. 285. Santo Agostinho, Serm. 71, 20, 33: PL 38, 463 55. São João
Damaceno, Adv. Iconocl., 12: PG 96. 1358 D.
(5) Cf. Orígines.
In Mat. 16. 21: PG 13, 1443 C; Tertuliano, Adv.
Marc.. 3, 7: PL 2, 357 C; CSEL 47. 3 p. 386. Para os documentos cf.
Sacramentarium Gregorianum: PL 78, 160 B; ou C. Mohlberg, Líber Sacramentorum
romanae ecclesiae , Roma, 1960, p, 111, XC: Deus qui ex omni coaptatione
sanctorum aeternum tibi condis babitaculum . . . Hino Urba lerusalem
beata, no Breviário monástico e Coelestis urba Ierusalem, no Breviário
Romano.
(6) Cf.
Santo Tomás, Summa Theol. III, q. 62, a. 5, ad 1.
(7) Cf. Pio XII Carta Enc. Mystici Corporis, 29
de junho 1943: AAS 35 (1943) p. 208.
(8) Cf. Leão XIII, Carta Enc. Divinum IIIud, 9 de maio de 1897 ASS 29 (1896-97)
p. 650. Pio XII, Carta Enc. Mystici Corporis. 1. c. pp. 219-220, Denz. 2288 (3807).
Santo Agostinho, Serm. 268, 2: PL 38, 1232. São
João Crisóstomo, ln Eph.. Hom. 9,3: PG 62. 72. Dídimo de AIex., Trjn. 2, 1;
PG 39, 449 ss. São Tomás, ln Col., 1, 18, lect. 5: Ed. Mariettj, II, n. 46:
Sicut constituitur unum corpus ex unitate animae, ita Ecclesia ex unitate
Spiritua . . .
(9) Leão XIII, Carta Enc. Sapientiae christianae, 10 junho 1890: ASS 22
(1889-90) p. 392. ld., Carta Enc. Satis cognitum, 29 junho 1896: ASS 28
(1895-96) pp. 710 e 724 ss. Pio XII, Carta Enc. Mystici
Corporis, 1. c. pp. 199-200.
(10) Cf. Pio XII, Carta Enc. Myatici
Corporis, 1. c., p. 221 ss. Id.,
Carta Enc. Humani Generis, 12 agosto 1950: AAS
42 (1950) p. 571.
(11) Leão XIII, Carta Enc. Satis cognitum, 1 c., p. 713.
(13) Diz-se: Sancta (catholica apostolica) Romana Ecclesia: na Prof.
fidei Trid., 1 cit. e Conc. Vat. I,
Sess. III, Const. dogm. de fidei
cath.: Denz. 1782 (3001).
9. Em
qualquer tempo e nação, é aceito por Deus todo aquele que o teme e pratica a
justiça (cf. At 10,35). Aprouve, no entanto, a Deus santificar e salvar os
homens, não individualmente, excluindo toda a relação entre os mesmos, mas
formando com eles um povo, que o conhecesse na verdade e o servisse em
santidade. E assim escolheu Israel para seu povo, estabeleceu com ele uma aliança,
e o foi instruindo gradualmente, manifestando-se a si mesmo e os desígnios da
sua vontade, na própria história do povo, santificando-o para si. Tudo isto
aconteceu como preparação e figura daquela aliança nova e perfeita, que
haveria de ser selada em Cristo, e da revelação mais plena que havia de
ser-nos comunicada pelo próprio Verbo de Deus, feito carne. Eis que vêm
os dias (palavra do Senhor), em que estabelecerei com a casa de Israel e a casa
de Judá uma aliança nova ... Gravarei no mais profundo do seu ser a minha lei
e escrevê-la-ei em seus corações; serei o seu Deus e eles serão o meu povo.
Todos hão de conhecer-me desde o menor ao maior, diz o Senhor (Jr
31,31-34). Cristo estabeleceu este novo pacto, a nova aliança do seu sangue
(cf. 1Cor 11,25), formando, dos judeus e dos gentios, um povo que realizasse a
sua própria unidade, não segundo a carne mas no Espírito, e constituísse o
novo povo de Deus. Os que crêem em Cristo, renascidos duma semente não corruptível
mas incorruptível pela palavra do Deus vivo (cf. 1Pd 1,23), não da carne mas
da água e do Espírito Santo (cf. Jo 3,5-6), vêm a constituir a estirpe
eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo conquistado... que em tempos
não o era, mas agora é o povo de Deus (1Pd 2,9-10).
Este povo
messiânico tem por cabeça Cristo, o qual foi entregue por causa dos
nossos crimes e ressuscitou para nossa justificação (Rm 4,25), e que,
havendo recebido um nome que está acima de todo o nome, reina já gloriosamente
nos céus. A sua condição é a da dignidade e da liberdade dos filhos de Deus,
em cujos corações habita o Espírito Santo como num templo. Tem por lei o
mandamento novo, de amar como Cristo nos amou (cf. Jo 13,34); e tem por fim, o
reino de Deus, começado já na terra pelo próprio Deus mas que deve ser
continuamente desenvolvido até ser também por ele consumado no fim dos tempos,
quando Cristo, nossa vida, aparecer (cf. Cl 3,4), e toda a criação for
libertada da escravidão da corrupção, para a liberdade da glória dos
filhos de Deus (Rm 8,21).
Assim o povo messiânico, ainda que não abranja
atualmente os homens todos e repetidas vezes seja mencionado como um pequeno
rebanho, é para toda a humanidade um germe fecundíssimo de unidade, de esperança
e de salvação. Constituído por Cristo em ordem à comunhão de vida, de amor
e de verdade, é, nas mãos do mesmo Cristo, instrumento da redenção
universal, e é enviado ao mundo inteiro como luz do mesmo mundo e sal da terra
(cf. Mt 5,13-16).
Do mesmo
modo que Israel segundo a carne, peregrino no deserto, é já chamado Igreja de
Deus (2Esd 13,1; cf. Nm 20,4; Dt 23,1 ss), assim também o novo Israel do tempo
atual, que anda em busca da cidade futura e permanente (cf. Hb 13,14), se chama
Igreja de Cristo (cf. Mt 16,18), porque ele a conquistou com seu sangue (cf. At
20,28), a encheu do seu Espírito e a dotou com meios aptos para uma união visível
e social.
Deus convocou todos aqueles que em Jesus vêem, com fé, o autor da
salvação e o princípio da unidade e da paz, e com eles constituiu a Igreja, a
fim de que ela seja, para todos e cada um, o sacramento visível desta unidade
salvadora. (1) A Igreja deve estender-se a todas as regiões; entra na história
dos homens, ao mesmo tempo que transcende o próprio tempo e os confins dos
povos. E ao caminhar por entre as tentações e as provas, ela é fortalecida
pelo conforto da graça de Deus, que o Senhor lhe prometera, para que, na
fraqueza da carne, se não afaste da fidelidade perfeita, mas se conserve sempre
como esposa digna do seu Senhor e não deixe nunca de renovar-se pela ação do
Espírito Santo, até que, pela cruz, atinja aquela luz que não conhece ocaso.
Sacerdócio
comum
10. Cristo
Senhor, Pontífice tomado de entre os homens (cf. Hb 5,1-5), fez do novo povo
um reino de sacerdotes para Deus, seu Pai (cf. Ap 1,6; cf. 5,9-10).
Pela regeneração e pela unção do Espírito Santo, os batizados consagram-se
para serem edifício espiritual e sacerdócio santo, a fim de, através de toda
a sua atividade cristã, oferecerem sacrifícios espirituais e proclamarem as
grandezas daquele que das trevas os chamou para a sua luz maravilhosa (cf. 1Pd
2,4-10). Assim, todos os discípulos de Cristo, perseverando na oração e no
louvor de Deus (cf. At 2,42-47), ofereçam-se também a si mesmos como hóstia
viva, santa, agradável a Deus (cf. Rm 12,1); dêem testemunho de Cristo em toda
a parte; e, àqueles que por isso se interessarem, falem da esperança que
possuem, na vida eterna (cf. 1Pd 3,15).
O sacerdócio
comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial ou hierárquico, apesar de
diferirem entre si essencialmente e não apenas em grau, ordenam-se um para o
outro mutuamente; de fato, ambos participam, cada qual a seu modo; do sacerdócio
único de Cristo. (2) O sacerdote ministerial, pelo poder sagrado de que é
investido, organiza e rege o povo de Deus, em nome de todo o povo; por seu lado
os fiéis, em virtude do seu sacerdócio régio, (3) têm também parte na oblação
da eucaristia e exercem o mesmo sacerdócio na recepção dos sacramentos, na
oração e na ação de graças, através do testemunho duma vida santa, da
abnegação e da caridade operante.
O exercício
do sacerdócio comum nos sacramentos
11. A índole
sagrada e orgânica da comunidade sacerdotal exerce-se nos sacramentos e na prática
das virtudes. Os fiéis, incorporados na Igreja pelo batismo, recebem o caráter
que os delega para o culto cristão, e, renascidos como filhos de Deus, são
obrigados a professar diante dos homens a fé que pela Igreja receberam de Deus.
(4) Pelo sacramento da confirmação vinculam-se mais perfeitamente à Igreja e
recebem especial vigor do Espírito Santo. Ficam assim mais seriamente
comprometidos, como testemunhas verdadeiras de Cristo, a difundir e defender a fé
por palavras e por obras. (5) Participando no sacrifício eucarístico, que é
fonte e ponto culminante de toda a vida cristã, oferecem a Deus a Vítima
divina, e oferecem-se a si mesmos com ela: (6) e assim, tanto pela oblação
como pela sagrada comunhão, todos realizam a sua parte própria na ação litúrgica,
não de maneira igual, mas cada qual a seu modo. E, fortificados com o corpo de
Cristo na sagrada comunhão, manifestam de forma concreta a unidade do povo de
Deus, convenientemente operada por este sacramento augustíssimo.
Aqueles que
se aproximam do sacramento da penitência obtêm da misericórdia de Deus o perdão
da ofensa que lhe fizeram e, ao mesmo tempo, reconciliam-se com a Igreja que
feriram pelo pecado, a qual procura levá-los à conversão pela caridade, pelo
exemplo e pela oração. Pela santa unção dos enfermos e a oração dos
sacerdotes, toda a Igreja encomenda os doentes ao Senhor, que sofreu e foi
glorificado, para que ele os alivie e salve (cf. Tg 5,14-16), e exorta-os a
unirem-se livremente à paixão e morte de Cristo (cf. Rm 8,17; Cl 1,24; 2Tm
2,11-12;
1Pd 4,13), e a contribuírem assim para o bem do povo de Deus. Por sua
vez, os fiéis que chegam a receber as sagradas ordens, ficam, em nome de
Cristo, destinados a apascentar a Igreja, com a palavra e a graça de Deus.
Finalmente
os esposos cristãos, pela virtude do sacramento do matrimônio, que faz com que
eles sejam símbolos do mistério de unidade e de amor fecundo entre Cristo e a
Igreja, e que do mesmo mistério participem (cf. Ef 5,32), ajudam-se mutuamente
a conseguir a santidade na vida conjugal e na aceitação e educação dos
filhos, e gozam, para isso, no estado e na função que lhes são próprios, de
um dom característico dentro do povo de Deus (cf. 1Cor 7,7). (7) É realmente
desta união que procede a família, na qual para a sociedade humana nascem os
novos cidadãos, os quais - pela graça do Espírito Santo e para perpetuarem
através dos séculos o povo de Deus - pelo batismo se tornam filhos de Deus. É
necessário que nesta, que bem pode chamar-se Igreja doméstica, os pais sejam
para os filhos, através da palavra e do exemplo, os primeiros arautos da fé, e
fomentem a vocação própria de cada um, com especial cuidado a vocação
sagrada.
Dispondo de
meios tão numerosos e eficazes, todos os cristãos, qualquer que seja a sua
condição ou estado, são chamados pelo Senhor a procurarem, cada um por seu
caminho, a perfeição daquela santidade pela qual é perfeito o próprio Pai
celeste.
O
sentido da fé e os carismas do povo cristão
12. O povo
santo de Deus participa também da missão profética de Cristo: dá testemunho
vivo dele especialmente pela vida de fé e de caridade, e oferece a Deus o
sacrifício de louvor, fruto dos lábios que glorificam o seu nome (cf. Hb 13,
15). A totalidade dos fiéis, que possuem a unção que vem do Espírito Santo
(cf. 1Jo 2,20. 27), não pode enganar-se na fé, e manifesta esta sua
propriedade característica através do sentido sobrenatural da fé do povo
inteiro, quando desde os bispos até' aos últimos fiéis leigos, (8)
exprime o seu consenso universal a respeito das verdades de fé e costumes. Graças
a este sentido da fé, que tem a sua origem e o seu alimento no Espírito de
verdade, o povo de Deus, sob a orientação do sagrado magistério e na fiel
obediência ao mesmo, recebe, não uma palavra humana, mas a palavra de Deus
(cf. 1Ts 2,13), adere indefectivelmente à fé, transmitida aos santos duma vez
para sempre (cf. Jd 3), penetra-a mais profunda e convenientemente, e transpõe-na
para a vida com maior intensidade.
Além
disso, o mesmo Espírito Santo não se limita a santificar e a dirigir o povo de
Deus por meio dos sacramentos e dos ministérios, e a orná-lo com as virtudes,
mas também, nos fiéis de todas as classes, - distribui individualmente e a
cada um, conforme entende, os seus dons (1Cor 12,11), e as graças
especiais, que os tornam aptos e disponíveis para assumir os diversos cargos e
ofícios úteis à renovação e maior incremento da Igreja, segundo aquelas
palavras: A cada qual se concede a manifestação do Espírito para
utilidade comum (1Cor 12,7).
Devem aceitar-se estes carismas com ação de
graças e consolação, pois todos, desde os mais extraordinários aos mais
simples e comuns, são perfeitamente acomodados e úteis às necessidades da
Igreja. Não devemos pedir temerariamente estes dons, nem esperar deles com
presunção os frutos das obras apostólicas; é aos que governam a Igreja que
pertence julgar da sua genuinidade e da conveniência do seu uso, e cuidar
especialmente de não extinguir o espírito, mas tudo ponderar, e reter o que é
bom (cf. 1Ts 5,12-21 e 19-21).
A
universalidade ou catolicidade do único povo de Deus
13.
Todos os homens são chamados ao povo de Deus. É por isso que este povo,
permanecendo uno e único, deve dilatar-se até os confins do mundo inteiro e em
todos os tempos, para se dar cumprimento ao desígnio de Deus que, no princípio,
criou a natureza humana e decidiu congregar finalmente na unidade todos os seus
filhos que andavam dispersos (cf. Jo 11,52). Para isto mandou Deus o seu Filho,
a quem constituiu herdeiro de todas as coisas (cf. Hb 1,2), para ser o Mestre, o
Rei e o Sacerdote de todos, a cabeça do povo novo e universal dos filhos de
Deus. Para isto, enfim, mandou Deus o Espírito do seu Filho, o Espírito
soberano e vivificante que é para toda a Igreja e para todos e cada um dos
crentes, o princípio da aglutinação e da unidade na doutrina dos apóstolos,
na união fraterna, na fração do pão e nas orações (cf. At 2,42, grego).
Assim,
o único povo de Deus estende-se a todos os povos da terra, dentre os quais vai
buscar os seus membros, cidadãos dum reino, de natureza celeste e não terrena.
De fato, todos os fiéis espalhados pelo mundo mantêm-se em comunhão com os
demais no Espírito Santo e assim aquele que reside em Roma sabe que os índios
são membros seus. (9) Mas porque o reino de Deus não é deste mundo (cf.
Jo 18,36), a Igreja, o povo de Deus, instaurando este reino não subtrai nada ao
bem temporal de cada povo, antes, pelo contrário, fomenta e assume as
possibilidades, os recursos e o estilo de vida dos povos, naquilo que têm de
bom, e, ao assumi-los, purifica-os, consolida-os e eleva-os. Ela sabe que tem de
recolher com aquele Rei a quem todos os povos foram dados por herança (cf. Sl
2,8) e para cuja cidade levam os seus dons e as suas ofertas (cf. Sl 71 (72)
,10; Is 60,4-7; Ap 21, 24). Este caráter de universalidade que distingue o povo
de Deus, é um dom do Senhor, graças ao qual a Igreja tende constante e
eficazmente para congregar em Cristo, sua cabeça, na unidade do Espirito, (10)
a humanidade inteira, com tudo o que ela tem de bom.
Por
força desta catolicidade cada parte contribui com os seus dons peculiares para
as demais e para toda a Igreja, de modo que o todo e cada parte crescem por
comunicação mútua e pelo esforço comum em ordem a alcançar a plenitude na
unidade. É por isso que o povo de Deus não só reúne povos diversos, mas
ainda comporta em si mesmo variedade orgânica. Entre os seus membros reina a
diversidade, quer nos cargos, e assim alguns exercem o sagrado ministério para
o bem dos seus irmãos, quer na condição e no modo de vida, e assim muitos no
estado religioso, procurando a santidade por um caminho mais estreito, são um
estímulo e exemplo para os seus irmãos. É ainda por este motivo que existem
legitimamente, no seio da comunhão eclesial, Igrejas particulares, gozando de
tradições próprias, sem prejuízo do primado da Sé de Pedro, que preside à
comunhão universal da caridade, (11) protege as diversidades legítimas e vela
para que as particularidades, não só não prejudiquem a unidade, mas para ela
contribuam mesmo positivamente.
Daí,
enfim, haver entre as diversas partes da Igreja vínculos de comunhão íntima
quanto às riquezas espirituais e quanto à distribuição dos operários apostólicos
e dos recursos materiais. Os membros do povo de Deus são realmente chamados a
porem em comum os seus bens, e a cada uma das Igrejas se aplicam as palavras do
apóstolo: Servir aos outros, cada qual na medida do dom que recebeu,
comunicando-o uns aos outros como bons administradores da multiforme graça de
Deus (1Pd 4,10).
A
esta unidade católica do povo de Deus, que prefigura e promove a paz universal,
são chamados todos os homens: a ela pertencem ou para ela se orientam, embora
de maneira diferente, tanto os católicos como todos os cristãos, e mesmo todos
os homens em geral, chamados pela graça de Deus à salvação.
Os
fiéis católicos
14.
Em primeiro lugar, é aos fiéis católicos que o santo Concílio dirige o
pensamento. Apoiado na Sagrada Escritura e na Tradição, ensina que esta
Igreja, peregrina na terra, é necessária para a salvação. Só Cristo é
mediador e caminho de salvação: ora, ele torna-se-nos presente no seu corpo
que é a Igreja; e, ao inculcar expressamente a necessidade da fé e do batismo
(cf Mc 16,16; Jo 3,5), ao mesmo tempo corroborou a necessidade da Igreja, na
qual os homens entram pela porta do batismo. Por conseguinte, não poderão
salvar-se aqueles que se recusam a entrar ou, a perseverar na Igreja católica,
sabendo que Deus a fundou por Jesus Cristo como necessária à salvação.
São
incorporados plenamente na sociedade, que é a Igreja, todos os que, tendo o Espírito
de Cristo, aceitam integralmente a organização da mesma e todos os meios de
salvação nela instituídos, e que, além disso, graças aos vínculos da
profissão de fé , dos sacramentos, do governo e da comunhão eclesial,
permanecem unidos, no conjunto visível da Igreja, com Cristo, que a rege por
meio do Sumo Pontífice e dos bispos. Não se salvam, porém, os que, embora
incorporados na Igreja, não perseveram na caridade, e por isso pertencem ao
seio da Igreja não pelo coração mas tão-só pelo
corpo. (12) Lembrem-se todos os filhos da Igreja que a grandeza da
sua condição não se deve atribuir aos próprios méritos, mas a uma graça
especial de Cristo; se não correspondem a essa graça por pensamentos, palavras
e obras, em vez de se salvarem, incorrem num juízo mais severo. (13)
Os
catecúmenos que, sob a ação do Espírito Santo, desejam e querem
expressamente ser incorporados na Igreja, já em virtude deste desejo lhe estão
unidos. E a Igreja, como mãe, já lhes dedica o seu amor e os seus cuidados.
As
relações da Igreja com os cristãos não católicos
15.
Por múltiplas razões a Igreja reconhece-se unida aos batizados que se honram
do nome de cristãos, mas não professam integralmente a fé, ou não mantêm a
unidade de comunhão sob o sucessor de Pedro. (14) Há muitos que veneram a
Sagrada Escritura como norma de fé e de vida, manifestam sincero zelo
religioso, crêem de todo o coração em Deus-Pai Onipotente e em Cristo Filho
de Deus e Salvador, (15) são marcados pelo batismo que os une a Cristo, e
admitem mesmo outros sacramentos e recebem-nos nas suas igrejas próprias ou nas
suas comunidades eclesiais. Vários dentre eles possuem também o episcopado,
celebram a sagrada eucaristia, e cultivam a devoção pela Virgem Mãe de Deus.
(16) A isto se junta ainda a comunhão de orações e de outros benefícios
espirituais; e mesmo certa união verdadeira no Espírito Santo que, também
neles, opera com o seu poder santificante por meio de dons e graças, e a alguns
fortaleceu até à efusão do sangue. Assim, o Espírito suscita em todos os
discípulos de Cristo o desejo e a ação, para que todos, do modo estabelecido
por Cristo, se unam pacificamente, num só rebanho, sob um único Pastor. (17)
Para o conseguir, a Igreja, verdadeira mãe, não deixa de rezar, de esperar, e
de atuar, exortando os seus filhos a purificarem-se e a renovarem-se, para que
sobre a sua face resplandeça mais brilhante o sinal de Cristo.
Os
não cristãos
16.
Por último, também aqueles que ainda não receberam o Evangelho estão
destinados, de modos diversos, a formarem parte do povo de Deus. (18) Em
primeiro lugar, aquele povo que foi objeto das alianças e promessas, e do qual
Cristo nasceu segundo a carne (Rm 9,4-5); povo em virtude da sua eleição tão
amado por causa dos patriarcas: pois os dons e os chamamentos de Deus são
irrevogáveis (cf. Rm 11, 28-29). Mas o desígnio de salvação abrange
igualmente aqueles que reconhecem o Criador, em particular os muçulmanos, que,
professando manter a fé de Abraão, adoram conosco um Deus único e
misericordioso, que há de julgar os homens no último dia. Nem mesmo dos
outros, que buscam ainda nas sombras e em imagens o Deus desconhecido, está
longe esse mesmo Deus, pois ele é quem a todos dá a vida e a ressurreição e
tudo o mais (cf. At 17,25-28), e quem, como Salvador, quer que todos os homens
sejam salvos (cf. 1Tm 2,4). Aqueles que ignoram sem culpa o Evangelho de Cristo
e a sua Igreja, mas buscam a Deus na sinceridade do coração, e se esforçam.
sob a ação da graça, por cumprir na vida a sua vontade, conhecida através
dos ditames da consciência, também esses podem alcançar a salvação eterna.
(19) Nem a divina providência nega os meios necessários para a salvação àqueles
que, sem culpa, ainda não chegaram ao conhecimento explícito de Deus, mas
procuram com a graça divina viver retamente. De fato, tudo o que neles há de
bom e de verdadeiro, considera-o a Igreja como preparação evangélica (20) e
dom daquele que ilumina todo o homem para que afinal venha a ter vida. Contudo,
os homens, muitas vezes enganados pelo demônio, entregaram-se a pensamentos vãos
e trocaram a verdade de Deus pela mentira, servindo mais às criaturas que ao
Criador (cf. Rm 1,21.25); ou então vivendo e morrendo sem Deus neste mundo,
expõem-se à desesperação final. Por isso, solícita da glória de Deus e da
salvação de todos, a Igreja, lembrada do mandamento do Senhor: Pregai o
Evangelho a toda criatura (Mc 16,15), põe todo seu cuidado em desenvolver as
missões.
O
caráter missionário da Igreja
17.
Assim como fora enviado pelo Pai, assim também o Filho enviou os apóstolos
(cf. Jo 20,21), dizendo: Ide pois, ensinai todas as gentes, batizando-as
em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, ensinando-as a observar tudo
aquilo que vos mandei. E eis que eu estou convosco todos os dias até à consumação
dos séculos (Mt 28,18-20). Este mandamento solene de Cristo, de anunciar
a verdade da salvação, recebeu-o a Igreja dos apóstolos para lhe dar
cumprimento até aos confins da terra (cf. At 1,8); por isso faz suas as
palavras do Apóstolo: Ai de mim se não evangelizar! (1Cor 9,16), e
continua, sem descanso, a enviar arautos do Evangelho, até que as jovens
Igrejas fiquem perfeitamente estabelecidas, e continuem por si mesmas a obra de
evangelização. O Espírito Santo impele-a a cooperar na realização do propósito
de Deus, que estabeleceu Cristo como princípio de salvação para o mundo
inteiro. Pregando o Evangelho, a Igreja dispõe os ouvintes para crerem e
confessarem a fé, prepara-os para o batismo, liberta-os da escravidão do erro
e incorpora-os a Cristo, para que, amando-o, cresçam até à plenitude. E
consegue que tudo o que há de bom no coração e na mente dos homens, ou nos
ritos e nas culturas próprias de cada povo, não só não pereça, mas se
purifique, se eleve e aperfeiçoe, para glória de Deus, confusão do demônio e
felicidade do homem. Cada discípulo de Cristo participa na responsabilidade de
propagar a fé; (21) mas se o batismo pode ser administrado aos crentes por
qualquer pessoa, é ao sacerdote que compete acabar a edificação do corpo com
o sacrifício eucarístico, cumprindo as palavras de Deus pelo Profeta: Do
Oriente ao Ocidente o meu nome é grande entre as nações, e em todos os
lugares é oferecido ao meu nome um sacrifício e uma oblação pura (Ml 1,11).
(22) Assim a Igreja conjuga operações e esforços para que o mundo inteiro se
transforme em povo de Deus, corpo do Senhor e templo do Espírito Santo, e para
que em Cristo, cabeça de todos, seja dada ao Pai e Criador do universo toda a
honra e toda a glória.
Notas:
(1) Cf. São
Cipriano, Epist. 69, 6: PL 3, 1142 D; Hartel 3 B, p. 754; inseparabile
unitatis sacramentum.
(2) Cf. Pio XII, AIoc. Magnificate Dominum, 2 nov. 1954: AAS 46 (1954) p. 669.
Carta Enc. Mediator Dei, 20 nov. 1947: AAS 39 (1947) p. 555.
(3) Cf. Pio XI, Carta Enc. Miserentissimus Redemptor, 8 maio 1928:, AAS 20
(1928) p. 171 ss. Pio XII, Aloc. Vous vous avez, 22 set. 1956: AAS 48 (1956) p.
714.
(4) Cf. Santo Tomás, Summa Theol. III, q. 63, a. 2.
(5) Cf. São Cirilo de Jerusalém, Catech. 17, de Spiritu Sancto, II, 35-37: PG
33, 1009-1012. Nicolau Cabásilas, De Vita in Christo, liv. III, de utilitate
chrismatis: PG 150, 569-580. Santo Tomás, Summa Theol. III, q. 65, a. 3 e q.
72, a. 1 e 5.
(6) Cf. Pio XII, Carta Enc. Mediator Dei, 20 nov. 1947: AAS 39 (1947),
principalmente p. 552 ss.
(7) 1Cor 7,7: Unusquisque proprium donum (idion charisma) habet ex Deo:
alius quidem sic, alius vero sic. Cf. Santo Agostinho, De Dono Persev.,
14, 37: PL 45, 1015 88. - Non tantum continentia Dei donum est, sed
coniugatorum etiam castitas.
(9) Cf. São João Crisóstomo, ln lo. Hom. 65, 1: PG 59, 361.
(10) Cf. santo Irineu, Adv. Haer. III. 16, 6; III, 22, 1-3: PG 7, 925 C-926 A e
958 A; Harvey 2, 87 e 120-123. Sagnard, Ed. Sources Chrét., pp. 290-292 e 372 ss.
(11) Santo Inácio Mart. Ad
Mom., praef.: Ed. Funk, 1, p. 252.
(12) Cf. Santo Agostinho, Bapt. c. Donat., V, 28,39: PL 43, 197: Certe
manifestum est, id quod dicitur, in Ecclesia intus et foris, in corde, non in
corpore cogitandum. Cf. ib., III,' 19, 26
col. 152; V, 18, 24: col. 189; in lo., Trat. 61, 2: PL 35, 1800, e muitas vezes
noutros lugares.
(13) Cf. Lc 12,48: Omnis autem, cui multum datum est, muItum quaeretur ab
eo. Cf. também Mt 5,19-20; 7,21-22; 25,41-46; Tg 2,14.
(14) Leão
XIII, Epist. Apost. Praeclara Gratulationis, 20
junho 1894: ASS 26 (1893-94) p. 707.
(15) Cf.
Leão XIII, Epist. Enc. Satis Cognitum, 29
junho 1896: ASS 28 (1895-96) p. 738. Epist. Enc. Caritatis Studium, 25 julho 1898: ASS 31
(1898-99) p. 11. Pio XII, Radiomensagem
Nell'alba, 24 dez. 1941: AAS 34 (1942) p. 21.
(16) Cf. Pio XI, Carta Enc. Rerum Orientalium, 8 set. 1928: AAS 20 (1928) p. 287. Pio
XII, Carta Enc. Orientalis Ecclesiae.
(17) Cf. Instr. S. Ofício, 20 dez. 1949: AAS 42 (1950) p. 142.
(18) Cf. santo Tomás, Suma Theol. III, q. 8, a. 3, ad 1.
(19) Cf. Epist. do 5. Ofício ao Arceb. de
Boston: Denz 3869-72.
(20) Cf. Eusébio de Ces., Praeparatio Evangelica, 1,1: PG 21,27 AB.
(21) Cf. Bento XV, Epist. Apost. Maximum IIIud: AAS 11 (1919) p. 440,
principalmente p. 451 55. Pio XI, Carta Enc. Rerum Ecclesiae: AAS 18 (1926) pp.
68-69. Pio XII, Carta Enc. Fidei Donum, 21 abril 1957: AAS 49 (1957) pp.
236-237.
(22) Cf.
Didaquè, 14: ed. Funk, I, p. 32. São Justino,
Dial. 41: PG 6, 564. Santo Irineu, Adv. Haer.,
IV, 17, 5: PG 7, 1023: Harvey 2, p. 1992, 85: Conc. de Trento, Sess. 22, cap. 1;
Denz. 939 (1742).
III. CONSTITUIÇÃO
HIERÁRQUICA DA IGREJA E EM ESPECIAL O EPISCOPADO
Proêmio
18.
Cristo nosso Senhor, com o fim de apascentar o povo de Deus e aumentá-lo sempre
mais, instituiu na sua Igreja vários ministérios que se destinam ao bem de
todo o corpo. Na verdade, os ministros que são revestidos do poder sagrado, estão
ao serviço de seus irmãos, para que todos os que pertencem ao povo de Deus e
gozam, portanto, da verdadeira dignidade cristã, tendam livre e ordenadamente
para o mesmo fim e cheguem à salvação.
Este
sagrado Concílio, seguindo a linha do Concílio Vaticano 1, ensina e declara
que Jesus Cristo, Pastor eterno, instituiu a santa Igreja, enviando os apóstolos
como ele próprio fora enviado pelo Pai (cf. Jo 20,21), e quis que os sucessores
destes, os bispos, fossem os pastores na sua Igreja até o fim do mundo. E para
que o Episcopado continuasse único e unido, estabeleceu Pedro na chefia dos apóstolos,
e assentou nele o princípio e o fundamento, perpétuos e visíveis, da unidade
de fé e de comunhão. (1) Este santo Concílio propõe de novo, firmemente, à
fé de todos os fiéis, a doutrina da instituição, perpetuidade, poder e
natureza do sacro primado do Romano Pontífice e do seu infalível magistério
e, prosseguindo no mesmo desígnio, quer afirmar e declarar publicamente a
doutrina acerca dos bispos, sucessores dos apóstolos, que com o sucessor de
Pedro, vigário de Cristo (2) e cabeça visível de toda a Igreja, governam a
casa do Deus vivo.
A
instituição dos doze apóstolos
19.
O Senhor Jesus, depois de ter orado ao Pai, chamou a si os que ele quis e
escolheu os doze para estarem com ele e para os enviar a pregar o reino de Deus
(cf. Mc 3,13-19; Mt 10,1-42); a estes apóstolos (cf. Lc 6,13) constituiu-os sob
a forma de colégio, isto é, de grupo estável, cuja presidência entregou a
Pedro, escolhido dentre eles (cf. Jo 21,15-17). Enviou-os primeiramente aos
filhos de Israel, e depois a todas as gentes (cf. Rm 1,16) para que, com o poder
que lhes entregava, fizessem de todos os povos discípulos seus, os
santificassem e governassem (cf. Mt 28,16-20; Mc 16,15; Lc 24,45-48; Jo 20,
21-23) e, assim guiados pelo Senhor, dilatassem a Igreja e a apascentassem com o
seu ministério, todos os dias até a consumação dos séculos (cf. Mt 28,20).
Foram confirmados plenamente nesta missão no dia de Pentecostes (cf. At
2,1-26), segundo a promessa do Senhor: Recebereis a virtude do Espírito
Santo que descerá sobre vós e sereis minhas testemunhas em Jerusalém e em
toda a Judéia e Samaria e até os confins da terra (At 1,8). Na verdade,
pregando em toda a parte o Evangelho (cf. Mc 16,20), que os ouvintes aceitavam
por obra do Espírito Santo, os apóstolos congregaram a Igreja universal que o
Senhor fundou neles e edificou sobre o bem-aventurado Pedro, como chefe,
permanecendo Cristo Jesus como pedra angular (cf. Ap 21,14; Mt 16,18; Ef 2,20).
(3)
Os
bispos, sucessores dos apóstolos
20.
Esta missão divina, confiada por Cristo aos apóstolos deverá durar até o fim
dos séculos. (cf. Mt 28,20), pois o Evangelho, que eles devem transmitir, é
para a Igreja o princípio de toda sua vida através dos tempos. Por isso os após
tolos, nesta sociedade hierarquicamente organizada, cuidaram de constituir os
seus sucessores.
De
fato, não só se rodearam de vários colaboradores no ministério, (4) mas,
para que a missão a eles confiada tivesse continuidade após a sua morte, os apóstolos,
quase por testamento, incumbiram os seus cooperadores imediatos de terminar e
consolidar a obra por eles começada, (5) recomendando-lhes que atendessem a
toda a grei, na qual o Espírito Santo os havia colocado para apascentaram a
Igreja de Deus (cf. At 20,28). Constituíram assim os seus sucessores e
dispuseram que. na morte destes, fosse confiado o seu ministério a outros
homens experimentados. (6) Entre os vários ministérios que, desde os primeiros
tempos, se exercem na igreja, ocupa o primeiro lugar, como testemunha a tradição,
o múnus daqueles que, constituídos no episcopado, (7) conservam a semente
apostólica por uma sucessão que vem ininterrupta desde o começo. (8) E assim,
como atesta santo Irineu, a tradição apostólica manifesta-se (9) e mantêm-se
(10) no mundo inteiro através daqueles que os apóstolos constituíram bispos e
seus sucessores até ao presente.
Os
bispos receberam o encargo de servir a comunidade com os seus colaboradores,
presbíteros e diáconos, (11) e presidem em nome de Deus à grei, (12) de que são
pastores, como mestres da doutrina, sacerdotes do culto sagrado e ministros do
governo da Igreja. (13) E assim como permanece o múnus que o Senhor concedeu
individualmente a Pedro, o primeiro dos apóstolos, para ser transmitido aos
seus sucessores, do mesmo modo o ofício dos apóstolos, de apascentar a Igreja»
continua e é. exercido permanentemente pela ordem sagrada dos bispos. (14) Por
isso, ensina este sagrado Concílio que, por instituição divina. os bispos
sucederam aos apóstolos (15) como pastores da Igreja: quem os ouve, ouve a
Cristo; quem os despreza, despreza a Cristo e àquele que o enviou (cf. Lc 10,
16). (16)
O
episcopado como sacramento
21.
Na pessoa dos bispos, coadjuvados pelos presbíteros, é o próprio Senhor Jesus
Cristo, pontífice supremo, que está presente no meio dos fiéis. Embora
sentado à direita de Deus-Pai, não se ausenta da comunidade dos seus pontífices;
(17) mas é principalmente através do ministério excelso dos bispos que Jesus
Cristo prega a palavra de Deus a todos os povos e administra continuamente os
sacramentos da fé aos crentes; e, graças ao ofício paternal dos mesmos (cf.
1Cor 4,15), vai incorporando por geração sobrenatural novos membros ao seu
corpo; finalmente, pela sabedoria e prudência dos bispos, dirige e orienta o
povo do Novo Testamento na sua peregrinação para a eterna bem-aventurança.
Estes pastores, escolhidos para apascentarem a grei de Senhor, são os ministros
de Cristo e os administradores dos mistérios de Deus (cf. 1Cor 4,1), e a eles
está confiado o testemunho do Evangelho da graça de Deus (cf. Rm 15,16; At
20,24) e o serviço glorioso do Espírito e da justiça (cf. 2Cor 3,8-9).
Cristo
enriqueceu os apóstolos com a efusão especial do Espírito Santo (cf. At 1,8;
2,4; Jo 20,22-23), em ordem a poderem desempenhar ofícios tão excelsos; os apóstolos,
por sua vez, transmitiram aos seus colaboradores, pela imposição das mãos,
este dom do Espírito (cf. 1Tm 4,14; 2Tm 1,6-7), que chegou até nós pela
consagração episcopal. (18) Ensina, pois, este sagrado Concilio que, pela
consagração episcopal, é conferida a plenitude do sacramento da ordem,
chamada por isso, na liturgia da Igreja e na linguagem dos santos padres,
sumo sacerdócio, cume do ministério sagrado (19) Juntamente
com o múnus de santificar, a consagração episcopal confere ainda os de
ensinar e de governar, ofícios aliás que, por sua natureza, não podem
exercer-se senão em comunhão hierárquica com a cabeça e com os membros do
colégio. Na verdade, da tradição, qual aparece sobretudo nos ritos litúrgicos
e no uso da Igreja quer oriental quer ocidental, consta claramente que, pela
imposição das mãos e pelas palavras consecratórias, se confere a graça do
Espírito Santo (20) e se imprime o caráter sagrado, (21) de tal modo que os
bispos, de maneira eminente e visível, fazem as vezes do próprio Cristo,
Mestre, Pastor e Pontífice, e agem em seu nome. (22) Compete aos bispos
admitir, no corpo episcopal, novos eleitos, pelo sacramento da ordem.
O
colégio dos bispos e a sua cabeça
22.
Tal como, por disposição do Senhor, são Pedro e os demais apóstolos formam
um só colégio apostólico, de maneira semelhante o Romano Pontífice, sucessor
de Pedro, e os bispos, sucessores dos apóstolos, estão unidos entre si. Já a
mais antiga disciplina, segundo a qual os bispos do mundo inteiro tinham comunhão
entre si e com o bispo de Roma pelos vínculos da unidade, da caridade e da paz,
(23) e também os Concílios reunidos (24) para decidirem em comum as coisas
mais importantes (25) depois de ponderadas as opiniões de muitos, (26)
manifestam a índole e a natureza colegial da Ordem episcopal, claramente
comprovada ainda pelos Concílios ecumênicos celebrados no decorrer dos séculos,
e já sugeridas pelo uso antigo de chamar vários bispos a participarem na elevação
dum novo eleito ao ministério do sumo sacerdócio. É em virtude da consagração
sacramental, e mediante a comunhão hierárquica com a cabeça e os membros do
colégio, que fica alguém constituído membro do corpo episcopal.
Mas
o colégio ou corpo episcopal não tem autoridade, se nele não se considera
incluído, como cabeça, o Romano Pontífice, sucessor de Pedro, permanecendo
sempre íntegro o seu poder primada sobre todos, tanto pastores como fiéis.
Pois o Romano Pontífice, em virtude de seu cargo de Vigário de Cristo e de
Pastor de toda a Igreja, tem poder pleno, supremo e universal sobre a Igreja, e
pode sempre exercê-lo livremente. Por outro lado, a ordem dos bispos - que
sucede ao colégio apostólico no magistério e no regime pastoral, e na qual
perdura continuamente o corpo apostólico em união com a sua cabeça, o Romano
Pontífice, e nunca sem ele - é também detentora do poder supremo e pleno
sobre a Igreja universal, mas este poder não pode ser exercido senão com o
consentimento do Pontífice Romano. (27q 1) Só a Pedro o Senhor pôs como rocha e
portador das chaves da Igreja (cf. Mt 16,18-19) e constituiu pastor de toda a
sua grei (cf. Jo 21,15 ss): mas o ofício que deu a Pedro de ligar e desligar
(Mt 16,19), é sabido que o deu também ao colégio dos apóstolos, unido com a
sua cabeça (Mt 18,18; 28,16-20). (28)
Este colégio, porque se compõe de
muitos, expressa a variedade e a universalidade do povo de Deus; e porque se
agrupa sob uma só cabeça, significa a unidade da grei de Cristo. Nele os
bispos, respeitando fielmente o primado e o principado da sua cabeça, exercem
poder próprio para o bem dos seus fiéis e até de toda a Igreja, enquanto o
Espírito Santo vai robustecendo constantemente a sua estrutura orgânica e a
sua concórdia. O poder supremo, que este colégio possui sobre toda a Igreja,
é exercido de modo solene no Concilio ecumênico. Não pode haver Concílio
ecumênico que como tal não seja aprovado ou ao menos reconhecido pelo sucessor
de Pedro; e é prerrogativa do Romano Pontífice convocar estes Concílios,
presidi-los e confirmá-los. (29) Este mesmo poder colegial, em união com o
Papa, pode ser exercido pelos bispos dispersos pelo mundo, desde que a cabeça
do colégio os convoque para uma ação colegial, ou ao menos aprove a ação
conjunta dos bispos dispersos ou a aceite livremente, de modo a torná-la um
verdadeiro ato colegial.
Relação
dos bispos dentro do colégio
23.
A união colegial manifesta-se também nas relações mútuas de cada bispo com
as Igrejas particulares e a Igreja universal. O Romano Pontífice, como sucessor
de Pedro, é o princípio e o fundamento perpétuo e visível da unidade quer
dos bispos quer da multidão dos fiéis. (30) Por sua vez, cada bispo é o princípio
e o fundamento visível da unidade na sua Igreja particular, (31) formada à
imagem da Igreja universal: em todas as Igrejas particulares está e de todas
resulta a Igreja católica una e única. (32) Por isso, cada bispo representa a
sua Igreja; e todos, juntamente com o Papa, representam toda a Igreja no vínculo
da paz, do amor e da unidade.
Cada
bispo, posto à frente duma Igreja particular, exerce o seu poder pastoral sobre
a porção do povo de Deus que lhe foi confiada, mas não sobre as outras
Igrejas nem sobre a Igreja universal. Cada um porém, enquanto membro do colégio
episcopal e sucessor legítimo dos apóstolos, por instituição e preceito de
Cristo, deve ter pela Igreja universal uma solicitude, (33) que, embora não se
exerça por atos de jurisdição, contribui imenso para o bem da Igreja inteira.
Na verdade, devem todos os bispos promover e defender a unidade de fé e a
disciplina, comuns a toda a Igreja, instruir os fiéis no amor de todo o corpo místico
de Cristo, especialmente dos membros pobres, dos que sofrem, e dos que são
perseguidos pela causa da justiça (cf. Mt 5,10); devem, enfim, promover toda a
atividade comum à Igreja inteira, com o objetivo de dilatar a fé e fazer
brilhar para todos os homens a luz da verdade total. E aliás evidente que,
governando bem cada um a própria Igreja, porção da Igreja universal, está
contribuindo eficazmente para o bem de todo o corpo místico, que é também o
corpo das Igrejas. (34)
O
cuidado de anunciar o Evangelho em todo o mundo pertence ao corpo dos pastores,
pois a todos em comum deu Cristo o mandato e impôs um dever comum, como já o
papa Celestino dizia na recomendação aos padres do Concílio de Éfeso. (35)
Por isso, todos e cada um dos bispos, na medida que lhes permite o cumprimento
da função própria, são obrigados a colaborar entre si e com o sucessor de
Pedro, a quem foi confiada de modo, especial a tarefa ingente de propagar a
religião cristã. (36) Devem, pois, com todas as suas forças, prover as missões,
quer de operários para a messe, quer de socorros espirituais e materiais, ou
diretamente por si ou suscitando a cooperação pronta dos fiéis. Finalmente,
nesta comunhão universal de caridade, prestem os bispos de boa vontade ajuda
fraterna às outras Igrejas, especialmente às mais próximas e às mais pobres,
seguindo o exemplo venerando da antigüidade.
Dispôs
a divina providência que várias Igrejas, fundadas em diversas regiões pelos
apóstolos e seus sucessores, se reunissem com o, decorrer dos tempos em grupos
organicamente estruturados, que, salvaguardando a unidade da fé. e a única
constituição divina da Igreja universal, gozem de disciplina, de liturgia e de
tradição teológica próprias. E, algumas dessas,. especialmente as antigas
Igrejas patriarcais, como mães da fé, geraram filhas, às quais continuaram
ligadas até hoje por vínculos mais íntimos de caridade na vida sacramental e
na observância mútua de direitos e deveres. (37) Esta variedade das Igrejas
locais, assim a tenderem para a unidade, demonstra, com maior evidência, a
catolicidade da Igreja indivisa. De modo semelhante, as conferências episcopais
podem hoje desenvolver uma ação variada e fecunda, para que o espírito
colegial encontre aplicações concretas.
O
ministério dos bispos
24.
Os bispos, como sucessores dos apóstolos, recebem do Senhor, a quem foi dado
todo o poder no céu e na terra, a missão de ensinar todas as gentes e de
pregar o Evangelho a toda criatura, para que todos os homens alcancem a salvação
pela fé, pelo batismo, e pela observância dos mandamentos (cf. Mt 28.18; Mc
16,15-16; At 26,27 ss). Para o desempenho desta missão, Cristo Senhor nosso
prometeu o Espírito Santo aos apóstolos, e enviou-o no dia de Pentecostes para
que, robustecidos com a sua força, eles fossem suas testemunhas até aos
confins do terra, perante as gentes, os povos e os reis (cf. At 1,8; 2,l ss;
9,15). Este encargo, que o Senhor confiou aos pastores do seu povo, é um
verdadeiro serviço que na Sagrada Escritura se chama com muita propriedade
''diakonia'', isto é, ministério (cf. At 1,17.25; 21,19; Rm 11,13;
1Tm
1,12).
A
missão canônica dos bispos pode ser conferida segundo os costumes legítimos,
que não hajam sido revogados pelo poder supremo e universal da Igreja, ou
segundo leis promulgadas ou reconhecidas pela mesma autoridade, ou ainda
diretamente pelo próprio sucessor de Pedro; e nenhum bispo pode ser elevado a
tal ofício se o Papa lhe recusa ou nega a comunhão apostólica. (38)
Função docente dos bispos
25. De
entre os deveres principais dos bispos, sobressai a pregação do Evangelho.
(39) Os bispos são, efetivamente, os arautos da fé, que levam a Cristo novos
discípulos; e os doutores autênticos, isto é, investidos na autoridade de
Cristo, que ao povo a eles confiado pregam a fé que deve crer e aplicar à vida
e a ilustram à luz do Espírito Santo, tirando do tesouro da revelação coisas
novas e velhas (cf. Mt 13,52); a fazem frutificar; e afastam com cuidado os
erros que ameaçam as suas greis (cf. 2Tm 4,1-4). Quando ensinam em comunhão
com o Romano Pontífice, os bispos devem ser considerados por todos como
testemunhas da verdade divina e católica; e cada fiel deve aceitar o juízo que
o seu bispo dá em nome de Cristo, nas coisas de fé e moral, e aderir a ele com
religioso respeito Este assentimento religioso da vontade e da inteligência
deve, de modo particular, prestar-se ao magistério autêntico do Romano Pontífice,
ainda mesmo quando não fala ''ex-catedra'' , de maneira que se reconheça com
reverência o seu magistério supremo e se adira sinceramente à doutrina que o
Papa apresenta, quais transparecem principalmente quer da índole dos
documentos, quer da freqüência em propor a mesma doutrina, quer da própria
maneira de falar.
Embora não
gozem da prerrogativa da infalibilidade pessoal, os bispos, no exercício do seu
magistério autêntico em matéria de fé e costumes, (40) enunciam a doutrina
de Cristo de modo infalível quando - dispersos pelo mundo, mas conservando a
comunhão entre si e com o sucessor de Pedro - concordam em propor uma sentença
a seguir como definitiva. isto é ainda mais manifesto quando, reunidos em Concílio
ecumênico são para toda a Igreja juizes e doutores da fé e dos costumes,
devendo aderir-se às suas definições com assentimento de fé. (41)
A
infalibilidade, de que o Divino Redentor dotou a sua Igreja para definir a
doutrina de fé e costumes, abrange 6 depósito da revelação que deve ser
guardado com zelo e exposto com fidelidade. O Romano Pontífice, cabeça do colégio
episcopal, goza desta infalibilidade em virtude do seu oficio, quando define uma
doutrina de fé ou de costumes, como supremo Pastor e Doutor de todos os cristãos,
confirmando na fé os seus irmãos (cf. Lc 22,32).42 Por isso, as suas definições
são irreformáveis em si mesmas, sem necessidade do consentimento da Igreja,
uma vez que são pronunciadas sob a assistência do Espírito Santo, prometida
ao Papa na pessoa de Pedro: não precisam da aprovação de ninguém, nem
admitem qualquer apelo a outro juízo. É que nestes casos, o Romano Pontífice
não dá uma opinião como qualquer pessoa privada, mas propõe ou defende a
doutrina da fé católica como mestre supremo da Igreja universal, dotado
pessoalmente do carisma da infalibilidade que pertence à Igreja. (43) A
infalibilidade prometida à Igreja universal, dotado pessoalmente do carisma da
infalibi-magistério supremo com o sucessor de Pedro. E a estas definições
nunca pode faltar o assentimento da Igreja, devido à ação do Espírito Santo,
que mantém e faz crescer na unidade da fé a grei de Cristo. (44)
Quando o
Romano Pontífice, ou o corpo episcopal juntamente com ele, define uma doutrina,
fá-lo em harmonia com a revelação, à qual todos devem obedecer e
conformar-se. Esta, escrita ou comunicada através da legítima sucessão dos
bispos e, sobretudo, pelo cuidado do Romano Pontífice, é integralmente
transmitida, conservada intacta na Igreja e exposta com fidelidade sob a luz do
Espírito de Verdade. (45) O Sumo Pontífice e os bispos, cada qual na medida
dos respectivos deveres e conforme a gravidade do assunto, esforçam-se
cuidadosamente e usam os meios aptos (46) para a investigação séria e a
enunciação conveniente da revelação; não reconhecem, porém, qualquer nova
revelação publica como pertencendo ao depósito divino da fé. (47)
Função
santificadora dos bispos
26. O
bispo, revestido da plenitude do sacramento da ordem, é o administrador da graça
do sumo sacerdócio, (48) especialmente na eucaristia que ele oferece ou manda
oferecer, (49) e pela qual a Igreja vive e cresce continuamente. Esta Igreja de
Cristo está verdadeiramente presente em todas as legítimas comunidades locais
de fiéis; elas mesmas, unidas aos seus pastores, recebem no Novo Testamento o
nome de Igrejas. (50) São, em cada território, o povo novo, chamado por Deus
no Espírito Santo e em grande plenitude (cf. 1Ts 1,5). Nelas se reúnem os fiéis
por meio da pregação do Evangelho de Cristo e se celebra o mistério da ceia
do Senhor, para que, pela carne e O sangue do corpo do Senhor, se mantenham
unidos todos os irmãos. (51) Cada comunidade reunida em volta do altar,
sob o ministério sagrado do bispo, (52) é símbolo daquela caridade e daquela
unidade do corpo místico sem a qual não pode haver salvação (53)
Cristo está presente nestas comunidades, por mais reduzidas, pobres e.
dispersas que sejam, e congrega pelo seu poder a Igreja una, santa, católica e
apostólica. (54) Na verdade, a participação no corpo e no sangue de
Cristo não opera outra coisa senão a nossa transformação naquilo que
recebemos. (55)
Toda a
celebração legítima da eucaristia é dirigida pelo bispo, a quem foi confiado
o dever de prestar à Majestade divina o culto da religião cristã e de o
regular conforme os preceitos do Senhor e as leis da Igreja, que ele deve
especificar ulteriormente a seu critério, adaptando-as à sua diocese.
Deste modo,
os bispos, rezando pelo povo e trabalhando, repartem de vários modos e com
abundância a plenitude da santidade de Cristo. Pelo ministério da palavra
comunica a força de Deus para a salvação dos crentes (cf. Rm 1,16), e
santificam os fiéis pelos sacramentos, cuja administração ordenada e frutuosa
regulam com a própria autoridade. (56) Regulamentam a administração do
batismo que dá a participação no sacerdócio régio de Cristo. São eles os
ministros primários da confirmação, os dispensadores das sagradas ordens, os
ordenadores da disciplina penitencial; exortam e instruem com solicitude o seu
povo, para que participe com fé e devoção na liturgia, especialmente no santo
sacrifício da missa. Devem, finalmente, edificar com o exemplo de sua vida
aqueles de quem são chefes, guardando os seus costumes de todo o mal e
levando-os, com ajuda de Deus, à perfeição, para que possam chegar à vida
eterna juntamente com a grei que lhes foi confiada. (57)
Função
governativa dos bispos
27. Os
bispos regem como vigários e legados de Cristo as Igrejas particulares a eles
confiadas, (58) com os seus conselhos, exortações e exemplos, e ainda com a
sua autoridade e o seu poder sagrado, de que se serve unicamente para fazer
crescer a sua grei na santidade e na verdade, lembrados de que quem & o
maior deve tornar-se o menor, e quem ocupa o primeiro lugar deve ser como aquele
que serve (cf. Lc 22,26-27). Este poder, de que pessoalmente dispõe em nome de
Cristo, é próprio, ordinário e imediato, ainda que o seu exercício seja
regulado em última instância pela suprema autoridade da Igreja, e possa
circunscrever-se dentro de limites determinados, tendo em vista a utilidade da
Igreja ou dos fiéis. Por força deste poder, os bispos têm o direito sagrado
e, diante do Senhor, o dever de legislar para os seus súditos, de os julgar, e
de regular tudo quanto diz respeito à organização do culto e do apostolado.
A eles está
confiado plenamente o ofício pastoral, isto é, a solicitude habitual e
cotidiana das suas ovelhas, e não devem ser considerados como vigários do
Romano Pontífice, já que estão revestidos de poder próprio, e são, com toda
a verdade, os chefes dos povos que governam. (59) Por isso, o seu poder não
fica anulado pelo poder supremo e universal, mas antes é por ele confirmado,
fortalecido e defendido, (60) conservando o Espírito Santo intacta a forma de
regime que Cristo Senhor nosso estabeleceu na sua Igreja. Enviado pelo Pai de
família, a governar a sua família, o bispo tenha sempre diante dos olhos o
exemplo do Bom Pastor que veio não para ser servido, mas para servir (cf. Mt
20,28; Mc 10,45) e dar a vida pelas suas ovelhas (cf. Jo 10,11). Escolhido de
entre os homens e revestido, também ele, de fraquezas pode compadecer-se dos
ignorantes e dos extraviados {cf. Hb 5,1-2). Não se recuse a ouvir os seus súditos,
amando-os como a verdadeiros filhos e exortando-os a colaborarem prontamente
consigo. Consciente de que tem de dar contas a Deus pelas almas deles (cf. Hb
13,17), abranja com a oração, a pregação e todas as obras de caridade, não
só os súditos, mas também aqueles que não são ainda do único redil, os
quais no entanto deve considerar como pessoas que lhe estão recomendadas no
Senhor. Sendo ele para com todos devedor, como o apóstolo Paulo, esteja pronto
a anunciar o Evangelho a todos (cf. Rm 1,14-15), e estimule os seus fiéis a
darem-se a atividades apostólicas e missionárias. Os fiéis, por seu lado,
devem conservar-se unidos ao bispo como a Igreja está unida a Jesus Crista, e
como Jesus Cristo ao Pai, para que todas as coisas se harmonizem na unidade (61)
e redundem em glória de Deus (cf. 2Cor 4,15).
Os presbíteros,
suas relações com Cristo, com os bispos, com o presbitério e com o povo cristão
28. Cristo
a quem o Pai santificou e enviou ao mundo (Jo 10,36), fez participar os bispos
da sua consagração e da sua missão, através dos apóstolos, aos quais eles
sucedem; (62) e os bispos confiaram legitimamente o cargo do seu ministério, em
grau diverso, a pessoas diversas na Igreja. Assim, o ministério eclesiástico,
de instituição divina, é exercido em ordens diversas por aqueles que já
antigamente eram chamados bispos, presbíteros e diáconos. (63) Ainda que não
tenham sido elevados ao pontificado e dependam dos bispos no exercício dos seus
poderes, os presbíteros estão-lhes unidos na dignidade sacerdotal comum (64)
e, pelo sacramento da ordem, (65) ficam consagrados para pregar o Evangelho,
apascentar os fiéis e celebrar o culto divino, coma verdadeiras sacerdotes do
Novo Testamento, (66) à imagem de Cristo, sumo e eterno Sacerdote (Hb 5,1-10;
7, 24; 9,11-28). Participando, no grau próprio do seu ministério, da função
de Crista, Mediador único (1Tm 2,6), anunciam a todos a palavra de Deus.
Exercem o seu ministério sagrado principalmente na celebração da eucaristia;
nela, agindo na pessoa de Cristo (67) e proclamando o seu mistério, juntam as
orações dos fiéis ao sacrifício de Cristo, sua cabeça; renovam e aplicam no
sacrifício da missa, até à vinda do Senhor (cf. 1Cor 11,26) o único sacrifício
do Novo Testamento, no qual Cristo, uma vez por todas, se ofereceu ao Pai como hóstia
imaculada (cf. Hb 9,11-28). (68) E muito especialmente exercem o ministério da
reconciliação e do alívio, em favor dos arrependidos e dos doentes, e
apresentam a Deus-Pai as necessidades e as orações dos fiéis (cf. Hb 5,1-4).
Desempenhando, na medida da sua autoridade, a função de Cristo, pastor e cabeça,
(69) congregam a família de Deus em fraternidade a tender para a unidade, (70)
e conduzem-na por Cristo e no Espírito, até Deus-Pai. No meio da própria
grei, adoram-no em espírito e verdade (cf. Jo 4,24). Finalmente, trabalham na
pregação e no ensino (cf. 1Tm 5,17), acreditando no que lerem quando meditarem
na lei do Senhor; ensinando o que crerem e pondo em prática aquilo que
ensinarem. (71)
Os presbíteros,
chamados ao serviço do povo de Deus, como prudentes cooperadores da ordem
episcopal, (72) seus auxiliares e seus instrumentos, constituem com o bispo um
único presbitério, (73) ou corpo sacerdotal, embora diversificado pelas funções.
Em cada uma das comunidades locais de fiéis, como que tornam presente o bispo a
quem estão unidos pela confiança e magnanimidade de espírito, e de cujo cargo
e solicitude tomam sobre si uma parte, exercendo-a com dedicação todos os
dias. Sob a autoridade do bispo, santificam e dirigem porção da grei do Senhor
que lhes foi confiada, tornam visível nesse lugar a Igreja universal e dão o
seu contributo eficaz para a edificação de todo o corpo de Cristo (cf. Ef
4,12). Interessados sempre no bem dos filhos de Deus, procurem colaborar na ação
pastoral de toda a diocese e mesmo da Igreja inteira. Mercê desta participação
no sacerdócio e na missão, os presbíteros reconheçam o bispo como seu
verdadeiro pai e obedeçam-lhe com respeito. O bispo, por seu lado, considere os
sacerdotes seus colaboradores, como filhos e amigos, como fez Cristo, que aos
discípulos não chamou servos, mas amigos (cf. Jo 15,15). Em virtude do
sacramento da ordem e do ministério, todos os sacerdotes, quer diocesanos, quer
religiosos, estão unidos ao corpo episcopal e trabalham para o bem de toda a
Igreja, segundo a vocação e a graça de cada um.
A mesma
sagrada ordenação e a mesma missão criam, entre todos os presbíteros, laços
de íntima fraternidade, que deve traduzir-se espontânea e alegremente na ajuda
mutua, espiritual e material, pastoral e pessoal, nas reuniões, na comunhão de
vida, de trabalho e de caridade.
Tenham
cuidados de pai em Cristo para com os fiéis, a quem geraram espiritualmente
pelo batismo e pela doutrina (cf. 1Cor 4,15;
1Pd 1,23). Esforcem-se por ser
modelos do povo (1Pd 5,3), governem e estejam ao serviço da sua comunidade
local, de tal forma que ela mereça de fato o nome, que pertence só ao povo de
Deus e a todo ele, o nome de Igreja de Deus (cf. 1Cor 1,2; 2Cor 1,1; passim).
Lembrem-se que, com a sua conduta de cada dia e com a sua solicitude, devem
mostrar a imagem dum ministério verdadeiramente sacerdotal e pastoral aos fiéis
e infiéis, aos católicos e não católicos, e devem dar a todos testemunho de
verdade e de vida; e como bons pastores devem ir procurar também (cf. Lc
15,4-7) aqueles que foram batizados na Igreja católica, mas abandonaram a prática
dos sacramentos ou mesmo perderam a fé.
Como hoje
em dia a humanidade tende cada vez mais para a unidade civil, econômica e
social, assim importa que os sacerdotes, unindo o seu zelo e os seus esforços
sob a orientação dos bispos e do Sumo Pontífice, procurem suprimir qualquer
motivo de dispersão, para que todo o gênero humano seja reconduzido a unidade
da família de Deus.
Os diáconos
29. No grau
inferior da hierarquia estão os diáconos que receberam e recebem a imposição
das mãos, não para o sacerdócio mas para o ministério. (74)
Assim, confortados pela graça sacramental, servem o povo de Deus nos ministérios
da liturgia, da palavra e da caridade, em comunhão com o bispo e o seu presbítero.
Pertence ao diácono, conforme as determinações da autoridade competente,
administrar o batismo solene, conservar e distribuir a eucaristia, assistir em
nome da Igreja aos matrimônios e abençoá-los, levar o viático aos
moribundos, ler a Sagrada Escritura aos fiéis, instruir e exortar o povo,
presidir ao culto e à oração dos fiéis, administrar os sacramentais e
presidir aos ritos dos funerais e da sepultura. Dedicados as tarefas de caridade
e administração; recordem os diáconos aquele conselho de são Policarpo:
Misericordiosos e diligentes, procedam de harmonia com a verdade do Senhor
que se fez servidor de todos. (75)
Tendo em
conta que, segundo a disciplina hoje 'em dia vigente na Igreja latina, em várias
regiões só dificilmente se chegam a desempenhar estas funções tão necessárias
para a vida da Igreja, daqui em diante poderá o diaconado ser restabelecido
como grau próprio e permanente na hierarquia. Competirá às conferências
episcopais territoriais, de maior ou menor âmbito, decidir, com a aprovação
do Sumo Pontífice, se é oportuno e onde, para o bem das almas, instituírem-se
tais diáconos. Poderá este diaconado, com o consentimento do Romano Pontífice,
ser conferido a homens de idade madura, mesmo casados, ou também a jovens idôneos;
mas para estes últimos mantêm-se em vigor a lei do celibato.
Notas:
(1)
Cf. Conc. Vat. I, Sess. IV Const.
Dogm. Pastor
Aeternus: Denz. 1821 (3050 ss).
(2) Cf. Conc. Flor., Decreto pro graecis: Denz. 694 (1307) e Conc. Vat. I, ib.:
Denz. 1826 (3059).
(3) Cf. Liber Sacramentorum de São Gregório, prefácio Cadeira de são Pedro e
dia de são Matias e são Tomé: PL 78, 50,51 e 152. Santo Hilário In Ps., 67,
10, PL 9,450; CSEL, 22, p. 286. São Jerônimo, Adv. Iovin,, 1. 26: PL 23, 247
A. Santo Agostinho, in Ps. 86, 4: Pt 37. 1103. São Gregório M., Mor. in Job, XXVIII, V:
PL 76, 455-456. Primásio, Comm. in Apoc., V: PL 68. 924, BC. Pascásio Radb.,
In Mat. L. VIII, cap. 16: PL 120, 561 C. Cf. Leão XIII, Epist. Et Sane. 17 dez.
1888: ASS 21 (1888) p. 321.
(4) Cf. At 6,2-6; 11.30; 13,1; 14,23: 20,17; 1Ts 5,12-13; Fl 1,1; Cl 4.11 e
passim.
(5) Cf. At 20,25-27; 2Tm 4,6 85- 1Tm 5,22; 2Tm 2,2; Tt 1.5; s. Clem. Rom. Ad Qor
44,2.: Ed. Funk, 1, p. 156.
(6) São Clemente Rom., Ad. Cor 44,2: Ed. Funk, I, p. 154 ss.
(10) Cf. santo Irineu, Adv. Haer. III, 2, 2: PG 7, 847; Harvey 2, 7; Sagnard, p.
100: custoditur, cf. ib. IV, 26, 2;
col. 1053; Harvey 2, 236 e também IV, 33, 8; col. 1077; Harvey 2, 262.
(11) Santo
Inácio M., Philad., pref.: ed. Funk. I. p. 264.
(12) Santo Inácio M., Philad.. 1, 1: Magn. 6,
1; Ed. Funk, I. pp. 264 e 234.
(13) São Clem. Rom., 1, cit., 42, 3-4; 44, 3-4; 57, 1-2; Ed. Funk, I, 152, 156,
172. Santo Inácio M.. Philad. 2; Smyrn. 8; Magn. 3; Trall. 7;
Ed. Funk, I, p- 266; 282; 232; 246 ss et.; são Justino, AP. 1,65. PG 6, 428; são
Cipriano Epist., passim.
(14) Cf.
Leão XIII, Epist. Enc. Satis Cognitum. 29 jun. 1896: ASS 28 [1895-96) p. 732.
(15) Cf. Conc. Trid., Sess. 23, Decr. de sacr. Ordinis, cap. 4: Denz. 960
(1768); Conc. Vat. I, Sess. 4, Const. Dogm. De
Ecclesia Christi cap. 3: Denz. 1828 (3061). Pio XII, Carta Enc. Mystici
Corporis, 29 jun. 1943: AAS 35 (1943) pp. 209 e 212. Cod. lur. Can., C. 329 §
1.
(16) Cf. Leio XIII, Epist. Et Sane, 17 dez.
1888: AAS 21 (1888) p. 321 ss.
(17) São Leão M., Serm. 5, 3: PL 54, 154.
(18) Conc. Trid., Sess. 23 cap. 3 cita as palavras de 2Tm 1,6-7 para demonstrar
que a Ordem é verdadeiro sacramento: Denz. 959 (1766).
(19) Na Trad. Apost. 3. ed. Botte, Sources Chr., pp. 27-30, atribui-se ao bispo
primatus sacerdotii. Cf Sacramentarium Leonianum, ed. C. Mohlberg;
Sacramentarium Veronense, Roma, 1955, p. 119: ad summi sacerdotii
ministerium . . . Comple in Sacerdotibus tuis mysterii summam . . . Idem,
Liber Sacramentorum Romanae Ecclesiae, Roma, 1960, pp. 121-122: Tribuas
eis, Domine, cathedram episcopalem ad regendam Ecclesiam tuam et plebem
universam Cf. PL 78, 224.
(20) Trad.
Apost., 2 Ed. Botte, p. 27.
(21) Conc. Trid., Sess. 23, cap. 4, ensina que
o sacramento da Ordem imprime caráter indelével: Denz. 980 (1769. Cf João
XXIII. Aloc. lubilate Deo, 8 de maio 1960: AAS 52 (1960) p. 488. Paulo VI, Hom.
na Bas. Vaticana,
20 out. 1983: AAS 55 (1963) p. 1014.
(22) São Cipriano, Epist. 63, 14: PL 4, 386;
Hartel, III B, p. 713: Sacerdos vice Çhristi vere fungitur. São João
Crisóstomo, ln 2Tm Hom. 2, 4: PG 62, 612: O sacerdote symbolon de
Cristo. Santo Ambrósio, ln PS. 38, 25-26: PL 14, 1051-52: CSEL 64, 203-204.
Ambrosiaster, In 1Tm 5,19: PL 17, 479 C e In Eph 4, 11-12: col. 387 C. Teodoro
de Mops., Hom. Catech. XV, 21 e 24; ed. Tonneau, pp. 497 e 503. Hesíquio de
Jerusalém, In Lev. L. 2, 9, 23: PG 93, 894 B.
(23) Cf. Eusébio, Hist. Eccl., V, 24. 10: GCS II, 1, p 495; ed. Bardy. Sources
Chret.. II, p. 69. Dionísio, em Eusébio, VII,
5, 2: GCS II, 2, p. 638 ss. Bardy, II, p. 168 ss.
(24) Cf. sobre os antigos concílios, Eusébio,
Hist. EccI. V, 23-24; GCS II, 1. p. 488 ss. Bardy, II, p. 66 ss. e passim. Conc.
Niceno can. 5: Conc. Oec. Decr. p. 7.
(25) Tertuliano, De leiunio, 13: PL 2, 972 B; CSEL 20, p. 292, lin. 13-16.
(26) São Cipriano Epist. 56, 3: Hartel, III 8, p. 649; Bayard, p. 154.
(27) Cf. Relação oficial de Zinelli, no Conc.
Vat. I: Mansi 52, 1109 C.
(28) Cf.
Conc. Vat. I, Esquema da Const. Dogm. II. de
Ecclesia Christi, c. 4: Mansi 53, 310. Cf. Relação de Kleutgen sobre o esquema
já reformado: Mansi 53, 321 8-322 8 e a declaração de Zinelli: Mansi 52, 1110
A. Ver também são Leão M., Serm. 4, 3: PL 54,151 A.
(29) Cf.
Cod. lur. Can., can. 227.
(30) Cf. Conc. Vat. I, Const. Dogm. Pastor
Aeternus: Denz. 1821 (3050 s).
(31) Cf. são Cipriano, Epist. 66, 8: Hartel, III 2, p. 733: ''Episcopus in
Ecclesia et Ecclesia in Episcopo''.
(32) Cf. são Cipriano, Epist. 55, 24: Hartel, p. 642, lin. 13: ''Una Ecclesia
per totum mundum in multa membra divisa''. Epist. 36, 4: Hartel, p. 575, lin.
20-21.
(33) Cf. Pio XII, Carta Enc. Fidei Donum, 21 abril 1957: AAS 49 (1957) p. 237.
(34) Cf. santo Hilário de Poitiers, In Ps. 14, 3: PL 9, 206; CSEL 22, p. 86:
Caio Gregório M., Moral, IV, 7, 12: PL 75, 643 C. Ps. Basílio,
In Is., 15, 296: PG 30, 637 C.
(35) São Celestino, Epist. 18, 1-2, ao Conc.
de Éfeso.: PL 50, 505 AB; Schwartz, Acta Conc. Oec. I,
1. 1, p. 22. Cf. Bento XV, Epist. Apos. Maximum
IIIud: AAS 11 (1919) p. 440. Pio XI, Carta Enc. Rerum Ecclesiae, 28 fev. 1926:
AAS 16 (1926) p. 69. Pio XII, Carta Enc. Fidei Donum, 1. cit.
(36) Leão XIII, Carta Enc. Grande munus, 30 set. 1880: ASS 13 (1880) p. 154. Cf.
Cod. lur. Can., c. 1327; c. 1350 § 2.
(37) Sobre os direitos das Sés patriarcais,
cf. Conc. Nic., can. 6 sobre Alexandria e Antioquia, e can. 7 sobre Jerusalém:
Conc. Oec. Decr., p. 8. - Conc. Lat. IV, ano 1215, Constit. V: De Dignitate
Patriarcharum: ibid. p. 121 - Conc. Ferr. Flor., ibid. p. 504.
(38) Cf. Cod. lur. pro Eccl. Orient., can. 216-314: dos Patriarcas; can.
324-339: dos Arcebispos Maiores: can. 362-391: dos outros dignitários; em
especial can. 238 § 3; 216; 251; 255: dos bispos que devem ser nomeados pelo
Patriarca.
(39) Cf. Conc. Trid., Decr. de reform., Sess. V, c. 2. n. 9. e Sess. XXIV,
can. 4; Conc. Oec. Decr., pp. 645 e 739.
(40) Cf.
Conc. Vat. 1, Const. dogm. Dei Filius, 3: Denz.
1712 (3011). Cf. nota junta ao esquema 1 de Eccl., (tirada de são Rob.
Bellarmino): Mansi 51, 579 C; e também o comentário de Kleutgen: Mansi 53, 313
AB. Pio IX, Epist. Tuas libenter: Denz. 1683. (2879).
(41) Cf. Cod. lur. Can., c. 1322-1323.
(42) Cf. Conc. Vat. I, Const. dogm. Pastor
Aeternus: Denz. 1839 (3074).
(43) Cf. a explicação de Gasser no Conc. Vat. I: Mansi, 52, 1213 AC.
(44) Gasser, ib.: Mansi, 1214 A.
(45) Gasser, ib.: Mansi 1215 CD, 1216-1217 A.
(46) Gasser, ib.: Mansi 1213.
(47) Conc. Vat., I, Const. dogm. Pastor Aeternus, 4: Denz. 1836 (3070).
(48) Oração da sagração episcopal no rito bizantino: Euchologion to mega,
Roma, 1873, p. 139.
(49) Cf. santo macio M., Smyrn. 8.1: ed. Funk, 1, p. 282.
(50) Cf. At. 8,1; 14,22-23; 20,17 e passim.
(51) Oração moçarabe: PL 96, 759 8.
(52) Cf. santo macio M., Smyrn. 8, 1: ed. Funk, 1, p. 282
(53) Santo Tomás, Summa Theol. III, q. 73, a. 3.
(54) Cf. Santo Agostinho, C. Faustum, 12, 20:
PL ~ 265; Serm. 57, 7: PL 38, 389. etc.
(55) São Leão M., Serm. 63, 7: PL 54, 357 D.
(56) Traditio Apostolica de Hipólito, 2-3: ed. Botte pp. 26-30.
(57) Cf. o texto do exame no início da sagração episcopal e a oração no fim
da missa da mesma sagração, depois do Te Deum.
(58) Bento XIV, Br. Romana Ecclesia, 5 out. 1752, § 1: Bullarium Benedicti XIV, t. IV, Roma.
1758. 21: Episcopus Christi typum gerit,
Eiusque munere fungitur. Pio XII, Carta Enc. Mystici Corporis 1, cit., p.
21: Assignatos sibi greges singuli singulos Christi nomine pascunt et
regunt.
(59) Leão XIII, Epist. Enc. Satis cognitum, 29 jun. 1896: AAS 28 (1895-96) p.
732. Idem, Epist. Officio Sanctissimo, 22 dez. 1887: ASS 20 (1887) p. 264. Pio
IX, Carta Apost. aos bispos da Alemanha, 12 mar. 1875, e Aloc. consist. 15 mar.
1875: Denz. 3112-3117, só na nova ed.
(60) Conc. Vat. E, Const. dagm. Pastor Aeternus, 3: Denz. 1828 (3061). Cf. Relação
de Zinelli: Mansi 52, 1114 D.
(61) Cf. Santo Inácio M., Ad Ephes. 5, 1: ed. Funk.. I, p. 218.
(62) Cf. santo Inácio M., Ad Ephes. 6, 1: ad.
Funk I, p. 218. e também Martyrium Polycarpi, 12, 2: ib., 328.
(63) Cf. Conc. Trid., Sess. 23, De Sacr. Ordinis, cap. 2: Denz. 958 (1765), e
can. 6: Denz. 966 (1776).
(64) Cf. Inocêncio 1, Epist. ad Decentium: PL 20, 554 A: Mansi 3, 1029: Denz.
98 (215): Presbyteri, licet secundi sint sacerdotes, pontificatus tamen
apicem non habent. Sâo Cipriano, Epist. 61,
3: ed. Hartel, p. 696.
(65) Cf. Conc. Trid., 1. cit., Denz. 956a-968
(1763-1778) e em especial can. 7: Denz. 967 (177). Pio XII. Const. Apast.
Sacramentum Ordinis: Denz. 2301 (3857-61).
(66)Cf. Inocêncio I, 1. cit. são Gregório Naz., Apal. II,
22: PG 35, 432 6. Pa. - Dionísio, Eccl. Hier., 1, 2: PG 3, 372 D.
(67) Conc. Trid.,
Seas. 22: Denz. 940 (1743). Pio XII, Carta Enc.
Mediator Dei, 20 nav. 1947: AAS 39 (1947) p. 553, Denz. 2300 (3850).
(68) Cf.
Conc. Trid., Sess. 22: Denz. 938 (1739-40). Conc. Vat. II, Const. De
Sacra Liturgia, n. 7 e n. 47.
(69) Cf. Pio XII, Carta Enc. Mediator Dei, 1. cit., n. 67.
(70) Cf. são Cipriano, Epist. 11, 3: PL 4, 242 B; Hartel, li, 2, p. 497.
(71) Ordo consecrationis sacerdotalis, na imposição das vestes;
(72) Orda consecrationis sacerdotalis, no prefácio.
(73) Cf. santo Inácio M., Philad. 4: ed. Funk, 1, p. 266. São Cornélio I, em são Cipriano, Epist. 48, 2: Hartel, III, 2, p. 610.
(74) Constitutiones Ecclesiae aegyptiacae, III, 2: ed. Funk, Didas-calia, II, p.
103. Statuta Ecci. Ant. 3741: Mansi 3, 954.
(75) São Policarpo, Ad Phil. 5, 2: ed. Funk, 1, p. 300: diz:se de Cristo:
''omnium diaconus factus''. Cf. São Clemente Rom., Ad Cor. 15. 15, 1: ib., p.
32. Santo Inácio M., Trall. 2, 3: ib., p. 242. Constitutiones Apostolorum, 8,
28, 4: ed. Funk, Didascalia, 1, p. 530.
IV. OS LEIGOS
Introdução
3O. O
Sagrado Concílio, depois de ter enunciado as funções da hierarquia, de bom
grado dirige o seu pensamento para o estado daqueles fiéis que têm o nome de
leigos. Quanto se disse do povo de Deus, vale igualmente para leigos, religiosos
e clérigos. Todavia certas coisas dizem respeito de modo particular aos leigos,
homens e mulheres, em razão da sua condição é da sua missão e importa
considerar-lhes os fundamentos com mais cuidado, em virtude das especiais
circunstâncias do tempo atual.
Os sagrados pastores reconhecem perfeitamente
quanto os leigos contribuem para o bem de toda a Igreja. Sabem que os pastores não
foram instituídos por Cristo para assumirem sozinhos toda a missão da Igreja
quanto à salvação do mundo mas que o seu excelso múnus é apascentar os fiéis
e reconhecer-lhes os serviços e os carismas, de tal maneira que todos, a seu
modo, cooperem unanimemente na tarefa comum. E, pois, necessário que todos,
professando a verdade na caridade, cresçamos em tudo para aquele que é a cabeça,
Cristo, pelo influxo do qual o corpo inteiro - bem ajustado e coeso por meio de
toda a espécie da junturas que o alimentam, através de uma ação
proporcionada a cada uma das partes - realiza o seu crescimento, em ordem à própria
edificação na caridade (Ef 4,15-16).
Que se
entende por leigos
31. Por
''leigos'' entende-se aqui o conjunto dos fiéis, com exceção daqueles que
receberam uma ordem sacra ou abraçaram o estado religioso aprovado pela Igreja,
isto é, os fiéis que - por haverem sido incorporados em Cristo pelo batismo e
constituídos em povo de Deus, e pôr participarem a seu modo do múnus
sacerdotal, profético e real de Cristo realizam na Igreja e no mundo, na parte
que lhes compete, a missão de todo o povo cristão.
A índole
secular é própria e peculiar dos leigos. Na verdade, os que receberam ordens
sacras - embora possam algumas vezes ocupar-se das coisas seculares, exercendo
até uma profissão secular - em virtude da sua vocação estão destinados
principal e diretamente ao sagrado ministério; os religiosos, pelo seu estado,
dão alto e exímio testemunho de que o mundo não pode transfigurar-se e
oferecer-se a Deus sem o espírito das bem-aventuranças. Aos leigos compete,
por vocação própria, buscar o reino de Deus, ocupando-se das coisas temporais
e ordenando-as segundo Deus. Vivem no mundo, isto é, no meio de todas e cada
uma das atividades e profissões, e nas circunstâncias ordinárias da vida
familiar e social, as quais como que tecem a sua existência.
Aí os chama Deus
a contribuírem, do interior, à maneira de fermento, para a santificação do
mundo, através do cumprimento do próprio dever, guiados pelo espírito evangélico;
e a manifestarem Cristo aos outros antes e mais nada com o testemunho da vida e
com o fulgor da sua fé, esperança e caridade. A eles compete muito
especialmente esclarecer e ordenar todas as coisas temporais, com que estão
intimamente comprometidos, de tal maneira que sempre se realizem segundo o espírito
de Cristo, se desenvolvam e louvem o Criador e o Redentor.
Unidade
na diversidade
32. A santa
Igreja é, por instituição divina, organizada e dirigida em variedade admirável.
Porque, como, em um só corpo, nós temos muitos membros e nem todos os membros
exercem a mesma função, assim nós, que muitos somos, constituímos em Cristo
um corpo único, sendo individualmente membros uns dós outros (Rm
12,4-5).
E,
portanto, uno o povo eleito de Deus: Um só Senhor, uma só fé, um só
batismo (Ef. 4,5); comum é a dignidade dos membros pela sua regeneração
em Cristo, comum a graça de filhos, comum a vocação à perfeição; uma só
salvação, uma só esperança e caridade indivisível. Nenhuma desigualdade
existe em Cristo e na Igreja, por motivo de raça ou de nação, de condição
social ou de sexo, pois que não ha judeu nem grego, nem escravo nem
livre, nem homem nem mulher; todos vós sois um em Cristo
Jesus (Gl 3,28 grego; cf. Cl 3,11).
Mas se, na
Igreja, nem todos caminham pela mesma via, todos são chamados à santidade e têm
igualmente a mesma fé pela justiça de Deus (cf. 2Pd 1,1). E se é certo que
alguns, por vontade de Cristo, são constituídos para os demais, corno
doutores, administradores dos mistérios e pastores, reina afinal entre todos
verdadeira igualdade no que respeita à dignidade e à ação comum do conjunto
dos fiéis para a edificação do corpo de Cristo. A distinção, que o Senhor
estabeleceu, entre os ministros sagrados e o restante do povo de Deus, implica
união, pois os pastores e os fiéis estão vinculados entre si por uma relação
mútua; os pastores da Igreja, seguindo o exemplo do Senhor, estejam ao serviço
uns dos outros e dos fiéis, e estes por sua vez prestem de boa vontade colaboração
aos pastores e doutores. Assim, na variedade, todos dão testemunho da admirável
unidade do corpo de Cristo, pois a própria diversidade de graças, de ministérios
e de funções agrupa na unidade os filhos de Deus, já que um só e mesmo
Espírito é o que opera todas estas coisas (1Cor 12,11).
Se os
leigos, por designação divina, têm a Cristo como irmão, ele que, sendo
Senhor de todos, veio não para ser servido mas para servir (cf. Mt 20,28), têm
igualmente como irmãos aqueles que, constituídos no sagrado ministério e
ensinando, santificando e governando por autoridade de Cristo, apascentam a família
de Deus de tal modo que todos cheguem a cumprir o preceito novo da caridade. A
este propósito, diz com tanto acerto santo Agostinho: Se me aterra o ser
para vós, consola-me o estar convosco. Para vós sou bispo, convosco sou cristão.
Aquele é o nome do ofício, este o da graça; aquele o do perigo, este o da
salvação. (1)
Apostolado dos leigos
33. Os
leigos, congregados no povo de Deus e constituídos no único corpo de Cristo
sob uma só cabeça, quaisquer que sejam, são chamados a contribuir para o
incremento e para a santificação perene da Igreja, como membros vivos,
aplicando todas as forças recebidas de Deus e de Cristo Redentor.
O
apostolado dos leigos é participação na própria missão salvífica da
Igreja; a este apostolado são destinados todos pelo Senhor ao receberem o
batismo e a confirmação. Pelos sacramentos, especialmente pela sagrada
eucaristia, comunica-se e alimenta-se aquela caridade para com Deus e para com
os homens, que é a alma de todo apostolado. Mas os leigos são chamados de modo
especial a tornar presente e operante a Igreja naqueles lugares e circunstâncias,
onde ela só por meio deles pode vir a ser sal da terra. (2) Assim todo o leigo,
por virtude dos dons que recebeu, é testemunha e ao mesmo tempo instrumento
vivo da própria missão da Igreja segundo a medida do dom de Cristo (Ef
4,7).
Além deste
apostolado, que pertence a todos os fiéis sem exceção, os leigos podem ser
chamados por diversos modos a uma colaboração mais imediata com o apostolado
da hierarquia, (3) à semelhança daqueles homens e mulheres que ajudavam o apóstolo
Paulo na evangelização, trabalhando muito no Senhor (cf. Fl 4,3; Rm 16,3 ss).
Têm além disso capacidade para serem destinados pela hierarquia ao exercício
de determinados ofícios eclesiais, com um fim espiritual.
Pesa ainda
sobre todos os leigos o encargo glorioso de trabalhar para que o plano divino da
salvação atinja cada vez mais todos os homens, em quaisquer tempos e lugares.
Abrange-se-lhes, pois, todos os caminhos para que, segundo as suas forças e as
necessidades dos tempos, participem também eles, ardorosamente, na tarefa
salvadora da Igreja.
Consagração
do mundo
34. Cristo
Jesus, sumo e eterno Sacerdote, querendo continuar também por meio dos leigos o
seu testemunho e o seu ministério, vivifica-os com o seu Espírito e impele-os
constantemente a toda obra boa e perfeita.
Àqueles
que une intimamente à sua vida e missão, dá-lhes também parte no seu múnus
sacerdotal em ordem a exercerem um culto espiritual, para glória de Deus e
salvação dos homens. Por este motivo os leigos, enquanto consagrados a Cristo
e ungidos pelo Espírito Santo, têm uma vocação admirável e são dotados de
capacidade para que o Espírito produza neles frutos sempre mais abundantes.
Todas as suas obras, orações e iniciativas apostólicas, a vida familiar e
conjugal, o trabalho cotidiano, o descanso do espírito e do corpo, se forem
realizados no Espírito, e até mesmo as contrariedades da vida, se levadas com
paciência, convertem-se em sacrifícios espirituais, agradáveis a Deus por
Jesus Cristo (cf. 1Pd 2,5), que, na celebração da eucaristia, se oferecem
piedosamente ao Pai, juntamente com a oblação do corpo do Senhor. Assim também
os leigos, procedendo santamente em toda a parte como adoradores, consagram a
Deus o próprio mundo.
Testemunho
da vida
35. Cristo,
o grande Profeta que, pelo testemunho da sua vida e pela força da sua palavra,
proclamou o reino do Pai, cumpre o seu múnus profético até à plena manifestação
da glória, não apenas por meio da hierarquia, que ensina em seu nome e com o
seu poder, mas também por meio dos leigos, a quem nomeia suas testemunhas e a
quem dá o sentido da fé e a graça da palavra (cf. At 2,17-18; Ap 19,10), para
que façam brilhar a força do Evangelho na vida cotidiana, familiar e social.
Eles apresentam-se como filhos da promessa, quando, fortes na fé e na esperança,
aproveitam o tempo presente (cf. Ef 5,16; Cl 4,5) e com paciência esperam a glória
futura (cf. Rm 8,25). Não escondam esta esperança no interior da alma, mas
exprimam-na mesmo através das estruturas da vida social, por uma renovação
contínua e pela luta contra os dominadores deste mundo tenebroso e contra os
espíritos do mal (Ef 6,12).
Assim como
os sacramentos da nova lei, nos quais se alimenta a vida e apostolado dos fiéis,
prefiguram um novo céu e uma nova terra (Ap 21,1), assim também os leigos se
tornam válidos arautos daquela fé dos bens esperados (cf. Hb 11,1), se unirem
sem desfalecimentos, a uma vida segundo a fé, a profissão da mesma fé. Esta
evangelização, anúncio de Cristo, feito pelo testemunho da vida e pela
palavra, adquire um aspecto característico e uma eficácia particular pelo fato
de se realizar nas condições ordinárias da vida no mundo.
Neste
particular, tem grande importância aquele estado de vida que está santificado
por um sacramento especial, isto é, a vida matrimonial e familiar. Nela se
encontra um exercício e uma alta escola de apostolado dos leigos, quando a
religião cristã penetra toda a organização da vida e cada dia a transforma
para melhor. Nela têm os cônjuges a própria vocação para serem, um para o
outro e para os filhos, testemunhas da fé e do amor de Cristo. A família cristã
proclama em alta voz tanto as virtudes presentes do reino de Deus, como a
esperança da vida eterna. Assim o seu exemplo e o seu testemunho acusam o mundo
de pecado e iluminam aqueles que procuram a verdade.
Por
conseguinte, os leigos, ainda quando se entregam a tarefas temporais, podem e
devem realizar uma ação preciosa para a evangelização do mundo. Se alguns
suprem determinados ofícios sagrados na medida em que lhes é permitido, - por
falta de ministros próprios, ou por impedimento destes em caso de perseguição
- e se muitos deles consomem todas as suas forças no trabalho apostólico, é
preciso que todos sem exceção cooperem para a dilatação e para o incremento
do reino de Cristo no mundo. Por isso esforcem-se os leigos com diligência por
conhecer mais profundamente a verdade revelada e peçam instantemente a Deus o
dom da sabedoria.
Nas
estruturas humanas
36. Cristo,
tendo-se feito obediente até à morte, foi por isso mesmo exaltado pelo Pai
(cf. Fl 2,8-9) e entrou na glória do seu reino; a ele estão submetidas todas
as coisas, até que se sujeite a si mesmo e consigo sujeite toda a criação ao
Pai, a fim de que Deus seja tudo em todos (cf. 1Cor 15,27-25). Poder este que
Jesus Cristo comunicou aos discípulos para que, também eles ficassem
investidos num domínio livre, próprio de reis, e, pela abnegação de si
mesmos e por uma vida santa, vencessem em si próprios o reino do pecado (cf. Rm
5,12); e mesmo para que, servindo a Cristo também nos outros, conduzissem pela
humildade e paciência os seus irmãos àquele Rei a quem servir é reinar. Na
verdade o Senhor deseja dilatar, também pela atividade dos fiéis leigos, o seu
reino, reino de verdade e de vida, reino de santidade e de graça, reino de
justiça, de amor e de paz; (4) neste reino também o mundo criado será liberto
das cadeias da corrupção para entrar na liberdade da glória dos filhos de
Deus (cf. Rm 8,21). Grande é pois a promessa, e grande o mandato que se dá aos
discípulos: ''Todas as coisas são vossas, mas vós sois de Cristo, e Cristo é
de Deus (1Cor 3,22-23).
Devem pois
os fiéis reconhecer a natureza íntima de todas as criaturas, o seu valor e
ordenação para a glória de Deus, e devem ajudar-se mutuamente a conseguir uma
vida mais santa, mesmo através das atividades propriamente seculares, de modo
que o mundo se impregne do espírito de Cristo e atinja o seu fim na justiça,
na caridade e na paz. No desempenho deste dever de alcance universal, compete
aos leigos a principal responsabilidade. Através da sua competência no domínio
profano e por sua atividade, interiormente elevada pela graça de Cristo,
procurem contribuir eficazmente para que os bens criados se explorem em benefício
de todos os homens; sejam melhor distribuídos segundo a ordenação do Criador
e a iluminação do seu Verbo, mediante o trabalho humano, a técnica e a
cultura civil; e contribuam, na medida que lhes é própria, para o progresso
universal na liberdade humana e cristã. Assim Cristo iluminará cada vez mais,
através dos membros da igreja, toda a sociedade humana com a sua luz salutar.
Além
disso, congreguem os leigos os seus esforços para sanar as estruturas e as
condições do mundo, se acaso elas incitam ao pecado, de modo que tudo se
conforme às normas da justiça e, longe de impedir, favoreça a prática das
virtudes. Agindo desta maneira, impregnarão de valor moral a cultura e as
atividades humanas. Também se preparará melhor, assim, o campo do mundo para a
semente da palavra divina e, ao mesmo tempo, se abrirão de par em par, à
igreja, as portas por onde há de entrar no mundo o anúncio da paz.
Para serem
úteis à economia da salvação, aprendam diligentemente os fiéis a distinguir
entre os direitos e as obrigações que lhes correspondem enquanto membros da
Igreja, e os que lhes competem como membros da sociedade civil. Procurem com
diligência harmonizá-los uns com os outros, lembrando-se que em toda a ocupação
temporal devem orientar-se sempre pela consciência cristã, pois nenhuma
atividade humana, nem sequer na ordem temporal, pode subtrair-se ao império de
Deus. Sobretudo no nosso tempo, é sumamente necessário que esta distinção e
esta harmonia transpareçam com maior clareza na maneira de agir do fiéis, a
fim de que a missão da Igreja possa corresponder mais plenamente às condições
particulares do mundo moderno; Porque, assim como deve reconhecer-se que a
cidade terrena, por sua natureza entregue às preocupações temporais, se rege
por princípios próprios, assim também se rejeita com toda a razão a doutrina
falaz que pretende construir a sociedade, prescindindo absolutamente da religião,
e ataca e destrói a liberdade religiosa dos cidadãos. (5)
Relações
com a hierarquia
37. Os
leigos, como todos os cristãos, têm o direito de receber abundantemente dos
sagrados pastores os bens espirituais, sobretudo os auxílios da palavra de Deus
e dos sacramentos; (6) manifestem-lhes, pois, as suas necessidades e os seus
desejos, com a liberdade e confiança próprias de filhos de Deus e irmãos em
Cristo. Segundo a ciência, competência e prestígio que possuam, têm a
faculdade, às vezes até o dever, de manifestar o seu parecer no que se refere
ao bem da Igreja. (7) Faça-se isto. se for o caso, através de órgãos
estabelecidos pela igreja para isso. sempre com verdade, fortaleza e prudência.
mostrando respeito e caridade para com aqueles que. por motivo do seu ofício
sagrado, fazem as vezes de Cristo.
Os leigos,
como aliás todos os fiéis. segundo o exemplo de Cristo - que pela sua obediência
até a morte, abriu a todos os homens o caminho feliz da liberdade dos filhos de
Deus - procurem aceitar com prontidão e obediência cristã tudo o que os
sagrados pastores, como representantes de Cristo, no exercício da sua função
de mestres e governantes estabelecerem na igreja. Em suas orações não deixem
de recomendar a Deus os superiores, que vigiam sobre as nossas almas como quem
delas terá de prestar contas. para que eles cumpram o seu dever com alegria e
sem angústia (cf. Hb 13,17).
Por sua
parte, os sagrados pastores reconheçam e tornem efetivas a dignidade e a
responsabilidade dos leigos na igreja; aproveitem de bom grado o seu conselho
prudente. confiem-lhes serviços para o bem da igreja, e deixem-lhes liberdade e
campo de ação; animem-nos mesmo a empreender outras obras por iniciativa própria.
Considerem atentamente, diante de Deus, com paternal afeto, as iniciativas, as
propostas e os desejos manifestados pelos leigos. (8) Enfim, os pastores hão de
reconhecer respeitosamente a justa liberdade que a todos compete na sociedade
temporal.
Desta
convivência familiar entre os leigos e os pastores muitas vantagens se devem
esperar para a igreja: na verdade, assim se robustece nos leigos o sentido da própria
responsabilidade. se favorece o seu entusiasmo e mais facilmente se conjugam as
suas forças com a operosidade dos pastores. Estes, por sua vez, ajudá-los pela
experiência dos leigos. ficam com possibilidade de julgar com maior clareza e
exatidão tanto em coisas espirituais como em temporais. E assim a Igreja,
recebendo forças de todos os seus membros, realiza com maior eficácia a sua
missão para a vida do mundo.
Como a
alma no corpo
38. Cada um
dos leigos deve ser, perante o mundo, testemunha da ressurreição e da vida do
Senhor Jesus e sinal do Deus vivo. Todos juntos, cada um na medida das suas
possibilidades, devem alimentar o mundo com frutos espirituais (cf. Gl 5,22). e
devem infundir-lhe o espírito que é próprio. dos pobres. dos mansos e dos pacíficos,
daqueles que o Senhor no Evangelho proclamou bem-aventurados (cf. Mt 5,3-9).
Numa palavra o que a alma é no corpo. sejam-no os cristãos no mundo''. (9)
(2) Cf. Pio XI, Carta Enc. Quadragesimo Anno, 15 maio 1931: AAS 23 (1931) p. 221
ss. Pio XII, aloc. De quelle consolation, 14 out. 1951: AAS 43 (1951) p. 790 58.
(3) Pio XII, Aloc. Six ans se sont écoulés, 5 out. 1957: AAS 49 (1957) p. 927.
Sobre ''o mandato'' e missão canônica, Cf. o
Decreto De Apostolatu Laicorum, cap. IV, n. 16, com as notas 12 e 13.
(4) Do prefácio da festa de Cristo Rei.
(5) Cf.
Leao XIII, Epist. Enc. lmmortale Dei, 1 nov.
1885: ASS 18 (1885) p. 168 ss. Idem, Carta Enc. Sapientiae
christianae, 10 jan. 1890: AAS 22 (1889-90) p. 397 ss. Pio
XII, Aloc. Alla
vostra filiale, 23 março 1958: AAS 50: (1958) p. 220: la legitima sana laicità
dello Stato''.
(6) Cod.
lur. Can., can. 682.
(7) Cf. Pio XII, Aloc. De quelle consolation,
1. cit., p. 789: Dans les batailles décisives, c'est parfois du front que
partent les plus heureuses initiatives. . .''. Idem, Aloc. L'importance de la
presse catholique, 17 fev. 1950: AAS 42 (1950), p. 256.
(8) Cf. 1Ts 5,19 e 1Jo 4,1.
(9) Epist.
ad Diognetum, 6: ed. Funk, I, 400. Cf. são João
Crisóstomo, In Mat. Hom. 46 (47), 2: PO 58, 478, sobre o fermento na massa.
V. VOCAÇÃO UNIVERSAL À
SANTIDADE NA IGREJA
Chamamento
à santidade
39. A
santidade indefectível da Igreja, cujo mistério este sagrado Concílio expõe,
é objeto da nossa fé. Na verdade, Cristo, Filho de Deus, que com o Pai e o Espírito
Santo é proclamado o único Santo, (1) amou a Igreja como sua
esposa, entregando-se a si mesmo por ela a fim de a santificar (cf. Ef 5,25-26);
uniu-a a si como seu corpo e enriqueceu-a com o dom do Espírito Santo, para a
glória de Deus. Por isso, todos na Igreja, quer pertençam a hierarquia quer façam
parte da grei, são chamados à santidade segundo a palavra do Apóstolo:
Esta é a vontade de Deus, a vossa santificação (1Ts 4,3; cf. Ef
1,4). Esta santidade da Igreja manifesta-se incessantemente e deve manifestar-se
nos frutos de graça que o Espírito Santo produz nos fiéis; exprime-se de
muitas maneiras em todos aqueles que, de harmonia com seu estado de vida, tendem
a perfeição da caridade, edificando os outros, mas de modo particular,
evidencia-se na prática dos conselhos que ordinariamente se chamam evangélicos.
Esta prática dos conselhos que, por impulso do Espírito Santo, muitos cristãos
abraçam, quer privadamente quer numa condição ou estado reconhecido pela
Igreja, produz e convém que produza no mundo esplêndido testemunho e exemplo
da mesma santidade.
Cristo,
mestre e modelo de perfeição
40. O
Senhor Jesus, mestre e modelo divino de toda a perfeição, pregou a todos e a
cada um dos seus discípulos, de qualquer condição que fossem, a santidade de
vida, de que ele próprio é autor e consumador: Sede perfeitos, como é
perfeito o vosso Pai celeste (Mt 5,48). (2) Enviou a todos o Espírito
Santo para os mover interiormente a amarem a Deus com todo o coração, com toda
alma, com toda a mente e com todas as forças (cf. Mc 12,30) e a amarem-se uns
aos outros como Cristo os amou (cf. Jo 13,34; 15,12). Os seguidores de Cristo,
que Deus chamou e justificou no Senhor Jesus, não pelos méritos deles mas por
seu desígnio e sua graça, foram feitos no batismo da fé verdadeiros filhos de
Deus e participantes da natureza divina, e por isso mesmo verdadeiramente
santos. Devem portanto, com a ajuda de Deus, conservar e aperfeiçoar na sua
vida a santidade que receberam.
O Apóstolo exorta-os a viverem como convém
a santos (Ef 5,3), a revestirem-se - como eleitos de Deus, santos e
prediletos - de sentimentos de misericórdia, de benignidade, de
humildade, de mansidão e de paciência (Cl 3,12) e a fazerem servir os frutos
do Espírito para a santificação (cf. Gl 5,22; Rm 6,22). Como, porém,
cometemos todos muitas faltas (cf. Tg 3,2), temos contínua necessidade da
misericórdia de Deus e devemos orar todos os dias: perdoai-nos as nossas
ofensas (Mt 6,12). (3)
É, pois,
bem claro que todos os fiéis, seja qual for o seu estado ou classe, são
chamados à plenitude da vida cristã e à perfeição da caridade, (4)
santidade esta que promove, mesmo na sociedade terrena, um teor de vida mais
humano.
Empreguem os fiéis as forças recebidas segundo a medida da dádiva de
Cristo, para alcançar esta perfeição, a fim de que - seguindo os seus
caminhos, tornando-se conformes à sua imagem e obedecendo em tudo a vontade do
Pai - se entreguem plenamente a buscar a glória de Deus e a servir o próximo.
Assim a santidade do povo de Deus, desdobrar-se-á em abundantes frutos, como o
demonstra brilhantemente, através da história da Igreja, a vida de tantos
santos.
A
santidade nos diversos estados de vida
41. Uma
mesma santidade é cultivada por todos aqueles que, nos vários gêneros de vida
e nas diferentes profissões, são guiados pelo Espírito de Deus e, obedecendo
à voz do Pai e adorando-o em espírito e verdade, seguem a Cristo pobre,
humilde e carregado com a cruz, para merecerem participar da sua glória. Cada
um, segundo os dons e as funções que lhe foram confiados, deve enveredar sem
hesitação pelo caminho da fé viva, que excita a esperança e opera pela
caridade.
Em primeiro
lugar, devem os pastores da grei de Cristo - à imagem do sumo e eterno
Sacerdote, pastor e bispo das nossas almas - desempenhar o seu ministério
santamente e com entusiasmo, com humildade e fortaleza: assim encontrarão nele
um magnífico meio de santificação própria. Os que foram escolhidos para a
plenitude do sacerdócio recebem a graça sacramental para poderem exercer o ofício
perfeito da sua caridade pastoral, com a oração, o sacrifício e a pregação,
através de toda a espécie de solicitude e serviço episcopal, (5) para que não
temam dar a vida pelas suas ovelhas e ainda para que, fazendo-se modelo da sua
grei (cf. 1Pd 5,3), levem a Igreja a uma santidade cada vez maior, com o seu
exemplo.
Os presbíteros,
à semelhança da ordem dos bispos de quem são a coroa espiritual, (6) e
participando da graça ministerial dos mesmos através de Cristo, eterno e único
mediador, cresçam no amor de Deus e do próximo, pelo exercício cotidiano do
seu dever, conservem o vínculo da comunhão sacerdotal, abundem em todo o bem
espiritual e sejam para todos um testemunho vivo de Deus, (7) procurando imitar
aqueles sacerdotes que, no decorrer dos séculos, deixaram, num ministério
muitas vezes humilde e escondido, o maior exemplo de santidade.
O seu louvor
ressoa na Igreja de Deus. Rezando e oferecendo o sacrifício, como devem, pelos
seus fiéis e por todo o povo de Deus, tomando consciência daquilo que fazem e
imitando aquilo com que contactam, (8 ) em vez de encontrarem obstáculos nos
cuidados apostólicos, nos perigos e nos contratempos, sirvam-se deles para
subir a maior santidade, alimentando e fomentando a sua atividade com a abundância
de contemplação, para conforto de toda a Igreja de Deus. Todos os presbíteros,
em especial aqueles que, por título particular da sua ordenação, chamamos
sacerdotes diocesanos, recordem quanto aproveita à sua santificação, a união
fiel e a generosa cooperação com o seu bispo.
Os
ministros de ordem inferior participam também, de modo peculiar, da missão e
da graça do sumo Sacerdote, sobretudo, os diáconos que, servindo nos mistérios
de Cristo e da Igreja, (9) devem conservar-se puros de todos os vícios, agradar
a Deus e procurar fazer todo o bem diante dos homens (cf. 1Tm 3,8-10 e 12-13).
Os clérigos que, chamados pelo Senhor e segregados para o seu serviço, se
preparam sob a vigilância dos pastores para os cargos de ministros, são
obrigados a ajustar a sua mente e o seu coração a tão subida escolha, sendo
assíduos na oração, fervorosos no amor, preocupados com tudo o que é
verdadeiro, justo e de boa fama, fazendo tudo para glória e honra de Deus.
Destes se aproximam aqueles leigos, escolhidos por Deus, que são chamados pelo
bispo a dedicarem-se totalmente às lides apostólicas e trabalham na messe do
Senhor com muitos frutos. (10)
É necessário
que os cônjuges e os pais cristãos, seguindo o seu próprio caminho, se ajudem
mutuamente a conservar a graça no decorrer de toda a sua vida, numa grande
fidelidade de amor, e que eduquem na doutrina cristã e nas virtudes evangélicas
a prole que receberem amorosamente de Deus. Oferecem, assim, a todos o exemplo
de um amor incansável e generoso, constroem a fraternidade da caridade, e
apresentam-se como testemunhas e cooperadores da fecundidade da Mãe Igreja,
como símbolo e participação do amor com que Cristo amou a sua esposa e por
ela se entregou. (11) Exemplo semelhante, embora de outro modo, dão aqueles
que, no estado de viuvez ou de celibato, podem contribuir não pouco para a
santidade e para a ação da Igreja. Por seu lado, aqueles que vivem entregues a
trabalhos muitas vezes duros, busquem a perfeição própria nesses trabalhos
humanos, ajudem os seus concidadãos, e fomentem o progresso da sociedade e do
mundo; esforcem-se, além disso, através duma caridade industriosa, por imitar
a Cristo que praticou com as suas mãos o trabalho, e continua a trabalhar com o
Pai na salvação de todos; sejam alegres na esperança, levem uns os fardos dos
outros, sirvam-se enfim da sua fadiga cotidiana para subir a maior santidade,
mesmo apostólica.
Saibam que
estão unidos de modo especial a Cristo, em suas dores pela salvação do mundo,
aqueles que vivem oprimidos na pobreza, na fraqueza, na doença e noutras
tribulações, ou os que sofrem perseguições por amor da justiça - todos
esses, a quem o Senhor no Evangelho proclamou bem-aventurados, e o Deus de
toda a graça, que nos chamou para sua eterna glória em Cristo Jesus, depois de
terem sofrido um pouco, há de aperfeiçoar e tornar firmes e inabaláveis
(1Pd 5,10).
Por
conseguinte, todos os fiéis santificar-se-ão dia a dia, sempre mais, nas
diversas condições da sua vida, nas suas ocupações e circunstâncias, e
precisamente através de todas estas coisas, desde que as recebam com fé, das mãos
do Pai celeste, e cooperem com a vontade divina, manifestando a todos, no próprio
serviço temporal, a caridade com que Deus amou o mundo.
Os
conselhos evangélicos
42.
Deus é caridade e aquele que permanece na caridade permanece em Deus e
Deus nele (1Jo 4,16). Deus difundiu a sua caridade nos nossos corações
por meio do Espírito Santo que nos foi dado (cf. Rm 5,5); por isso, o dom
principal e mais necessário é à caridade, pela qual amamos a Deus sobre todas
as coisas e ao próximo por causa dele. Mas, para a caridade crescer e
frutificar na alma como boa semente, cada fiel deve ouvir de bom grado a palavra
de Deus e cumprir nas obras a sua vontade, deve freqüentemente, com o auxílio
da sua graça, aproximar-se dos sacramentos sobretudo da eucaristia, e tomar
parte nos atos de culto; deve aplicar-se constantemente à oração, à abnegação
de si mesmo e ao serviço dedicado dos seus irmãos, e deve ainda dar-se e
entregar-se ao exercício constante de todas as virtudes. Porque a caridade,
sendo como é o vínculo da perfeição e a plenitude da lei (cf. Cl 3,14; Rm
13,10), comanda todos os meios de santificação, dá-lhes forma e os conduz à
perfeição. (12) Daí que seja a caridade, para com Deus e para com o próximo,
o sinal do verdadeiro discípulo de Cristo.
Como Jesus,
Filho de Deus, manifestou a sua caridade, entregando a vida por nós, ninguém
tem amor maior que aquele que dá a sua vida por ele e pelos seus irmãos (cf.
1Jo 3,16; Jo 15,13). A dar este testemunho máximo de amor diante de todos,
principalmente diante dos perseguidores, foram chamados alguns cristãos já
desde os primeiros tempos, e outros continuarão a sê-lo sempre. É por isso
que o martírio, pelo qual o discípulo se assemelha ao Mestre que aceitou
livremente a morte pela salvação do mundo, e a ele se conforma na efusão do
sangue, é considerado pela Igreja como doação insigne e prova suprema da
caridade. Se poucos o chegam a sofrer, todos devem estar prontos a confessar
Cristo diante dos homens e a segui-lo pelo caminho da cruz, no meio das perseguições
que nunca faltam à Igreja.
Fomentam
também a santidade da Igreja, de modo especial, os muitos conselhos cuja observância
o Senhor propõe aos seus discípulos no Evangelho. (13) Entre eles sobressai o
dom precioso da graça divina, que o Pai concede a alguns (cf. Mt 19,11; 1Cor
7,7), para os levar com maior facilidade a consagrarem-se inteiramente a Deus na
virgindade ou no celibato, sem repartirem o coração (cf. 1Cor 7,32,34). (14)
Esta continência perfeita por causa do reino dos céus, sempre foi tida pela
Igreja em singular estima, como sinal da caridade, e como fonte peculiar de
fecundidade espiritual no mundo.
A Igreja
também recorda a advertência do Apóstolo que, animando os fiéis à caridade,
os exorta a terem os mesmos sentimentos que havia em Cristo Jesus, ele que
se despojou a si próprio, tomando a condição de escravo... feito
obediente até a morte (Fl 2,7-8), e por causa de nós se fez pobre,
ele que era rico (2Cor 8,9). E porque os discípulos devem imitar e
testemunhar sempre a caridade e a humildade de Cristo, a Mãe Igreja rejubila
por encontrar no seu seio muitos homens e mulheres que seguem mais de perto a
aniquilação do Salvador e a manifestam mais claramente, abraçando a pobreza,
com a liberdade dos filhos de Deus, e renunciando à sua vontade própria: por
amor de Deus, submetem-se ao homem em matéria de perfeição, indo mais além
do que está preceituado - querem conformar-se mais plenamente com Cristo
obediente. (15)
Assim,
todos os fiéis são convidados e obrigados a tender para a santidade e perfeição
do estado próprio. Cuidem, por isso, todos, de orientar retamente os seus
afetos, não vá o uso das coisas mundanas e o apego às riquezas, contrário ao
espírito de pobreza evangélica, impedi-los de alcançarem a caridade perfeita;
já advertia o Apóstolo: Os que se servem deste mundo, não se detenham
nele, pois os atrativos do mundo passam (cf. 1Cor 7,31 grego). (16)
Notas
(1)
Missal Romano, Gloria in excelsis. Cf. Lc 1,35; Mc 1,24; Lc 4,34; Jo 6,39 (ho
hagios tou Theou); At 3,14; 4,27 e 30; Hb 7,26; 1Jo 2,20; Ap 3,7.
(2) Cf. Orígenes, Comm. Rom. 7, 7: PG 14, 1122 B. Ps.
Macário,
De Oratione, 11: PG 34, 861 AB. Santo Tomás, Summa Theol. II-II, q. 184, a. 3.
(3) Cf. santo Agostinho, Retract. II, 18: PL 32, 637 ss. Pio
XII, Carta Enc. Mystici Corporis, 29 junho 1943: AAS 35, (1943) p. 225.
(4) Cf. Pio XI, Carta Enc. Rerum omnium, 26 jan. 1923: AAS 15 (1923) p. 50 e pp.
59-60. Carta Enc. Casti connubii, 31 dez.1930: AAS 22 (1930) p. 548. Pio XII,
Const. Apost. Provida Mater, 2 fev. 1947: AAS 39 (1947) p. 117. Aloc. Annus
Sacer, 8 dez.1950: AAS 43 (1951) pp. 27-28. Aloc. Nel darvi, 1 jul. 1956: AAS 48
(1956) p. 574 ss.
(5) Cf. santo Tomás, Summa Theol. II-II, q. 184, a. 5 e 6. De
perf. vitae spir., c. 18. Orígenes, In Is. Mom. 6, 1: PG 13, 239.
(6) Cf. santo Inácio M., Magn. 13, 1: ed. Funk,
I, p. 240.
(7) Cf. são Pio X, Exort. Haerent
animo, 4 ag. 1908: ASS 41 (1908) p. 560 ss. Cod. lur. Can., can. 124. Pio
XI, Carta Enc. Ad
catholici sacerdotii, 20 dez. 1935: AAS 28 (1936) p. 22 ss.
(8) Ordo consecrationis sacerdatolis, na Exortação
inicial.
(9) Cf. santo Inácio M., Trall. 2, 3: ed Funk, I, p. 244.
(10) Cf. Pio XII, Aloc. Sous la maternelle
protection, 9 dez. 1957: AAS 50 (1958) p. 36.
(11) Pio XI, Carta Enc. Casti Connubii, 31 dez 1930: AAS 22 (1930) p. 548 ss.
Cf. são João Crisóstomo, In Ephes. Hom. 20, 2: PG 62, 136 ss.
(12) Cf. santo Agostinho, Enchir. 121, 32: PL
40, 288, Santo Tomás, Summa Theol., II-II, q. 184, a. 1. Pio XII, Exort. Menti
nostrae, 23 set. 1950: AAS 42 (1950) p. 660.
(13) Sobre os conselhos em geral, cf. Orígenes, Comm. Rom. X, 14: PG 14, 1275
B. Santo Agostinho, De Virginitate 15, 15: PL 40, 403. Santo Tomás, Summa
Theol. I-II, q. 100, a. 2 C (no fim); II-II q. 44. a. 4, ad 3.
(14) Sobre a excelência da sagrada virgindade, cf. Tertuliano, Exhort. Cast.
10: PL 2, 925 C. sao Cipriano, Hab. Virg. 3 e 22: PL 4, 443 B e 461 A ss. Santo
Atanásio, De Virg.: PG 28, 252 ss; são João Crisóstomo, De Virg.: PG 48, 533
ss.
(15) Sobre a pobreza espiritual cf. Mt 5,3 e 19,21; Mc 10,21; Lc 18,22; a
respeito da obediência mostra-se o exemplo de Cristo, Jo 4,34 e 6,38; Fl
2,8-10; Hb 10,5-7.
(16) Sobre a prática efetiva dos conselhos que não se impõe a todos, cf. são
João Crisóstomo, In Mat. Hom. 7, 7: PG 57, 81 ss. Santo Ambrósio, de Viduis,
4, 23: PL 16, 241 ss.
VI. OS RELIGIOSOS
Castidade,
pobreza, obediência
43. Os
conselhos evangélicos de castidade consagrada a Deus, de pobreza e obediência,
que se fundamentam nas palavras e nos exemplos do Senhor, e foram recomendados
pelos apóstolos, pelos santos padres e pelos doutores e pastores da Igreja, são
um dom divino que a Igreja recebeu do Senhor e com sua graça conserva
perpetuamente. A autoridade da Igreja, sob a direção do Espírito Santo,
cuidou de interpretar esses conselhos, regular a sua prática e determinar mesmo
formas estáveis de os viver.
Daí resultou que à maneira duma árvore que se
ramifica admirável e frondosa no campo do Senhor, a partir duma semente lançada
por Deus - se foram desenvolvendo várias formas de vida eremítica ou vida em
comum e várias famílias religiosas, que de modo notável contribuem tanto para
o aperfeiçoamento dos seus membros, como para o bem de todo o corpo de Cristo.
(1) Essas famílias garantem de fato aos seus membros vantagens especiais: maior
estabilidade no teor de vida, doutrina espiritual aprovada, comunhão fraterna
na milícia de Cristo e liberdade fortalecida pela obediência. Deste modo,
podem eles viver com segurança e manter com fidelidade a sua profissão
religiosa, progredindo no caminho da caridade com espírito alegre. (2)
Tal estado,
no plano divino e hierárquico da Igreja, não é estado intermédio entre a
condição clerical e a laical: mas duma e doutra chama Deus alguns fiéis a
usufruírem este dom especial na vida da Igreja e a ajudarem-na, cada um a seu
modo, no desempenho da sua missão salvífica. (3)
Sinal
especial
44. Por
meio dos votos, ou de outros vínculos sagrados, por sua natureza equiparados
aos votos, o cristão obriga-se à prática dos três conselhos evangélicos
referidos, entrega-se totalmente a Deus, amado acima de tudo, ficando assim
destinado, por título especial e novo, ao serviço e glória de Deus. É certo
que, pelo batismo, o cristão já morreu para o pecado e ficou consagrado a
Deus; mas, para conseguir fruto mais abundante da graça batismal, procura, pela
profissão dos conselhos evangélicos na Igreja, libertar-se dos impedimentos
que o poderiam afastar do fervor da caridade e da perfeição do culto divino, e
consagra-se mais intimamente ao serviço de Deus. (4) Esta consagração será
tanto mais perfeita, quanto melhor representar, com vínculos mais firmes e estáveis,
a união indissolúvel de Cristo com a Igreja, sua esposa.
Uma vez que
pelos conselhos evangélicos, mediante a caridade a que levam, (5) se consegue
união especial à Igreja e ao seu mistério, importa que também a vida
espiritual dos que os seguem se consagre ao bem da Igreja. Dai nasce o dever de
trabalharem com todas as forças, mas segundo a forma da vocação própria,
pela oração e também pela atividade apostólica - por implantar e robustecer
o reino de Cristo nas almas e por dilatá-lo a todo o mundo. Eis uma das razões
pelas quais a Igreja defende e favorece a índole própria dos vários
institutos religiosos.
A profissão
dos conselhos evangélicos aparece, na verdade, como sinal, que pode e deve
atrair eficazmente todos os membros da Igreja a cumprirem com diligência os
deveres da vocação cristã. Precisamente porque o povo de Deus não tem aqui a
sua cidade permanente, mas procura a futura, o estado religioso, que deixa os
seus membros mais livres das preocupações terrenas, manifesta melhor a todos
os crentes os bens celestes já presentes neste mundo, testemunha a vida nova e
eterna, adquirida pela redenção de Cristo, e prenuncia a ressurreição futura
e a glória do reino celestial. Este mesmo estado imita ainda mais de perto e
renova perpetuamente na Igreja aquela forma de vida que o Filho de Deus, ao vir
ao mundo, assumiu para cumprir a vontade do Pai, e propôs aos discípulos que o
seguiam. Finalmente, mostra de modo particular a elevação do reino de Deus
acima de tudo o que é terreno, manifesta as maiores exigências que impõe, e
faz ver a todos os homens a maravilhosa eficácia de Cristo que reina, e o poder
infinito do Espírito Santo que opera maravilhas na Igreja.
Portanto,
este estado, cuja essência consiste na profissão dos conselhos evangélicos,
embora não faça parte da estrutura hierárquica da Igreja, pertence, de modo
indiscutível, à sua vida e a sua santidade.
Regras e constituições
45. Sendo
função da hierarquia eclesiástica apascentar o povo de Deus e levá-lo a
abundantes pastagens (cf. Ez 34,14), a ela incumbe também regular, com sábias
leis, a prática dos conselhos evangélicos, que promovem de modo particular a
perfeição da caridade para com Deus e para com o próximo. (6) A mesma
hierarquia, seguindo com docilidade os impulsos do Espírito Santo, aceita as
regras propostas por homens e mulheres ilustres e, depois de revistas, aprova-as
autenticamente, e com sua autoridade vigia e protege os institutos eretos por
toda a parte para edificação do corpo de Cristo, a fim de que aumentem e
floresçam segundo o espírito dos vários fundadores.
Para melhor
providenciar às necessidades de toda a grei do Senhor, pode o Sumo Pontífice,
em virtude do seu primado sobre a Igreja universal e para utilidade comum,
isentar da jurisdição dos ordinários do lugar, e sujeitar diretamente à sua
autoridade, qualquer instituto de perfeição e cada um dos seus membros. (7)
Estes podem igualmente ser deixados ou confiados à autoridade patriarca própria.
Os membros de todos estes institutos, no cumprimento dos deveres para com a
Igreja, segundo a sua forma peculiar de vida, devem prestar reverência e obediência
aos bispos, de harmonia com as leis canônicas, em virtude da autoridade
pastoral que eles têm nas Igrejas particulares e para se manter a concórdia e
unidade necessárias na ação apostólica. (8)
A Igreja,
com a sua aprovação, não só eleva à dignidade de estado canônico a profissão
religiosa, mas também a apresenta, mesmo na sua ação litúrgica, como estado
consagrado a Deus. Com efeito, a própria Igreja, com a autoridade que Deus lhe
comunicou, recebe os votos dos professos, obtém-lhes o auxílio e a graça
divina com a sua oração pública, recomenda-os a Deus e dá-lhes uma bênção
espiritual, associando a oblação deles ao sacrifício eucarístico.
Purificação
da alma
46.
Esforcem-se multo os religiosos para que a Igreja possa, por meio deles,
apresentar Cristo, cada vez com maior clareza, quer aos fiéis quer aos infiéis:
tanto Cristo entregue à contemplação no monte, como evangelizando o reino de
Deus às multidões; curando os enfermos e os feridos, convertendo os pecadores;
ou ainda a abençoar as criancinhas e a fazer bem a todos, obediente em cada
atitude à vontade do Pai que o enviou. (9)
Convençam-se
todos d~ que a profissão dos conselhos evangélicos, embora implique a renúncia
a bens dignos sem dúvida de grande estima, não obsta contudo ao verdadeiro
desenvolvimento da pessoa humana, antes, pelo contrário, por sua própria
natureza o favorece imenso. Na verdade, os conselhos evangélicos abraçados
voluntariamente, segundo a vocação pessoal de cada um, contribuem imenso para
a purificação do coração e para a liberdade do espírito, excitam
continuamente o fervor da caridade e, sobretudo, como se comprova com o exemplo
de tantos santos fundadores, podem aproximar mais o povo cristão do gênero de
vida virginal e pobre, que para si escolheu Cristo Senhor Nosso e que a Virgem
sua Mãe abraçou.
Nem se julgue que os religiosos, pela sua consagração, se
alheiam dos homens ou se tornam inúteis à sociedade terrestre. Pois, embora
algumas vezes não se ocupem diretamente dos seus contemporâneos, têm-nos
presentes de modo mais profundo nas entranhas de Cristo e colaboram
espiritualmente com eles a fim de que a edificação da cidade terrena se
alicerce sempre no Senhor e para ele se oriente, de modo a não trabalharem em vão
os que a edificam. (10)
Enfim, este
sagrado Concilio encoraja e louva esses homens e mulheres, religiosos e
religiosas, que, nos mosteiros ou nas escolas e hospitais ou ainda nas missões,
honram a esposa de Cristo pela fidelidade constante e humilde à sua consagração,
e prestam a todos os homens generosos e variadíssimos serviços.
Perseverança
47.
Esforcem-se cuidadosamente todo aquele que foi chamado à profissão dos
conselhos evangélicos, por perseverar e se distinguir na vocação a que foi
chamado por Deus, para maior santidade da Igreja e maior glória da Trindade,
una e indivisa, que, em Cristo e por Cristo, é a fonte e origem de toda a
santidade.
Notas:
(1)
Cf. Rosweydus, Vitae Patrum, Antuérpia, 1628. Apophtegmata Patrum: PG 65. Paládio,
História Lausiaca; PG 34, 995 ss.; ed. C,
Butler, Cambridge, 1898 (1904). Pio XI, Const.
Apost. e Umbratilem, 8 jul. 1924: AAS 16 (1924) pp. 386-387. Pio XII, Aloc. Nous
sommes heureux, 11 abril 1958: AAS 50 (1958) p. 283.
(2) Paulo VI, Aloc. Magno gaudio, 23 maio 1964: AAS 56 (1964) p. 566.
(3) Cf.
Cod. lur. Can., c. 487 e 488, 4. Pio XII, Aloc.
Annus sacer, 8 dez. 1950: AAS 43 (1951) p. 27 ss. Pio XII, Const. Apost. Provida
Mater, 2 fev. 1947: AAS 39 (1947) p. 120 ss.
(4) Paulo VI, 1. cit., p. 567.
(5) Cf. santo Tomás, Summa Theol. II-II, q. 184, a. 3 e q. 188, a. 2. são
Boaventura, Opúsc. XI, Apologia Pauperum, c. 3, 3:
ed. Opera, Oueracchi, t. 8, 1898, p. 245 a.
(6) Cf. Conc. Vat. I, Esquema De Ecclesia Christi, cap. XV e anot. 48: Mansi,
51, 549 ss. e 619 ss. Leio XIII, Epist. Au milieu des consolations, 23 dez.
1900: ASS 33 (1900-01) p. 361. Pio XII, Const. Apost. Provida Mater. 1.
cit., p. 114 ss.
(7) Leão XIII, Const. Romanos Pontifices, 8
maio 1881: ASS 13 (1880-81) p. 483. Pio XII, Aloc. Annus sacer. 8 dez. 1950: AAS
43 (1951) p. 28 ss.
(8) Pio XII, Aloc. Annus sacer, 1. cit. p. 28. Pio XII, Const. Apost. Sedes
Sapientiae, 31 maio 1956: AAS 48 (1956) p. 355. Paulo VI, 1. cit. pp. 570-571.
(9) Cf. Pio XII, Cart. Enc. Mystici Corporis, 29 jun. 1943: AAS 35 (1943) p. 214
ss.
(10) Cf. Pio XII, Aloc. Annus
sacer. 1. cit. p. 30. Aloc. Sous la maternelle
protection, 9 dez. 1957: AAS 50 (1958) p. 39 ss.
VII. ÍNDOLE ESCATOLÓGICA DA
IGREJA PEREGRINA E UNIÃO DA MESMA COM A IGREJA CELESTE
Índole
escatológica da nossa vocação na Igreja
48. A
Igreja, à qual somos todos chamados em Jesus Cristo e na qual pela graça de
Deus adquirimos a santidade, só será consumada na glória celeste, quando
chegar o tempo da restauração de todas as coisas (At 3,21); e, como o gênero
humano, também o mundo inteiro, que está unido intimamente ao homem e por ele
atinge o seu fim, será totalmente renovado em Cristo (cf. Ef 1,10; Cl 1,20; 2Pd
3,10-13).
Quando foi
levantado da terra, Cristo atraiu a si todos os homens (cf. Jo 12,32 grego);
ressuscitado de entre os mortos (cf. Rm 6,9), enviou sobre os apóstolos o seu
Espírito vivificador e, por meio dele, constituiu o seu corpo, que é a Igreja,
como sacramento universal de salvação; sentado à direita do Pai, atua
continuamente no mundo para conduzir os homens à Igreja e por ela os unir mais
estreitamente a si, e para, alimentando os com o próprio corpo e sangue, os
tornar participantes de sua vida gloriosa.
A prometida restauração, que
esperamos, começou já em Cristo, foi impulsionada com a vinda do Espírito
Santo, e continua por meio dele na Igreja - que nos faz descobrir na fé o
sentido da própria vida temporal - à medida que vamos realizando, com esperança
nos bens futuros, a obra que o Pai nos confiou no mundo, e vamos operando a
nossa salvação (cf. Fl 2,12).
Já
chegamos, portanto, ao fim dos tempos (cf. 1Cor 10,11), a renovação do mundo
está irrevogavelmente decretada e vai-se realizando de certo modo já neste
mundo: de fato, a Igreja possui já na terra uma santidade verdadeira, embora
imperfeita. Até que haja céus novos e nova terra, em que habite a justiça
(cf. 2Pd 3,13), a Igreja peregrina leva consigo - nos seus sacramentos e nas
suas instituições, que pertencem à idade presente - a figura deste mundo que
passa. Vive entre as criaturas, que gemem e sofrem as dores do parto até agora,
suspirando pela manifestação dos filhos de Deus (cf. Rm 8,19-22).
Unidos,
pois, a Cristo, na Igreja, e marcados pelo selo do Espírito Santo, ''que é o
penhor da nossa herança (Ef 1,14), chamamo-nos e na realidade somos
filhos de Deus (cf. 1Jo 3,11), mas não aparecemos ainda com Cristo na glória
(Cl 3,4), na qual seremos semelhantes a Deus, porque o veremos tal como ele é
(cf. 1Jo 3,2). Assim ''enquanto habitamos no corpo, vivemos no exílio longe do
Senhor (2Cor 5,6) e apesar de possuirmos as primícias do Espírito,
gememos dentro de nós (cf. Rm 8,23) e suspiramos por estar com Cristo (cf. Fl
1,23). Este mesmo amor nos impele a vivermos mais intensamente para aquele que
por nós morreu e ressuscitou (cf. 2Cor 5,15). Por isso, nos empenhamos em
agradar em tudo ao Senhor (cf. 2Cor 5,9) e nos revestimos da armadura de Deus,
para podermos estar firmes contra as maquinações do demônio e resistir no dia
mau (cf. Ef 6,11-13). Mas, como não sabemos o dia nem a hora, devemos vigiar
constantemente, segundo a recomendação do Senhor, para, ao terminar a nossa única
passagem por esta vida terrena (cf. Hb 9,27), merecermos entrar com ele no
banquete nupcial, sermos contados entre os benditos do seu Pai (cf. Mt
25,31-46),
e não sermos repelidos como servos maus e indolentes (cf. Mt 25,26),
para o fogo eterno (cf. Mt 25,41), para as trevas exteriores onde haverá
choro e ranger de dentes (Mt 22,13 e 25,30).
Pois, antes de reinarmos com
Cristo glorioso, compareceremos todos perante o tribunal de Cristo, a fim
de cada um ser remunerado pelas obras da vida corporal, consoante houver
praticado o bem ou o mal (2Cor 5,10); e no fim do mundo aqueles que
tiverem feito boas obras ressuscitarão para a vida e os que tiverem praticado o
mal hão de ressuscitar para a condenação (Jo 5,29; cf. Mt 25,46).
Tendo
por certo que os sofrimentos do tempo presente não têm proporção com a
glória que há de revelar-se em nós (Rm 8,18; cf. 2Tm 2,11-12),
esperamos com fé firme o cumprimento da feliz esperança da aparição
gloriosa do grande Deus e Salvador, nosso Senhor Jesus Cristo (Tt 2,13),
o qual transformará o nosso corpo de miséria, tornando-o semelhante ao
seu corpo glorioso (Fl 3,21) e virá para ser glorificado nos seus santos
e admirado em todos os que tiverem acreditado (2Ts 1,10).
A comunhão
da Igreja celeste com a Igreja peregrina
49. Até
que o Senhor venha na sua majestade e todos os anjos com ele (cf Mt 25,31), e até
que lhe sejam submetidas, com a destruição da morte, todas as coisas (cf. 1Cor
15,26-27), alguns dos seus discípulos peregrinam na terra, outros, lá passados
desta vida, estão se purificando, e outros vivem já glorificados, contemplando
claramente o próprio Deus, uno e trino, tal qual é; (1) todos, porém,
ainda que em grau e de modo diversos, comungamos na mesma caridade para com Deus
e para com o próximo, e cantamos o mesmo hino de glória ao nosso Deus. Pois,
todos os que são de Cristo, tendo o seu Espírito, formam uma só Igreja e nele
estão unidos entre si (cf. Ef 4,16). Por isso, a união dos que estão na terra
com os irmãos que adormeceram na paz de Cristo de maneira nenhuma se
interrompe; pelo contrário, segundo a fé constante da Igreja, reforça-se pela
comunicação dos bens espirituais. (2)
Em virtude da sua união mais íntima
com Cristo, os bem-aventurados confirmam mais solidamente toda a Igreja na
santidade, enobrecem o culto que ela presta a Deus na terra e muito contribuem
para que ela se edifique em maior amplitude (cf. 1Cor 12,12-27). (3) Porque
foram já recebidos na Pátria e estão na presença do Senhor, (cf 2Cor 5,8) -
por ele, com ele e nele - não cessam de interceder em nosso favor junto do Pai,
(4) apresentando os méritos que - por meio do único Mediador entre Deus e os
homens, Cristo Jesus, (cf. 1Tm 2,5) - adquiriram na terra, servindo ao Senhor em
todas as coisas e completando na sua carne o que falta à paixão de Cristo em
benefício do seu corpo que é a Igreja (cf. Cl 1,24). (5) Na verdade, a
solicitude fraterna dos bem-aventurados ajuda imenso a nossa fraqueza.
Relações
da Igreja peregrina com a Igreja celeste
50. Tendo
perfeito conhecimento desta comunhão de todo o corpo místico de Jesus Cristo,
a Igreja terrestre, desde os primeiros tempos do cristianismo, venerou com
grande piedade a memória dos defuntos, (6) ofereceu também sufrágios por
eles, porque é santo e salutar o pensamento de orar pelos defuntos para
serem libertos dos seus pecados (2Mc 12,46). Contudo os apóstolos e os mártires
de Cristo, que deram com a efusão do próprio sangue o maior testemunho de fé
e de amor, sempre a Igreja acreditou que nos estão mais estreitamente unidos em
Cristo; a eles, e também à bem-aventurada Virgem Maria e aos santos anjos,
venerou de modo especial (7) e implorou devotamente o auxílio da sua intercessão.
Cedo tomaram também lugar, na veneração e nas preces, aqueles que imitaram
mais de perto a virgindade e a pobreza de Cristo, (8) e finalmente todos os
outros que se tornaram recomendados à pia devoção e imitação dos fiéis (9)
pelo exercício das virtudes cristãs e pelos divinos carismas. (10)
Ao
contemplarmos a vida de quantos seguiram fielmente a Cristo, novo motivo nos
impele a procurarmos a cidade futura (cf. Hb 13,14 e 11,10); ao mesmo tempo,
aprendemos a descobrir, no estado e condição de cada um, qual é o caminho
mais seguro para chegarmos, por entre as vicissitudes deste mundo, até à união
perfeita com Cristo, quer dizer, à santidade. (11) Deus manifesta de forma viva
aos homens a sua presença e o seu rosto na vida daqueles que, possuindo embora
uma natureza igual à nossa, se transformam mais perfeitamente na imagem de
Cristo (cf. 2Cor 3,18). Neles é Deus quem nos fala e nos mostra um sinal do seu
reino, (12) para o qual somos fortemente atraídos, ao vermos tão grande nuvem
de testemunhas que nos envolve (cf. Hb 12,1), e tais provas da verdade do
Evangelho.
Não
veneramos, porém, a memória dos santos apenas pelo exemplo que nos dão;
fazemo-lo mais ainda para que a união de toda a Igreja no Espírito se
consolide pelo exercício da caridade fraterna (cf. Ef 4,1-6). Pois, do mesmo
modo que a comunhão cristã, entre os que peregrinamos neste mundo, nos coloca
mais perto de Cristo, assim também a familiaridade com os santos nos une com
Cristo, de quem promana, como de fonte e cabeça, toda a graça e a própria
vida do povo de Deus. (13)
Muito convém, portanto, que amemos estes amigos e
co-herdeiros de Jesus Cristo - também irmãos nossos e benfeitores insignes -
que demos as devidas graças a Deus por no-los ter dado, (14) que os invoquemos
humildemente e que recorramos às suas orações, à sua intercessão e ao seu
auxílio para impetrarmos de Deus as graças necessárias, por meio de seu Filho
Jesus Cristo Nosso Senhor, único Redentor e Salvador nosso. (15)
Na
verdade, todo o amor autêntico que manifestamos aos bem-aventurados dirige-se
por sua natureza a Cristo e termina nele, coroa de todos os santos,
(16) e, por ele, termina em Deus, que é admirável nos seus santos e neles se
glorifica. (17)
Vivemos de
maneira eminente a nossa união com a Igreja celeste, especialmente quando na
sagrada liturgia - na qual a virtude do Espírito Santo age sobre nós mediante
os sinais sacramentais - celebramos juntos, em fraterna alegria, os louvores da
majestade divina, (18) e quando todos os resgatados pelo sangue de Cristo - de
todas as línguas e povos e nações (cf. Ap 5,9) - reunidos numa única Igreja,
glorificamos o Deus uno e trino com o mesmo cântico de louvor. É ao
celebrarmos o sacrifício eucarístico, que mais unidos estamos ao culto da
Igreja celeste, numa só comunhão com ela e venerando em primeiro lugar a memória
da gloriosa sempre Virgem Maria, de são José, dos apóstolos e mártires, e de
todos os santos. (19)
Disposições
pastorais
51. Este
sagrado Concílio abraça com grande piedade a fé tão veneranda dos nossos
antepassados acerca da comunhão vital com os irmãos que já se encontram na glória
celeste ou estão ainda a purificar-se após a morte, e propõe novamente os
Decretos dos Sagrados Concílios de Nicéia II, (20) de Florença (21) e de
Trento. (22) Ao mesmo tempo exorta com pastoral solicitude todos aqueles a quem
isto possa dizer respeito, a que tratem de suprimir ou corrigir quaisquer
abusos, excessos ou defeitos que se tenham acaso introduzido, e a que tudo
restabeleçam ordenadamente para maior louvor de Cristo e de Deus.
Ensinem,
pois, aos fiéis que o verdadeiro culto dos santos não consiste tanto na
multiplicidade dos atos exteriores, como principalmente na intensidade do nosso
amor prático, que nos leva a procurarmos, para maior bem nosso e da Igreja, na
vida deles o exemplo, na sua intimidade a união, e na sua intercessão o auxílio.
(23) Por outro lado, expliquem aos fiéis que o nosso culto aos santos, se for
bem entendido à luz da fé, de modo nenhum prejudica o culto latrêutico
prestado a Deus-Pai por Jesus Cristo no Espírito, antes o vem enriquecer mais
ainda. (24)
Todos, com
efeito, quantos somos filhos de Deus e constituímos em Cristo uma só família
(cf. Hb 3,6), ao unirmo-nos em mútua caridade e louvor uníssono à Trindade
Santíssima, realizamos a vocação própria da Igreja e participamos, com gozo
antecipado, na liturgia da glória consumada. (25) Quando Cristo aparecer, e se
der a ressurreição gloriosa dos mortos, o esplendor de Deus iluminará a
Cidade celeste e a sua luz será o cordeiro (cf. Ap 21,24). Então toda a Igreja
dos santos, na felicidade suprema do amor, adorará a Deus e ao cordeiro
que foi imolado (Ap 5,12), proclamando a uma só voz: Àquele que
está sentado no trono e ao cordeiro, louvor, honra, glória e poder pelos séculos
dos séculos (Ap 5,13-14).
Notas:
(1)
Conc. FIorentino, Decretum pro Graecis: Denz. 693 (1305).
(2) Além dos documentos mais antigos contra qualquer forma de evocação dos
espíritos desde Alexandre IV (27 de set. 1258), cf. Enc. do S. Ofício, De
magnetismi abusu, 4 agosto 1856: AAS (1865) pp. 177-178, Denz. 1653-1654
(2823-2825); a resposta do S. Ofício, 24 abril 1917: AAS 9 (1917) p. 268, Denz
2182 (3642).
(3) Vela-se uma exposição sintética desta doutrina paulina em: Pio XII, Cart.
Enc. Mystici Corporis: AAS 35 (1943) p. 200 e passim.
(4) Cf. santo Agostinho, Enarr. in Ps. 85, 24: PL 37, 1099. São Jerônimo,
Liber contra Vigilantium, 6: PL 23, 344. Santo Tomás, ln 4m Sent., d. 45, p. 3.
a. 2. São Boaventura, ln 4m Sent. d. 45 a. 3, q. 2; etc.
(5) Cf. Pio XII, Cart. Enc. Mystici Corporis: AAS 35 (1943) p. 245.
(6) Cf. Muitas inscrições nas catacumbas
romanas.
(7) Cf. Gelásio I, Decretel De libris recipiendis, 3: PL 59, 160; Denz. 165
(353).
(8) Cf. são Metódio, Symposion, VII, 3: GOS (Bonwetsch) p. 74.
(9) Cf. Pio XII, Cart. Enc. Mediator Dei: AAS 39 (1947) p. 581.
(10) Cf. Bento XV, Decretum approbationis virtutum in Causa beatificationis et
canonízationis Servi Dei loannis Nepomuceni Neummann: AAS 14 (1922) p. 23; várias
aloc. de Pio XI Inviti all'eroismo, Discorsi, t. I-III, Roma 1941-1942 passim;
Pio XII, Discorsi e Radiomessaggi t. 10, 1949, pp. 37-43.
(11) Cf. Hb 13,17; Eclo 44-50: Hb 11,3-40. Cf. também Pio XII, Cart. Enc.
Mediator Dei: AAS 39 (1947) pp. 582-583.
(12) Cf.
Conc. Vat. I, Const. De fide catholica, cap. 3: Denz. 1794 (3013).
(13) Cf. Pio XII, Cart. Enc. Mystíci Corporis:
AAS 35 (1943) p. 216.
(14) Quanto a gratidão para com os santos. cl. E. Diehl, Inscriptionis latinae
christianae veteres, I, Berlim 1925, nn. 2008, 2382 e passím.
(16) Breviário Romano, Invitatório na festa de Todos os Santos.
(17) Cf.,
v. g., 2Ts 1,10.
(18) Conc. Vat. II, Const. De Sacra Liturgia,
cap. 5, n. 104.
(19) Cânon da missa romana.
(20) Conc.
Niceno II, Act. VII: Denz. 302 (600).
(21) Conc. Florentino, Decretum pro Graecis:
Denz. 693 (1304).
(22) Conc. Tridentino, Sess. 25, De invocatione. veneratione et reliquiis
santorum et sacris imaginibus: Denz. 984-988 (1821-1824); Sess. 25, Decretum de
Purgatorio; Denz. 983 (1820) Sesa. 6, Decretum de iustilicatione, can. 30: Denz.
840 (1580).
(23) Do Prefácio concedido a algumas dioceses.
(24) Cf. são Pedro Canísio, Catechismus Maior seu Summa Doctrinae christianae,
cap. III
(ed. crit. F. Streicher). Pars I, pp. 15-16, n.
44 e pp. 100-101, n 49.
(25) Cf.
Conc. Vat. II, Const. De Sacra Liturgia, cap.
1, n. 8.
VIII. A BEM-AVENTURADA VIRGEM
MARIA, MÃE DE DEUS, NO MISTÉRIO DE CRISTO E DA IGREJA
a. Proêmio
A
Santíssima Virgem no mistério de Cristo
52. Querendo Deus, sumamente benigno e sábio, realizar a redenção
do mundo, quando chegou a plenitude dos tempos, mandou o seu Filho,
nascido duma mulher... para que recebêssemos a adoção de filhos (Gl
4,4-5), o qual, por amor de nós homens e para nossa salvação, desceu
dos céus e encarnou pelo poder do Espírito Santo no seio da Virgem
Maria. (1) Este mistério divino da salvação revela-se-nos e continua na
Igreja, que o Senhor constituiu como seu corpo, e na qual os fiéis - unidos a
Cristo, sua cabeça, e em comunhão com todos os seus santos - devem também, e
em primeiro lugar, venerar a memória da gloriosa sempre virgem Maria, Mãe de
Deus e de Nosso Senhor Jesus Cristo. (2)
A Virgem Maria e a Igreja
53. A Virgem Maria, que na anunciação do anjo recebeu o Verbo de
Deus no seu coração e no seu corpo, e deu a Vida ao mundo, é reconhecida e
honrada como verdadeira Mãe de Deus e do Redentor. Remida de modo mais sublime
em atenção aos méritos de seu Filho, e unida a ele por vínculo estreito e
indissolúvel, foi enriquecida com a sublime prerrogativa e dignidade de ser Mãe
de Deus Filho, e, portanto, filha predileta do Pai e sacrário do Espírito
Santo; com este dom de graça sem igual, ultrapassa de longe todas as outras
criaturas celestes e terrestres.
Ao mesmo tempo encontra-se unida na estirpe de
Adão com todos os homens que devem ser salvos; mais ainda, é
verdadeiramente mãe dos membros de Cristo... porque com o seu amor
colaborou para que na Igreja nascessem os fiéis, que são os membros daquela
cabeça. (3) Por esta razão é também saudada como membro supereminente
e absolutamente singular da Igreja, e também como seu protótipo e modelo
acabado da mesma, na fé e na caridade; e a Igreja Católica, guiada pelo Espírito
Santo, honra-a como mãe amantíssima, dedicando-lhe afeto de piedade filial.
Intenção do Concílio
54. Por isso o sagrado Concílio, ao expor a doutrina da Igreja, na
qual o divino Redentor opera a salvação, deseja esclarecer cuidadosamente quer
a função da Santíssima Virgem no mistério do Verbo encarnado e do corpo místico,
quer os deveres dos próprios homens remidos para com a Mãe de Deus, que é Mãe
de Cristo e dos homens, em especial dos fiéis. Não é, no entanto, intenção
sua propor a doutrina completa sobre Maria ou diminuir questões que a investigação
dos teólogos ainda não conseguiu dilucidar plenamente. Mantém-se, portanto,
no seu direito as opiniões que são livremente propostas nas escolas católicas
acerca daquela que na santa Igreja ocupa o lugar mais alto depois de Cristo e o
mais perto de nós. (4)
b. Função da Santíssima
Virgem na economia da salvação
A
Mãe do Messias no Antigo Testamento
55. Os livros do Antigo e do Novo Testamento, e a tradição
veneranda mostram, dum modo que se vai tornando cada vez mais claro, e colocam,
por assim dizer, diante dos nossos olhos a função da Mãe do Salvador na
economia da salvação. Os livros do Antigo Testamento descrevem a história da
salvação, que vai preparando, a passos lentos, a vinda de Cristo ao mundo.
Estes primeiros documentos, tais como são lidos na Igreja e entendidos à luz
da ulterior revelação completa, iluminam pouco a pouco, sempre com maior
clareza, a figura de uma mulher, a da Mãe do Redentor. Ela aparece, a esta luz,
profeticamente esboçada na promessa da vitória sobre a serpente, feita aos
nossos primeiros pais já caídos no pecado (cf. Gn 3,15). Do mesmo modo, ela é
a Virgem que há de conceber e dar à luz um Filho, cujo nome será Emanuel (cf.
Is 7,14; Mq 5,2-3; Mt 1,22-23). Ela sobressai entre os humildes e os pobres do
Senhor, que dele esperam confiadamente e vêm a receber a salvação. Enfim, com
ela, filha excelsa de Sião, após a longa espera da promessa, atingem os tempos
a sua plenitude e inaugura-se nova economia, quando o Filho de Deus assume dela
a natureza humana, para, mediante os mistérios da sua carne, libertar o homem
do pecado.
Maria na anunciação
56. Quis, porém, o Pai das misericórdias que a encarnação fosse
precedida da aceitação por parte da Mãe predestinada, a fim de que, assim
como uma mulher tinha contribuído para a morte, também uma mulher contribuísse
para a vida. E isto aplica-se de forma eminente à Mãe de Jesus, a qual deu ao
mundo aquele que é a Vida que tudo renova, e foi enriquecida por Deus com dons
convenientes a tão alto múnus. Portanto, nada admira que tenha sido corrente,
entre os santos padres, chamar a Mãe de Deus, toda santa e imune de qualquer
mancha do pecado, como que plasmada pelo Espírito Santo e formada qual nova
criatura. (5) Adornada, desde o primeiro instante da sua conceição, com
esplendores duma santidade absolutamente singular, a Virgem de Nazaré ouvindo a
saudação do anjo mandado por Deus, que lhe chama cheia de graça
(cf. Lc 1,28), responde ao mensageiro celeste: Eis a escrava do Senhor, faça-se
em mim segundo a tua palavra (Lc 1,38). Assim Maria, filha de Adão,
consentindo na palavra divina, tornou-se Mãe de Jesus, e abraçando com
generosidade e sem pecado algum a vontade salvífica de Deus, consagrou-se
totalmente, como escrava do Senhor, à pessoa e obra de seu Filho, servindo ao
mistério da redenção sob a sua dependência e com ele, pela graça de Deus
onipotente.
Com razão afirmam os santos padres que Maria não foi instrumento
meramente passivo nas mãos de Deus, mas cooperou na salvação dos homens com fé
livre e com inteira obediência. Como diz santo Irineu, pela obediência,
ela tornou-se causa de salvação para si mesma e para todo o gênero
humano. (6) E não poucos padres antigos, na sua pregação, comprazem-se
em repetir: O laço de desobediência de Eva foi desfeito pela obediência
de Maria; o que a virgem Eva atou com sua incredulidade, a Virgem Maria
desatou-o pela fé. (7) Comparando-a com Eva, chamam a Maria Mãe
dos viventes (8) e afirmam com freqüência: A morte veio por Eva, e
a vida por Maria. (9)
A Virgem Maria e o Menino Jesus
57. Esta união da Mãe com o Filho, na obra da redenção,
manifesta-se desde o momento em que Jesus Cristo é concebido virginalmente, até
à sua morte. Primeiramente, quando Maria se dirigiu pressurosa a visitar
Isabel, e esta a proclamou bem-aventurada por ter acreditado na salvação
prometida, estremecendo o precursor de alegria no seio de sua mãe (cf. Lc
1,41-45); e depois, no nascimento, quando a Mãe de Deus, cheia de alegria,
mostrou aos pastores e aos magos o seu Filho primogênito, que não diminuiu,
antes consagrou a sua integridade virginal. (10) E também quando, ao apresentá-lo
no templo ao Senhor, ofereceu o resgate dos pobres e ouviu Simeão profetizar
que esse Filho havia de ser sinal de contradição e que uma espada atravessaria
a alma da Mãe, para que se revelassem os pensamentos de muitos corações (cf.
Lc 2,34-35). O Menino Jesus perdido e com tanta dor procurado, encontraram-no
Maria e José no templo, ocupado nas coisas de seu Pai; não entenderam a
resposta que lhes deu; a Mãe, porém, guardava no seu coração e meditava
todas estas coisas (cf. Lc 2,41-51).
A Virgem Maria no ministério público de Jesus
58. Na vida pública de Jesus, a sua Mãe manifesta-se claramente
logo no início, quando nas bodas de Caná da Galiléia, movida de misericórdia,
conseguiu com sua intercessão que Jesus, o Messias, desse início aos seus
milagres (cf. Jo 2,11). Durante a pregação do seu Filho, recolheu as palavras
com que ele, exaltando o reino acima das razões e vínculos da carne e do
sangue, proclamou bem-aventurados os que ouvem e observam a palavra de Deus (cf.
Mc 3,35 - paralelo Lc 11,27-28), como ela fazia pontualmente (cf. Lc 2,19.51).
Assim também a Santíssima Virgem avançou no caminho da fé, e conservou
fielmente a união com seu Filho até a cruz, junto da qual, por desígnio de
Deus, se manteve de pé (cf. Jo 10,25); sofreu profundamente com o seu Unigênito
e associou-se de coração maternal ao seu sacrifício, consentindo amorosamente
na imolação da vítima que ela havia gerado; finalmente, ouviu estas palavras
do próprio Jesus Cristo, ao morrer na cruz, dando-a ao discípulo por Mãe:
Mulher, eis aí o teu filho (cf. Jo 19, 26-27). (11)
A Virgem Maria depois da ascensão
59. Foi vontade de Deus manifestar solenemente o sacramento da
salvação humana, só depois de ter enviado o Espírito prometido por Cristo.
Por isso, vemos os apóstolos, antes do dia do Pentecostes, assíduos e unânimes
na oração, com algumas mulheres e com Maria mãe de Jesus e os irmãos
deste (At 1,14), e vemos também Maria implorando com suas preces o dom do
Espírito, que na anunciação, já a tinha coberto com sua sombra. Finalmente,
a Virgem Imaculada, que fora preservada de toda mancha da culpa original, (12)
terminando o curso de sua vida terrena, foi levada a glória celeste em corpo e
alma, (13) e exaltada pelo Senhor como Rainha do universo, para que se parecesse
mais com o seu Filho, Senhor dos senhores (cf. Ap 19,16) e vencedor do pecado e
da morte. (14)
c. A Santíssima Virgem e a
Igreja
Maria,
escrava do Senhor, na obra da redenção
60. É um só o nosso Mediador, segundo as palavras do Apóstolo:
Porque há um só Deus, também há um só mediador entre Deus e os
homens, Cristo Jesus, verdadeiro homem, que se ofereceu em resgate por
todos (1Tm 2,5-6).
A função maternal de Maria para com os homens, de
nenhum modo obscurece ou diminui esta mediação única de Cristo, antes mostra
qual é a sua eficácia. Na verdade, todo o influxo salutar da Santíssima
Virgem em favor dos homens não é imposto por nenhuma necessidade intrínseca,
mas sim por livre escolha de Deus, e dimana da superabundância dos méritos de
Cristo, funda-se na sua mediação, dela depende absolutamente e dela tira toda
a sua eficácia; e, longe de impedir, fomenta ainda mais o contacto Imediato dos
fiéis com Cristo.
Maternidade espiritual
61. A Santíssima Virgem, predestinada - desde toda a eternidade,
no desígnio da encarnação do Verbo divino - para Mãe de Deus, foi na terra,
por disposição da divina Providência, a Mãe do Redentor divino, mais que
ninguém sua companheira generosa, e a humilde escrava do Senhor. Concebendo a
Cristo, gerando-o, alimentando-o, apresentando-o no templo ao Pai, sofrendo com
seu Filho que morria na cruz, ela cooperou de modo absolutamente singular - pela
obediência, pela fé, pela esperança e a caridade ardente - na obra do
Salvador para restaurar a vida sobrenatural das almas. Por tudo isto, ela é
nossa mãe na ordem da graça.
Medianeira
62. A maternidade de Maria, na economia da graça, perdura sem
cessar, desde o consentimento que ela prestou fielmente na anunciação e
manteve sem vacilar ao pé da cruz, até a consumação final de todos os
eleitos. De fato, depois de elevada ao céu, não abandonou esta missão
salutar, mas, pela sua múltipla intercessão, continua a obter-nos os dons da
salvação eterna. (15)
Com seu amor de Mãe, cuida dos irmãos de seu Filho,
que ainda peregrinam e se debatem entre perigos e angústias, até que sejam
conduzidos à Pátria feliz. Por isso, a Santíssima Virgem é invocada, na
Igreja, com os títulos de Advogada, Auxiliadora, Amparo e Medianeira. (16) Mas
isto deve entender-se de modo que nada tire nem acrescente à dignidade e à
eficácia de Cristo, Mediador único. (17)
Nenhuma criatura pode colocar-se no mesmo plano que o Verbo
encarnado e redentor; mas, assim como o sacerdócio de Cristo é participado de
modo diverso pelos ministros sagrados e pelo povo fiel, e assim como a bondade
de Deus, única, se difunde realmente em medida diversa pelas suas criaturas,
assim também a única mediação do Redentor não exclui, antes suscita nas
criaturas uma cooperação múltipla, embora a participar da fonte única.
A Igreja não hesita em atribuir a Maria uma função assim
subordinada; sente-a até continuamente e recomenda-a ao amor dos fiéis, para
que, apoiados nesta proteção maternal, eles se unam mais intimamente ao
Mediador e Salvador.
Maria, como Virgem e Mãe, figura da Igreja
63. A Santíssima Virgem encontra-se também intimamente unida à
Igreja, pelo dom e cargo da maternidade divina, que a une com seu Filho
redentor, e ainda pelas suas graças e prerrogativas singulares: a Mãe de Deus
é a figura da Igreja, como já ensinava santo Ambrósio, quer dizer, na ordem
da fé, da caridade e da perfeita união com Cristo. (18)
De fato, no mistério
da Igreja, a qual também se chama com razão virgem e mãe, à Santíssima
Virgem Maria pertence o primeiro lugar, por ser, de modo eminente e singular,
exemplo de virgem e de mãe. (19) Pois, pela sua fé e obediência, gerou na
terra o próprio Filho de Deus-Pai: sem conhecer varão, mas pelo poder do Espírito
Santo, acreditando sem hesitar, qual nova Eva, não na antiga serpente mas no
mensageiro divino. Deu à luz o Filho, a quem Deus constituiu primogênito entre
muitos irmãos (cf. Rm 8,29), isto é, entre os fiéis em cuja geração e formação
ela coopera com amor de mãe.
Fecundidade da Virgem e da Igreja
64. A Igreja, contemplando a santidade misteriosa de Maria,
imitando a sua caridade, e cumprindo fielmente a vontade do Pai, pela palavra de
Deus fielmente recebida torna-se também ela mãe: pela pregação e pelo
batismo gera, para uma vida nova e imortal, os filhos concebidos do Espírito
Santo e nascidos de Deus. E é também virgem, que guarda a fé jurada ao
Esposo, íntegra e pura; e, à imitação da Mãe do seu Senhor, conserva, pela
graça do Espírito Santo, virginalmente íntegra a fé, sólida a esperança,
sincera a caridade. (20)
Virtudes de Maria que a Igreja deve imitar
65. Na Santíssima Virgem, a Igreja alcançou já essa perfeição
que faz que ela se apresente sem mancha nem ruga (cf. Ef 5,27). Os fiéis, porém,
continuam ainda a esforçar-se por crescer na santidade, vencendo o pecado; por
isso levantam os olhos para Maria que refulge a toda a comunidade dos eleitos
como modelo de virtudes. A Igreja, refletindo piedosamente sobre Maria e
contemplando-a à luz do Verbo feito homem, penetra cheia de respeito, mais e
mais no íntimo do altíssimo mistério da encarnação, e vai tomando cada vez
mais a semelhança do seu Esposo.
Com efeito, quando é exaltada e honrada Maria
- que, pela sua cooperação íntima na história da salvação, de certo modo
reúne e reflete as maiores exigências da fé - ela atrai os crentes para seu
Filho, para o sacrifício dele e para o amor do Pai. E a Igreja, por sua vez,
empenhada como está na glória de Cristo, torna-se mais semelhante à excelsa
figura que a representa, progredindo continuamente na fé, na esperança e na
caridade, buscando e cumprindo em tudo a vontade de Deus. Com razão, a Igreja,
também na sua atividade apostólica, olha para aquela que gerou a Cristo,
concebido do Espírito Santo o nascido da Virgem precisamente para que nasça e
cresça também no coração dos fiéis, por meio da Igreja. A Virgem, durante a
vida, foi modelo daquele amor materno de que devem estar animados todos aqueles
que colaboram na missão apostólica da Igreja para a redenção dos homens.
d. O culto da Santíssima
Virgem na Igreja
Natureza
e fundamento deste culto
66. Maria foi exaltada pela graça de Deus acima de todos os anjos
e de todos os homens, logo abaixo de seu Filho, por ser a Mãe Santíssima de
Deus e, como tal, haver interferido nos mistérios de Cristo: por isso, a Igreja
a honra com culto especial. Na verdade, já desde os mais antigos tempos, a Santíssima
Virgem é venerada com o título de Mãe de Deus, recorrendo os fiéis
com súplicas à sua proteção em todos os perigos e necessidades. (21)
Sobretudo a partir do Concilio de Éfeso, o culto prestado a Maria pelo povo de
Deus cresceu admiravelmente, manifestando-se em veneração, amor, invocação e
imitação, cumprindo-se as palavras proféticas da própria Virgem: Todas
as gerações me chamarão bem-aventurada, porque fez em mim grandes coisas
aquele que é poderoso (cf. Lc 1,48). Este culto, tal como existiu sempre
na Igreja, é de todo singular, mas difere essencialmente do culto de adoração
que é prestado ao Verbo encarnado e do mesmo modo ao Pai e ao Espírito Santo,
e muito contribui para ele. Pois que as várias formas de devoção para com a Mãe
de Deus, que a Igreja aprovou - dentro dos limites da doutrina sã e ortodoxa,
segundo as circunstâncias de tempos e lugares, e atendendo à índole e ao modo
de ser dos fiéis - fazem que, ao honrarmos a Mãe, seja bem conhecido, amado e
glorificado o Filho, e bem observados os mandamentos daquele pelo qual
existem todas as coisas (cf. Cl 1,15-16) e no qual aprouve ao eterno
Pai que habitasse toda a plenitude (cf. Cl 1,19).
Espírito da pregação e do culto
67. O Sagrado Concílio ensina deliberadamente esta doutrina católica
e exorta ao mesmo tempo todos os filhos da Igreja a que promovam dignamente o
culto da Virgem Santíssima, de modo especial o culto litúrgico; a que tenham
em grande estima as práticas e os exercícios de piedade que em sua honra o
magistério da Igreja recomendou no decorrer dos séculos; e a que observem
religiosamente quanto foi estabelecido no passado acerca do culto das imagens de
Cristo, da Santíssima Virgem e dos santos. (22) Além disso, exorta com todo o
empenho os teólogos e os pregadores da palavra divina a que, ao considerarem a
singular dignidade da Mãe de Deus, se abstenham com cuidado, tanto de qualquer
falso exagero, como também duma demasiada pequenez de espírito. (23) Com o
estudo da Sagrada Escritura, dos santos padres, dos doutores, e das liturgias da
Igreja, esclareçam com precisão, sob a orientação do magistério. as funções
e os privilégios da Santíssima Virgem, que sempre se referem a Cristo, origem
de toda a verdadeira santidade e devoção.
Evitem diligentemente tudo o que,
por palavras ou por obras possa induzir em erro os irmãos separados ou
quaisquer outras pessoas, quanto à verdadeira doutrina da Igreja. Por sua vez,
recordem-se os fiéis de que a devoção autêntica não consiste em
sentimentalismo estéril e passageiro, ou em vã credulidade, mas procede da fé
verdadeira que nos leva a reconhecer a excelência da Mãe de Deus e nos incita
a um amor filial para com a nossa Mãe, e à imitação das suas virtudes.
V. Maria, sinal de esperança certa e de consolação para o povo
de Deus peregrino
68. Do mesmo modo que a Mãe de Jesus, já glorificada no céu em
corpo e alma, é imagem e primícia da Igreja, que há de atingir a sua perfeição
no século futuro, assim também já agora na terra, enquanto não chega o dia
do Senhor (cf. 2Pd 3,10), ela brilha, como sinal de esperança segura e de
consolação, aos olhos do povo de Deus peregrino.
69. Muito alegra e consola este sagrado Concílio o saber que não
falta, mesmo entre os irmãos separados, quem preste a honra devida à Mãe do
Senhor e Salvador, de modo particular entre os orientais que afluem com fervor e
devoção a venerar a Mãe de Deus sempre Virgem. (24) Todos os fiéis dirijam súplicas
instantes à Mãe de Deus e Mãe dos homens, para que ela, que assistiu com suas
orações aos alvores da Igreja, também agora, exaltada no céu acima de todos
os anjos e bem-aventurados, interceda junto de seu Filho, na comunhão de todos
os santos, para que todas as famílias dos povos, quer se honrem do nome cristão
quer desconheçam ainda o Salvador, se reúnam em paz e concórdia no único
povo de Deus, para glória da santíssima e indivisa Trindade.
Notas:
(1)
Credo da missa romana: Símbolo Constantinopolitano: Mansi 3, 566. Cf. Conc. de
Éfeso, ib. 4, 1130 (e também ib. 2, 665 e 4, 1071); Conc. de Calcedônia, ib.
7, 111-116; Conc. Constantinopolitano II, ib 9, 375-396.
(2) Cânon da missa romana.
(3) Santo Agostinho, De S. Virginitate, 6: PL 40, 399.
(4) Cf. Paulo VI, Alocução no Concílio, 4 dez. 1963: AAS 56 (1964) p. 37.
(5) Cf. são Germano Const., Hom. ln Annunt. Delparae: PG 98, 328 A; ln Dorm. 2:
Col. 357 Anastásio Antioq., Serm. 2 de Annunt., 2 PG 89, 1377 AB; Serm. 3, 2:
col. 1388. Santo
André Cret., Cant. in B. V. Nat. 4: PG 97, 1321 B. In B. V. Nat., 1: col. 812
A. Hom. in dorm. 1: col. 1068 C. s. Sofrônio, Or. 2 in Annunt., 18 PG 87 (3),
3237 BD.
(9) São Jerônimo, Epist. 22, 21: PL 22, 408. Cf. santo Agostinho, Serm. 51, 2,
3: PL 38, 335; Serm. 232, 2: col. 1108. Sio Cirilo De Jerusalém, Catech. 12,
15: PG 33, 741 AB. São João Crisóstomo, In Ps. 44, 7: PG 55, 193. São João
Damasceno, Hom. 2 in dorm. 8. M. V., 3: PG 96, 728.
(10) Cf. Conc. Lateranense do ano 649, Can. 3:
Mansi 10, 1151. São Leão Magno, Epist. ad Flav.: PL 54, 759. Conc. de Calcedônia;
Mansi 7, 462. Santo Ambrósio, De instit. vir.: PL 16, 320.
(11) Cf. Pio XII, Cart. Enc. Mystici Corporis, 29 jun. 1943: AAS 35 (1943) pp.
247-248.
(12) Cf. Pio IX, Bula lneffabilis, 8 dez. 1654:
Acta Pii IX, 1, 1, p. 616: Denz. 1641 (2803).
(13) Cf. Pio XII, Const. Apost Munificentissimus. 1 nov. 1950: AAS 42 (1950):
Denz. 2333 (3903) Cf. são João Damasceno, Enc. in dorm. Dei genitricis, Hom. 2
e 3: PG 96. 721-762, especialmente col. 728 B. São Germano Constantin., In S.
Dei gen. dorm. Serm. 1: PG 98 (6), 340-348; Serm. 3: col. 361. São Modesto de
Jer., In dorm. SS. Deiparae: PG 86 (2): 3277-3312.
(14) Cf. Pio XII, Cart. Enc. Ad coeli Reginam, 11 out. 1954: AAS 46 (1954), pp.
633-636: Denz. 3913 ss. Cf. santo André Cret., Hom. 3 in dorm. SS.
Deiparae: PG 97, 1089-1109. São João Damasceno, De fide orth., IV, 14: PG 94,
1153-1168.
(15) Cf. Kleutgen, texto reformado De mysterio Verbi incarnati, cap. IV: Mansi
53, 290. Cf. santo André Cret., In nat. Mariae, sermo 4: PG 97, 865 A. São
Germano Constant; ln annut. Deiparae: PG 98, 312 BC. ln dorm. Deiparae, III col.
364 D. São João Damasceno, In dorm. B.
V. Mariae, Hom. 1, 8: PG 96, 712 BC-713 A.
(16) Cf. Leão XIII, Cart. Enc. Adiutricem
populi, 5 set. 1895: ASS 15 (1895-96) p. 303. São Pio X, Cart. Enc. Ad diem
illum 2 fev. 1904: Acta, 1, p. 154; Denz. 1978a (3370). Pio XI, Cart. Enc.
Miserentissimus, 8 maio 1928: AAS (1928) p. 178. Pio XII, Radiomens., 13 maio
1946: AAS 38 (1946) p. 266.
(17) Santo Ambrósio, Epist. 63: PL 16, 1218.
(18) Santo Ambrósio, Expos. Lc 2,7: PL 15, 1555.
(19) Cf. Ps, Pedro Dam., Serm. 63: PL 144, 861 AB Godofredo de são Vitor ln
nat. B.
M.. Ms. Paris, Mazarine, 1002 fol. 109r. Gerhobus
Reich, De gloria et honore Folii hominis 10: PL 194, 1105 AB.
(20) Santo Ambrósio, 1. cit. e Expos. Lc 10,24-25: PL 15, 1810. Santo
Agostinho, ln Jo. tr. 13, 12: PL 35, 1499. Cf. Serm. 191, 2, 3: PL 38, 1010;
etc. Cf. também Ven. Beda, ln Lc Expos. I, cap. 2: PL 92, 330. Isaac
de Stella, Serm. 54: PL 194, 1863 A.
(21) Sub tuum praesidium.
(22) Conc. Niceno II, ano 787: Mansi 13, 378-379: Denz. 302 (600-601). Conc.
Trid. sess. 25: Mansi 33. 171-172.
(23) Cf. Pio XII, Radiomensag. 24 out. 1954: AAS 46 (1954) p. 679. Cart. Enc. Ad coeli
Reginam, 11 out. 1954: AAS 46 (1954) p. 637.
(24) Cf Pio XI, Cart. Enc. Ecclesiam Dei, 12
nov. 1923: AAS 15 (1923) p. 581. Pio XII, Cart. Enc. Fulgens corona, 8 set.
1953: AAS 45 (1953) p. 590-591.
FÓRMULA DA PROMULGAÇÃO
Todas e
cada uma das coisas que nesta Constituição dogmática se estabelecem,
pareceram bem aos padres do Concílio. E nós - pelo poder apostólico que nos
foi confiado por Cristo - juntamente com os veneráveis padres, no Espírito
Santo as aprovamos, decretamos e estabelecemos, e tudo quanto assim
conciliarmente foi estatuído, mandamos que, para glória de Deus, seja
promulgado.
- Roma,
junto de São Pedro, aos 21 de novembro de 1964.
Eu, Paulo,
bispo da Igreja Católica
(Seguem-se as assinaturas dos padres conciliares)
NOTIFICAÇÕES
DAS ATAS DO CONCÍLIO ECUMÊNICO VATICANO II
Feitas pelo Exmo. Secretário Geral na 123 a Congregação Geral (16 de novembro
de 1964)
Foi perguntado qual
deva ser a qualificação teológica da doutrina exposta no esquema De
Ecclesia, sujeito à votação.
A Comissão Doutrinal, ao examinar os Modos relativos ao capítulo III do
esquema De Ecclesia, respondeu com as seguintes palavras:
Como é evidente, um texto conciliar deve ser interpretado
sempre de harmonia com as regras gerais que todos conhecem. E, a propósito,
a Comissão Doutrinal manda para a sua Declaração de 6 de março de 1964, cujo
texto passamos a transcrever: Atendendo à praxe conciliar e tendo em
conta a finalidade pastoral do Concílio Vaticano II, este Santo Concílio só
entende pronunciar, em matéria de fé e costumes, aquelas definições que
abertamente declarar como tais. Tudo o mais que o Concílio propõe, na
qualidade de doutrina do Magistério Supremo da Igreja, devem todos e cada um
dos fiéis acatá-lo e segui-lo, conforme a intenção do mesmo Concílio, que
transparece quer da matéria versada, quer do modo de expressão, segundo as
normas da interpretação teológica.
A autoridade superior
comunica aos padres uma nota explicativa prévia, relativa aos Modos que
foram apresentados sobre o capitulo III do Esquema De Ecclesia. A doutrina
exposta neste capítulo III deve ser explicada e compreendida segundo o espírito
e o sentido desta nota.
Nota explicativa prévia
A Comissão decidiu fazer preceder o exame dos Modos das
seguintes observações gerais:
1. Colégio não se entende em sentido estritamente jurídico, isto
é, como um grupo de iguais que delegassem o seu poder no presidente, mas como
grupo estável, cuja estrutura e autoridade devem deduzir-se da revelação. Por
isso é que na resposta ao Modo 12, se diz expressamente, a respeito dos doze,
que o Senhor os constituiu à maneira de colégio ou grupo estável
(cf. também o Modo 53, c). - Pela mesma razão, ao falar-se de colégio
episcopal, se usam indistintamente os termos ordem e corpo. O paralelismo entre
são Pedro e os demais apóstolos, por um lado, e o Sumo Pontífice e os bispos,
por outro, não implica a transmissão dos poderes extraordinários dos apóstolos
aos seus sucessores, nem como é evidente, a igualdade entre a cabeça e os
membros do colégio; mas implica tão só uma proporcionalidade entre a primeira
relação (Pedro-apóstolos) e a segunda (papa-bispos). Por isso, a Comissão
resolveu escrever no n. 22: não da mesma maneira, mas de maneira semelhante
(cf. Modo 57).
2. Fica alguém constituído membro do colégio em virtude da
consagração episcopal e da comunhão hierárquica com a cabeça e com os
membros do colégio (cf. n. 22 § 1, ao fim).
Na consagração é conferida uma participação ontológica nos ofícios
sagrados, como indubitavelmente consta da tradição litúrgica. Emprega-se
propositadamente o termo ofício e não poderes, porque este último termo
poderia entender-se dum poder apto a exercer-se. Mas, para que haja um poder
assim apto a exercer-se, é indispensável a determinação canônica ou jurídica
da parte da autoridade hierárquica. Determinação de poder que pode consistir
na concessão dum cargo particular ou na designação dos súditos, e é dada
segundo as normas aprovadas pela autoridade suprema. Uma tal norma ulterior é
requerida pela natureza das coisas, pois se trata de ofícios que devem ser
exercidos por vários sujeitos, que por vontade de Cristo cooperam
hierarquicamente. É evidente que esta comunhão teve aplicação na
vida da Igreja, conforme as circunstâncias dos tempos, antes de ser codificada
no direito.
Por isso se diz expressamente que se requer a comunhão hierárquica
com a cabeça e com os membros da Igreja. Comunhão é uma noção que foi tida
em grande honra na antiga Igreja (e ainda hoje, sobretudo no oriente). Não é
entendida como um sentimento vago, mas como realidade orgânica que exige uma
forma jurídica e, ao mesmo tempo, é animada pela caridade. Daí que a Comissão
tenha decidido, quase por unanimidade, escrever em comunhão hierárquica,
cf. Modo 40 e também o que se diz a respeito da missão canônica, n. 24.
Os documentos dos sumos pontífices recentes, relativos à jurisdição
dos bispos, devem entender-se desta necessária determinação de poderes.
3. O colégio, que não existe sem a sua cabeça, diz-se que
é também sujeito do poder supremo e pleno sobre toda a Igreja. E isto
tem necessariamente de aceitar-se para que se não levante problema sobre a
plenitude do poder do Romano Pontífice. Colégio entende-se sempre e
necessariamente como incluindo a sua cabeça, que, dentro do colégio, mantém
íntegra a sua função de vigário de Cristo e de pastor da Igreja universal.
Por outras palavras, a distinção não se faz entre o Pontífice Romano e os
bispos tomados coletivamente, mas entre o Romano Pontífice sozinho e o Romano
Pontífice junto com os bispos. E porque o Sumo Pontífice é a cabeça do colégio,
só ele pode pôr determinados atos, que não são, de modo nenhum, da competência
dos bispos, v. g. convocar e dirigir o colégio, aprovar normas para a sua
atividade, etc., cf. Modo 81. Ao juízo do Sumo Pontífice, a quem foi entregue
o cuidado de toda a grei de Cristo, compete determinar, de harmonia com as
necessidades da Igreja que variam com os tempos, como convém que esta missão
se exerça, quer de maneira pessoal, quer de maneira colegial. O Romano Pontífice,
quando se trata de ordenar, promover e aprovar o exercício da colegialidade em
vista do bem da Igreja, procede segundo a sua própria discrição.
4. O Sumo Pontífice, como pastor supremo da Igreja, pode exercer o
seu poder em qualquer tempo, à sua vontade, como é exigido pelo seu cargo. Ao
contrário, o colégio, que existe sempre, nem por isso age permanentemente com
ação estritamente colegial, como atesta aliás a tradição da Igreja. Por
outras palavras, não está sempre em pleno exercício; mas a
intervalos; é só com o consentimento da cabeça que ele age de modo
estritamente colegial. Diz-se com o consentimento da cabeça', não
se vá pensar numa dependência a respeito de alguém estranho ao colégio; o
termo com o consentimento insinua, pelo contrário, comunhão entre
a cabeça e os membros, e implica a necessidade dum ato que propriamente compete
à cabeça. Isto é afirmado explicitamente no n. 22 § 2, e aparece
desenvolvido no fim do mesmo parágrafo. A fórmula negativa só
compreende todos os casos: é evidente portanto que as normas aprovadas pela
autoridade suprema devem ser observadas sempre (cf. Modo 84).
De tudo isto ressalta que se trata duma união estreita dos bispos
com a sua cabeça, e nunca duma ação dos bispos independentemente do Papa.
Neste caso, faltando a ação da cabeça, os bispos não podem agir como colégio,
o que resulta da própria noção de colégio. Esta comunhão hierárquica
de todos os bispos com o Sumo Pontífice é afirmada constantemente pela tradição.
N. B. - Sem a comunhão hierárquica não pode exercer-se a função
sacramental-ontológica, que deve ser distinguida do aspecto canônico-jurídico.
No entanto, a Comissão entende não dever entrar em questões de liceidade e
validade; deixa-as à discussão dos teólogos, em especial no que diz respeito
ao poder que, de fato, é exercido pelos orientais separados e em cuja explicação
as opiniões divergem.
† PÉRICLES FELICI
Arcebispo tit. de Samosata
Secretário Geral do Sacrossanto Concílio Ecumênico Vaticano II
Porque virá tempo em que não suportarão a sã doutrina; mas, ao sabor das paixões, amontoa- rão para si mestres, conforme suas próprias concupiscências e des- viarão os ouvidos da verdade, voltando às fábulas".(2Tm 4,3-4).